Novembro de 2014
Acenderam os
sinalizadores.
A imagem era linda. A fumaça cobrindo a Fiel Torcida e o povão na arquibancada gritando alto o nome do Corinthians.
Mas o sonho acabou antes de queimar o pavio.
O juiz paralisou a partida. Nos demos conta subitamente que agora estamos em 2014, quase 2015.
Quando eu era criança a gente falava do ano 2.000 com expectativas incríveis. Seria a realização de sonhos fantásticos. O futuro nos guardaria novidades incríveis e gigantescas facilidades.
Faz quase catorze anos que começou o século XXI. Olhando de perto esta modernidade não parece ser tão interessante assim.
O triunfo do neoliberalismo criou uma nova ordem econômica, política e social. Por consequência criou também um novo tipo de homem.
Uma das tarefas originais desta “nova ordem” foi a de recivilizar o homem. Não deveríamos mais questionar as grandes estruturas. O “fim da história” já foi decretado e outro mundo não é possível. A partir de então, devemos cuidar apenas dos nossos “quarteirões”. A parte que nos cabe na nossa vidinha. E não responsabilizar nenhum inimigo político ou modelo estrutural. Na sociedade da autoajuda o grande inimigo estaria “dentro de nós”. Somos nós que temos que nos mudar. Estar adequados. Pertencer. Não nos reconhecemos mais no próximo. Ele é nosso inimigo em potencial. Qualquer um pode ser seu inimigo, desde que cruze o caminho dos nossos interesses imediatos.
Tantas digressões para falar dos sinalizadores na arquibancada do estádio do Corinthians? Para quê?
O Corinthians ficou apavorado com a indisciplina de alguns de seus torcedores. Tem compromissos financeiros. Quer evitar punições. Tem sido perseguido nos tribunais desportivos e precisa de resultados econômicos para se manter de pé e competir num mercado que não é diferente de outros tantos, ou seja, cada vez mais concentrado. É preciso destruir para não ser destruído. Até que em algum momento o próprio mercado se autodestrua. Mas o importante parece ser garantir o almoço de amanhã. Ainda que não haja futuro possível para o mercado, para os países ou para o planeta.
Para evitar as tais punições econômicas e desportivas o clube denunciou os torcedores culpados pelos sinalizadores. É preciso perseguir para não ser perseguido.
Os torcedores “civilizados” também apontam e acusam o “inimigo” que mora ao lado. Alguns ameaçam e agridem. Outros os entregam à polícia. Acreditam firmemente em si mesmos e em suas virtudes. Estão protegendo o clube e seu patrimônio. Comportaram-se adequadamente (entendam bem o que é adequação). Foram corretos e decentes. Sempre entregaram em dia a lição de casa. Em suas cabeças, não passa alguma outra reflexão, a não ser o desejo de preservar o Corinthians, evitar que ele seja punido, que o estádio seja interditado. Agem com a responsabilidade possível dos nossos tempos.
Não há nada que exista no Corinthians que não tenha correspondência com a sociedade. O Corinthians ressalta virtudes e vícios, paixões e pragmatismos, emoção e raciocínio, amor e desengano. Está tudo ali, como uma representação da vida da gente. Até na devastadora percepção do desespero dos nossos dias.
Fomos jogados uns contra os outros. O esforço de recivilização do homem nos massacra e nos oprime. É preciso estar adequado. Passar por cima de sentimentos e aspirações para permanecer existindo.
Para que o Mercado (com m maiúsculo) permaneça como o grande regulador da vida entre os indivíduos é preciso quebrar os instrumentos de solidariedade entre os homens. O mundo corporativo, o mundo dos negócios, o mundo das grandes empresas, o mundo das escolhas reduzidas e renúncias impossíveis é um mundo diferente do chão que a gente pisa.
As coisas só nos atingem verdadeiramente quando afetam o nosso cotidiano. Meus amigos, não aconteceu nada demais a não ser a inserção do Corinthians na velha nova ordem mundial. Isso a gente sente no fígado. Mas é assim que as coisas são, não é não? Dá para ser diferente? Digam vocês mesmos? Caso a resposta seja “sim”, vamos todos nos encorajar.
Vivemos todos sob o mesmo flagelo. Não deveríamos culpar uns aos outros.
PS: Este não é um enredo de conformismo e pessimismo. Os agentes não são apenas miseravelmente determinados pela estrutura. Alguns agentes podem contribuir para mudanças estruturais. O Corinthians não é apenas um clube de futebol. É uma força viva da sociedade brasileira. Há muito que pode ser feito.
A imagem era linda. A fumaça cobrindo a Fiel Torcida e o povão na arquibancada gritando alto o nome do Corinthians.
Mas o sonho acabou antes de queimar o pavio.
O juiz paralisou a partida. Nos demos conta subitamente que agora estamos em 2014, quase 2015.
Quando eu era criança a gente falava do ano 2.000 com expectativas incríveis. Seria a realização de sonhos fantásticos. O futuro nos guardaria novidades incríveis e gigantescas facilidades.
Faz quase catorze anos que começou o século XXI. Olhando de perto esta modernidade não parece ser tão interessante assim.
O triunfo do neoliberalismo criou uma nova ordem econômica, política e social. Por consequência criou também um novo tipo de homem.
Uma das tarefas originais desta “nova ordem” foi a de recivilizar o homem. Não deveríamos mais questionar as grandes estruturas. O “fim da história” já foi decretado e outro mundo não é possível. A partir de então, devemos cuidar apenas dos nossos “quarteirões”. A parte que nos cabe na nossa vidinha. E não responsabilizar nenhum inimigo político ou modelo estrutural. Na sociedade da autoajuda o grande inimigo estaria “dentro de nós”. Somos nós que temos que nos mudar. Estar adequados. Pertencer. Não nos reconhecemos mais no próximo. Ele é nosso inimigo em potencial. Qualquer um pode ser seu inimigo, desde que cruze o caminho dos nossos interesses imediatos.
Tantas digressões para falar dos sinalizadores na arquibancada do estádio do Corinthians? Para quê?
O Corinthians ficou apavorado com a indisciplina de alguns de seus torcedores. Tem compromissos financeiros. Quer evitar punições. Tem sido perseguido nos tribunais desportivos e precisa de resultados econômicos para se manter de pé e competir num mercado que não é diferente de outros tantos, ou seja, cada vez mais concentrado. É preciso destruir para não ser destruído. Até que em algum momento o próprio mercado se autodestrua. Mas o importante parece ser garantir o almoço de amanhã. Ainda que não haja futuro possível para o mercado, para os países ou para o planeta.
Para evitar as tais punições econômicas e desportivas o clube denunciou os torcedores culpados pelos sinalizadores. É preciso perseguir para não ser perseguido.
Os torcedores “civilizados” também apontam e acusam o “inimigo” que mora ao lado. Alguns ameaçam e agridem. Outros os entregam à polícia. Acreditam firmemente em si mesmos e em suas virtudes. Estão protegendo o clube e seu patrimônio. Comportaram-se adequadamente (entendam bem o que é adequação). Foram corretos e decentes. Sempre entregaram em dia a lição de casa. Em suas cabeças, não passa alguma outra reflexão, a não ser o desejo de preservar o Corinthians, evitar que ele seja punido, que o estádio seja interditado. Agem com a responsabilidade possível dos nossos tempos.
Não há nada que exista no Corinthians que não tenha correspondência com a sociedade. O Corinthians ressalta virtudes e vícios, paixões e pragmatismos, emoção e raciocínio, amor e desengano. Está tudo ali, como uma representação da vida da gente. Até na devastadora percepção do desespero dos nossos dias.
Fomos jogados uns contra os outros. O esforço de recivilização do homem nos massacra e nos oprime. É preciso estar adequado. Passar por cima de sentimentos e aspirações para permanecer existindo.
Para que o Mercado (com m maiúsculo) permaneça como o grande regulador da vida entre os indivíduos é preciso quebrar os instrumentos de solidariedade entre os homens. O mundo corporativo, o mundo dos negócios, o mundo das grandes empresas, o mundo das escolhas reduzidas e renúncias impossíveis é um mundo diferente do chão que a gente pisa.
As coisas só nos atingem verdadeiramente quando afetam o nosso cotidiano. Meus amigos, não aconteceu nada demais a não ser a inserção do Corinthians na velha nova ordem mundial. Isso a gente sente no fígado. Mas é assim que as coisas são, não é não? Dá para ser diferente? Digam vocês mesmos? Caso a resposta seja “sim”, vamos todos nos encorajar.
Vivemos todos sob o mesmo flagelo. Não deveríamos culpar uns aos outros.
PS: Este não é um enredo de conformismo e pessimismo. Os agentes não são apenas miseravelmente determinados pela estrutura. Alguns agentes podem contribuir para mudanças estruturais. O Corinthians não é apenas um clube de futebol. É uma força viva da sociedade brasileira. Há muito que pode ser feito.
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