Dos países ricos em crise,
Barack Obama foi o único presidente que conseguiu se reeleger para mais um
mandato.
Nos demais países do
“centro”, os governantes foram substituídos por seus opositores.
Exceto no caso da Grécia e
da Itália, onde houve uma escancarada intervenção do mercado no processo
decisório, com o intuito de manter a “ordem” das coisas.
Não por acaso, Obama foi
também o único dos governantes que assumiram depois da crise de 2008, que
tentou estabelecer reformas no modelo econômico, ainda que parciais e
insuficientes.
No caso do presidente
estadunidense, as reformas ficaram mais restritas ao discurso político (não que
isso seja pouca coisa nos EUA), já que Obama não conseguiu reunir condições
políticas para promover as transformações tão esperadas pelos milhões de
desempregados e endividados.
Obama bem que tentou agir
na raiz do problema, aumentando a capacidade do Estado de ordenar a economia e
regular o sistema financeiro. Buscou também intervir com políticas públicas que
reforçariam o papel redistributivo do Estado, como no caso da reforma da saúde,
por exemplo. A idéia era fazer com que o Estado minimizasse as injustiças
sociais com serviços públicos universalizados.
O que Obama queria era
restaurar o capitalismo de escala dos Estados Unidos da América. Recuperar o
poder de compra da classe média e fortalecer o mercado interno. Aumentar os
investimentos do Estado, suprindo a retração da demanda privada, gerando
empregos e estabelecendo um círculo virtuoso (produtivo) na economia.
O presidente sabe que o
Estado deveria depender menos do capital especulativo e aumentar sua capacidade
produtiva.
Mas Obama foi acusado de
“socialista” pelas bestas neoliberais. Uma geração de economistas
“planilheiros”, forjada no mercado financeiro, absolutamente incapaz de
compreender como os Estados Unidos se consolidaram na maior potência econômica
mundial hegemônica, instaurando um capitalismo em que o Estado era o indutor do
desenvolvimento econômico, apoiado em uma classe média vibrante e
empreendedora, com políticas públicas econômicas que favoreciam, através do
crédito e do investimento público, o bem-estar social. E como a base da
liderança norte-americana na geopolítica internacional se impulsionou com
investimentos públicos e fomento das atividades produtivas dos países de seu
bloco.
Ocorre que o Mercado (com
M maiúsculo) seqüestrou a política dos Estados, interferindo nos processos
decisórios para além de todos os limites e moldando a economia mundial segundo
seus interesses.
Qualquer processo de
transformação econômica séria deve ser antecedido inevitavelmente por um
processo de reorientação das hegemonias políticas locais.
Logo, esta crise econômica
mundial é, antes de tudo, uma crise política global.
As grandes potências estão
naufragando. Por hora, isto se reflete tão “somente” nas crises sociais, com
desemprego, endividamento e empobrecimento das populações. Porém, no médio e
longo prazo, a quebra dos Estados – em benefício de todas as garantias de
lucros exorbitantes do Mercado – se refletirá na perda de competitividade dos
Estados no sistema interestatal, incluindo o financiamento de suas máquinas de
guerra.
Por isso, as eleições
recentes, em especial a dos Estados Unidos, merecem atenção especial.
Como os países ricos irão
se comportar para manter suas posições estratégicas no campo internacional?
Devemos esperar novas
guerras como repetição da prática histórica dos países ricos, espoliando e
pilhando as riquezas dos países periféricos para garantir o sustento de suas
máquinas de guerra?
Arrisco a dizer que este
tipo de empreendimento é cada dia mais improvável.
As populações (opinião
pública) perceberam que tem muito a perder e absolutamente nada a ganhar.
O indivíduo do século XXI
não está disposto a abrir mão de seu bem-estar econômico e social para
financiar aventuras de guerra, em nome de uma vitória nacional. Ainda mais
porque os vitoriosos, inevitavelmente são os ricos e poderosos que no final das
contas aumentarão seu potencial de opressão sobre as populações, cada dia mais
esmagadas.
Se no campo ideológico, os
grandes meios de comunicação ainda vendem a idéia de que os Estados
empobreceram financiando os benefícios sociais dos indivíduos, as pessoas já
perceberam e saem às ruas todos os dias para denunciar que o endividamento dos
Estados nada mais é do que o confisco do dinheiro público para o pagamento do
rombo dos grandes especuladores. Que o dinheiro injetado nas bolsas (sacado dos
cofres públicos), com o argumento de “tranqüilizar os mercados” é a crônica de
uma tragédia anunciada. As populações já perceberam que a imprensa mente! Que
ela é parte integrante do mesmo projeto de rapinagem das poupanças dos
trabalhadores.
Se a vitória de Obama não
encheu de esperanças sequer os eleitores mais crédulos, a derrota de Romney foi
sim significativa.
Romney começou a perder
estas eleições quando foi filmado em uma reunião com magnatas zombando dos
milhões de americanos que “dependem do governo”.
Disse Romney:
"Há
47% que estão com ele (Obama), que são dependentes do governo, que acham que
são vítimas, que acham que o governo tem responsabilidade de cuidar
deles", disse
Romney em imagens que vazaram na internet. Romney disse ainda que não cabe a
ele "preocupar-se com essas pessoas.
Nunca vou convencê-las de que elas devem ter uma responsabilidade pessoal e por
suas próprias vidas".
Qualquer semelhança com o
ideário neoliberal ainda fértil na direita brasileira não é mera coincidência.
É difícil entender, porém,
que em pleno século XXI ainda se discute a importância do Estado para
redistribuição das oportunidades.
Os que não possuem o
sentido de solidariedade humana, ao menos poderiam ser mais pragmáticos e
perceberem que será impossível alcançar a paz social e o progresso econômico,
com um contingente populacional marginalizado e sem acesso aos elementos básicos
que garantam o bem estar social.
Os que não se importam com
as garantias de dignidade humana, ao menos poderiam se preocupar com um mercado
consumidor vibrante. Com a população mais pobre tendo acesso aos bens de consumo,
impulsionando a economia, garantido emprego, produção e arrecadação de
impostos.
Aliás, os pobres que
dependem do governo recebem uma parcela de ajuda muito insignificante.
Quem depende mesmo do
governo são os grandes magnatas que recebem em suas veias trilhões de dólares
de ajuda estatal para acalmarem os especuladores e continuarem a perseguir e
despejar os endividados.
Numa só noite, George Bush
entregou 700 bilhões aos magnatas das bolsas.
Obama completou o serviço
ao longo de seu governo. Ajudou os banqueiros, mas não os endividados que
perdem todos os dias as suas casas para os banqueiros.
A infeliz declaração de
Romney foi decisiva para sua derrota. E a derrota de Romney representa também a
derrota do discurso neoliberal.
Nos quatro cantos do mundo
este discurso entrou em parafuso. Não dá mais para dizer que o Estado não deve
regular o mercado e que este se encarregaria de distribuir oportunidades em cascata
para o conjunto das populações.
Se o mundo vive a pior
crise das últimas décadas é por conta da falência deste modelo que nada mais
tem a oferecer à humanidade.
O modelo está podre. Não
há mais dada o que fazer pelas economias.
Agora, tudo é uma questão
política. A crise é política. É preciso derrotar este projeto para que a
humanidade siga o seu caminho.
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