quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Fidel Castro vence em vida a guerra contra os Estados Unidos.


A maioria das pessoas avalia a política e o resultado dos governos como se somente um lado estivesse jogando. É como se em uma partida de futebol houvesse apenas um time em campo.
Em geral, os governos tem seus resultados avaliados apenas pela soma de seus acertos e seus erros.
Poucos consideram o fator INIMIGO. 
Que tem muita gente jogando contra. Que existem ameaças, chantagens e conspirações.
Governar é quase sempre um "cabo de guerra". As vezes se está com a vantagem e outras prestes a ser derrubado. Muitas vezes se ganha pela resistência. Ocorre que é muito difícil jogar esse jogo sem sujar e cortar as próprias mãos que inevitavelmente ficam cheias de feridas.
Isso serve para o Brasil, EUA, Rússia, China, Índia. Qualquer governo.

Cuba resistiu o quanto pode. Foram heróis. Suportaram as mais terríveis privações e foram ameaçados dia após dia na última metade de século. Jamais curvaram a espinha. Mantiveram sempre o pescoço em riste e o olhar para o futuro. 
Educaram seus filhos. Mais do que qualquer outra vitória, fizeram uma revolução humana.
Hoje, Fidel Castro e seu irmão venceram a guerra!
Ninguém sabe o que vai acontecer no futuro. Nenhum governo dura para sempre. Cuba é caótica em muitos aspectos e sofre grandes carências por conta do embargo. 
Sim, sua população está louca para comprar xampus, condicionadores, calça jeans, PlayStation entre tantas mercadorias tão comuns no cotidiano da vida moderna.
A história não para. Cuba terá muitos outros governos ao longo dos anos. Mas ninguém pode roubar aquilo que você aprendeu. Ninguém pode tirar de você as suas experiências. O aprendizado histórico e o conhecimento são mais valiosos do que qualquer bem de consumo perecível. 
Ninguém pode prever o futuro. Mas é possível dizer que esta guerra contra os ianques o povo Cubano superou.
Fidel fez suas escolhas. Certa vez ele disse: "Digam o que digam. Falem o que falem. Condenem-me. A HISTÓRIA ME ABSOLVERÁ!
Queiram vocês ou não. O Comandante venceu a guerra pela qual dedicou a sua vida. Certamente quando ele deixar este mundo poderá dizer: "agora é com vocês".
Os EUA perderam mais uma guerra.
Tudo o que eles fizeram contra Cuba nos últimos cinquenta anos, fica agora evidente que não deu certo. Obama acaba de reconhecer isso.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Eu mereço uma mulher rodada



Eu quero uma mulher rodada.
Uma mulher que seja dona de si e que esteja livre de censuras e preconceitos.
Prefiro manter distância das recalcadas. Das mulheres ameaçadas pela felicidade alheia que ela mesma não tem coragem de desfrutar.
Prefiro uma mulher rodada.
Aquela que sussurre deliciosas indecências no meu ouvido.
A mulher que me conte seus segredos mais picantes. Suas aventuras e desventuras. Seus tombos e seus gozos. Sua magia e seus temores.
Não me interessam as santas.
Não aprecio as santas por vocação, imaginem só as santas do pau oco?
Prefiro as pervertidas, as mundanas, as vadias.
Essas mulheres têm a saliva gostosa.
A voz serena e tranqüila de quem vive a vida bem vivida.
A melodia de quem não guarda tantas frustrações, amarguras nem armaduras.
Não são azedas. Seus fígados são desopilados.
Escolho uma mulher que coloque logo as cartas na mesa.
Melhor do que aquelas que mostram o jogo aos poucos. Que blefam.
Que dissimulam, que te sorriem com candura e depois colocam duas dúzias de capatazes de beca para te ameaçar.
Quero uma mulher que não construa um castelo de cartas cheio de aparências tolas.
Com franjas bem cortadas. Sorrisos rigorosamente calculados. Atitudes comedidas. Contratos com letras miúdas.
Quero uma mulher rodada.
Uma mulher que eu não precise chamar de "minha". Uma mulher que não aceite pertencer a ninguém.
Que vista aquela camiseta escrita "quem comeu comeu".
Uma mulher que se garanta.
Que eu beije na boca com carinho nos lugares da vida. Ainda que ela tenha "rodado" por mil homens.
Que os cegos funcionais subitamente se deem conta de que não conseguiram reconhecer a arte onde ela existia. Onde tudo parecia paisagem cotidiana.
Quero uma mulher rodada que não sinta vergonha de seu corpo.
Uma mulher que se arreganhe. Que não sorria meios sorrisos.
Que não se perca em nojinhos descabidos.
Não preciso de uma mulher pra casar.
Quero uma mulher para amar.
Uma mulher que me faça perder o fôlego.
Que me cure de qualquer arritmia cardíaca.
Que me exercite.
Que cure as minhas feridas.
Que me tire o medo de amar.
Uma mulher que não controle minhas gargalhadas.
Que não mexa no meu celular. Que respeite as minhas gavetas.
Que não me impeça de sorrir.
Que me deixe ser simpático e carinhoso com minhas amigas.
E que ela tenha tantos quantos amigos lhe couberem no coração.
Quero uma mulher rodada que me mate de paixão.
Melhor do que uma mulher que me mate de tédio. De tristeza.
Quero uma mulher flexível. Odeio as mulheres rigorosas.
Quero uma mulher rodada que me deixe calmo. Melhor do que uma mulher que me acelere.
Quero uma comédia romântica. Não quero mais um drama.
Quero uma mulher que transpire verdade. Que sue de tanto amor.
Melhor do que uma mulher asséptica, perfumada de tanta mentira.
Quero dividir balcões de bares. Filmes de sacanagem. Os melhores amigos.
Não quero dividir crises de ciúmes. Não quero alguém que puxe o extrato para saber se mais se doou ou se mais recebeu.
Quero dividir um bom vinho. Uma calorosa cachaça. O mesmo sabonete. O pen drive de músicas.
Não quero dividir regulamentos, certezas, valores. Não quero ninguém que diga o que é "o certo".
Alguém que respeite os amores insanos.
Que valorize a liberdade.
Uma mulher rodada.
Que não tenha medo da vida.
Que não sinta medo de amar.
Uma mulher que tenha elegância na vulgaridade.
Muito melhor do que ter vulgaridade na elegância.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Bolsonaro e Bolsonaros




Bolsonaro não exagerou, nem passou dos limites, nem errou, nem nada.
Ele cometeu o velho crime desejado e esperado por seu eleitorado. Foi o mesmo show de sempre.
Um político demagogo e oportunista como ele, jamais falaria algo que não tivesse aderência em seu "mercado eleitoral".
Bolsonaro sente-se autorizado e encorajado por outros tantos estúpidos que andam por aí nos submetendo a sua verborragia cotidiana.
Nos táxis, nas esquinas, nos bares, nas universidades, nas baladas e até mesmo nas igrejas.
O mais deprimente, é que estas não são palavras de um louco qualquer. É a externalização de um sentimento violento que habita no conjunto da nossa sociedade.
Como se as mulheres fossem divididas entre aquelas que merecem ou não merecem ser estupradas.
Pior, seria o estupro um "benefício" ou prerrogativa das mulheres sexualmente desejáveis, estando as "feias" desobrigadas da preocupação com sua integridade.
Seria o estupro um "elogio". A manifestação do reconhecimento masculino aos atributos físicos femininos e aos estímulos provocados por ela, intencionalmente ou não.
Falas como a de Bolsonaro, oprimem, degradam e humilham as mulheres. E retrocedem o homem ao seu "estado de natureza", violento, impetuoso e irracional.
A direita brasileira impede que avancemos como sociedade. Obriga que o Brasil permaneça no atraso. Que a gente retroceda e seja obrigado a defender posições fundamentais que deveriam estar liquidadas há anos. Somos impedidos de discutir o futuro porque ainda estamos fechando as contas com o passado.
Os eleitores da família Bolsonaro devem estar orgulhosos de seu voto. Taí um político que não decepciona seu eleitorado. Que entrega justamente o pacote que prometeu. Que não muda de cara depois da eleição.
As vezes dá a impressão que ainda estamos na Idade Média. Inquisidores andam soltos por aí. Obscurantistas interditam o debate. Logo mais nos depararemos com fogueiras santas e mulheres queimadas como bruxas.
Aliás, as fogueiras continuam por aí. Só não vê quem não quer. E tem muita gente sendo queimada viva.

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

O Coxinha e o esforço de pertencimento



Ser "coxinha" vai muito além das preferências políticas.
É uma espécie de busca permanente pelo senso comum. Uma procura incansável pelo comportamento convencional.
Daí, nada mais natural que as posições políticas estejam orientadas pelas opiniões fáceis, sem os esforços cansativos da profundidade.
A verdade é que o coxinha não depende e nem se importa tanto com a política para existir. Ela só é mais uma faceta desagradável de sua personalidade, composta pelo esforço de pertencimento.
Sim, o coxinha deseja aceitação. Estar em consonância com seus pares. Reproduzir um comportamento que não lhe cobre os altos custos das críticas e contradições.
O coxinha quer sempre parecer com o grupo hegemônico.
Todos deveriam ter o "cabelo bom". Os que não tem o tal "cabelo bom" que comprovaria uma herança genética não africana, sofrem muito com isso.
Os rapazes coxinhas quando não podem fazer aquele penteado do namorado da Barbie, simplesmente raspam a cabeça. As meninas sofrem muito mais. Precisam torturar seus lindos cabelos com aquela chapinha violenta e agressiva.
Fiz esta brincadeira com o cabelo do coxinha, mas poderíamos na verdade escrever um almanaque, com a vestimenta, a construção corporal e as frases feitas.
O que eu quero dizer é que o coxinha vive apavorado. Com medo permanente de ser abandonado e excluído, por isso jamais fará alguma coisa que contrarie o senso comum e isso inclui a política.
Ocorre que o Brasil odeia a igualdade, mas também detesta as diferenças.
A vida pode ser terrível para os ousados. Para além da experiência cosmopolita das grandes cidades mais acostumadas com a diversidade, o comportamento destoante pode significar a morte social.
Antes que alguns se aborreçam comigo, não quero dizer que as pessoas devam estar obrigadas a adotar um comportamento estético marcado por uma personalidade extravagante. As pessoas devem ser como elas são e viver em harmonia consigo mesmas. Ninguém é melhor do que ninguém.
Mas não dá para falar de comportamento sem irritar uns e outros. É inevitável.
Não creio que as pessoas devam sentir bronca dos coxinhas. Muito embora alguns deles estejam muito agressivos ultimamente.
Nossa sociedade está marcada com desprezo pelo outro, em suas experiências e motivações.
No fundo o coxinha está sofrendo. É um flagelado, pois seu esforço de pertencimento e sua "luta", tão caros para ele, estão ameaçados pelo triunfo das minorias.
E o terreno da diversidade é desesperador. Um habitat em que ele simplesmente não sabe viver.

Os nossos "europeus" são mais criativos que os europeus dos outros



Engraçado. Tem uma parte da sociedade que adora imitar os europeus, mas faz isso sempre do jeito errado. Alguns tem até sobrenome europeu, mas a admiração pelo velho (e belíssimo) continente parece estar restrita à cor da pele de seus habitantes. 
Querem ser europeus, mas por estes tristes trópicos não querem a social democracia européia, os programas sociais europeus, o transporte público europeu, a justiça social européia, a reforma agrária européia, o protecionismo europeu, a polícia desarmada européia, a regulação de mídia européia, a distribuição de renda européia, etc.
Até na hora de combater este governo supostamente "bolivariano", comportam-se muito mais como coronéis, feitores e capatazes escravocratas do que como o "europeu médio civilizado".
A novidade é o protesto em defesa do Superávit Primário! (pasmem)
Este protesto é uma "foto histórica" que os estudiosos devem guardar para a posteridade. Daqui duzentos anos será uma divertidíssima curiosidade.
Nem vou entrar no mérito de tudo o que envolve a questão do superávit primário, pois entraremos em outra seara de discussão, posto que alguns defendem cegamente o controle de gastos do governo e a transparência orçamentária para manter o Brasil como uma "economia de mercado", com todos os supostos e discutíveis benefícios que isso pode nos trazer.
Que os banqueiros e grandes rentistas fazem lobby e financiam a imprensa em defesa da "austeridade fiscal" é notícia velha. Mas ver justamente "o povo" protestando por controle orçamentário e corte de investimentos é no mínimo curioso. Na contramão de tudo o que se vê hoje mundo afora.
Principalmente na Europa, onde a galera ocupa as ruas dos principais países contra as "metas de austeridade" e a fortuna paga pelo Estado aos banqueiros e especuladores, às custas do flagelo social.
Lembro que havia um comercial de televisão que dizia: "Os nossos japoneses são mais criativos do que os japoneses dos outros"
Será que os nossos "europeus" também são mais criativos do que os europeus dos outros?
Ou estão um pouco tontos e desnorteados no processo histórico. Pra variar...

Os negros do mundo

Em alguns países orientais, as pessoas ao irem à praia se protegem da melhor forma possível dos raios solares.
Para além da saúde e dos cuidados com a pele, muitos querem evitar um "desagradável" bronzeado, algo considerado feio ou depreciativo em algumas culturas.
Mochileiro, curioso e observador que eu sou, conversei com algumas pessoas para ouvir o porquê de a pele escura ser indesejável nestes países que não tem a presença africana tão marcante, como em nossa sociedade.
A resposta mais recorrente foi a seguinte: a pele escura ou bronzeada é característica particular dos camponeses e demais trabalhadores agrícolas que passaram a vida expostos ao sol. Muitos querem evitar a semelhança física com aqueles que estariam em um "estamento inferior" da sociedade.
Certa vez quis fazer um elogio a uma chilena, dizendo que ela parecia uma indiazinha. Foi uma fria. Ela ficou magoada e ofendida. Tentei explicar que na verdade estava encantado com sua beleza física, mas não adiantou.
No Brasil, vejo muitas pessoas que se dizem envergonhadas de irem à praia por serem "branquelas". Não se consideram adequados ao ambiente por terem a pele branca igual ao leite.
O bronzeado parece ser muito desejável. As pessoas se expõem ao sol e se deliciam com a marquinha do biquíni ou da sunga.
Porém, no nosso caso brasileiro, o curioso é que esse gosto pela pele escura em nada tem a ver com uma suposta "democracia racial".
Acontece que quem tem a pele pálida é porque "não goza a vida". Alguns dizem inclusive que "não parece saudável".
E quem não goza a vida, é porque seria pobre (algo quase amaldiçoado em nossa sociedade). Ou alguém submetido ao trabalho intermitente.
Ah, as nossas heranças ibéricas... O trabalho seria ainda coisa para os escravos?
Eu vou parando por aqui. Convidando à contribuição dos meus amigos, em especial os antropólogos que queiram fazer seus comentários, adendos e também corrigir alguma inconsistência.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Dezembro



Dezembro.
Sinto uma devastadora preguiça deste mês.
Preguiça do Papai Noel vestindo aquela roupa quente. A barba deve abrigar uma fedentina azeda e insuportável.
O Papai Noel dos trópicos deve sentir tanta raiva de ficar por aqui, sentado o dia inteiro naqueles shoppings cafonas, que no dia vinte e quatro sai vazado e sequer se preocupa em deixar presentes para as crianças mais pobres.
Deve-se avisar o bom velhinho para tomar certos cuidados este ano. Dessa vez, não são os punks que desejam chutar o seu traseiro. Caso ele, inadvertidamente, cruze um protesto em defesa do retorno dos dinossauros ao poder, ele pode tomar uma surra por usar aquela roupa toda vermelha. E não adianta dizer que o traje é uma referência à Coca-Cola, porque a turma anda meio intransigente ultimamente.
Preguiça de ver aqueles pinheiros cheios de bolas coloridas e alguns pedaços de algodão despedaçados para imitar a neve. Sinceramente, quando chega dezembro eu só penso nos coqueiros e no sol ardente e revigorante.
Preguiça dos amigos secretos. Eles agora estabelecem faixas fixas de preço. Com um mínimo e um máximo que se deve gastar na "lembrancinha". Tem comissão organizadora e tudo. O valor mínimo tem como objetivo que ninguém saia prejudicado, recebendo um presente supostamente ruim. Já o valor máximo é para que os outros não se sintam constrangidos por terem comprado um presente modesto ao seu amigo secreto. O valor máximo visa também evitar outros problemas como o assédio sexual oculto, o puxa-saquismo com o chefe e também não "inflacionar o mercado", impulsionando os preços para cima a partir da histeria coletiva.
O pior é quando alguém nos primeiros dias de dezembro te pergunta: "Vai participar do amigo secreto?".
Por dentro todo mundo responde: "paaaatcha que pariu".
Mas inevitavelmente concorda com a brincadeira, pois ficar de fora evidenciaria como somos azedos, anti-sociais, intolerantes, metidos, arrogantes, mãos-de-vaca. Tudo isso junto numa só recusa. Por isso aceitamos.
Proponho que para os próximos anos haja o "Meu amigo sou eu". Todo mundo compraria um presente para si mesmo. Depois, todos se encontrariam para mostrar como é legal o seu auto-presente. Sairia todo mundo feliz, com o presente que realmente gostaria de ter recebido. Porque ninguém conhece mais a gente do que nós mesmos.
E as festas de confraternização? Sinceramente, de festa eu sempre gosto. Mas é muito irritante ver duas pessoas que se odeiam se abraçando ao som de: "We are de Champions, my friend".
E aquela pessoa rígida, travada, que se leva muito a sério, super apegada ao próprio poder, tentando no último dia do ano passar uma imagem mais irreverente e descontraída dançando "conga conga conga"?
E quando as pessoas se odeiam? Nessa época ficam obrigadas a desejar o melhor umas às outras, demonstrando um acréscimo de solidariedade para logo no começo do ano voltarem à rotina do maldizer.
Sei que nem todo mundo é chato como eu. Aliás, o fato de me assumir como chato é libertador, pois me livra da pretensão de estar correto enquanto todos os outros estariam errados.
Esbaldem-se nos shoppings, disputando durante horas uma vaga no estacionamento. Visitem as lojas em meio às crianças gritando e fazendo birra.
Meus amigos e parentes devem achar que sou mão-de-vaca. Nunca rola um presente bacana. Mas não é nada disso. A questão não é o dinheiro. Se eu tenho nem ligo de gastar. Acontece que eu odeio loja. Não por acaso os dezembros me causem um nível elevado de irritação.
Antecipadamente agradeço a compreensão de todos

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

Feliz Black Friday





Desejo um Feliz Black Friday para todos!
Regozijem-se nas lojas em busca da felicidade suprema, somente alcançada através do consumo.
Feliz dia de ação de graças. Tal qual os colonos do norte fizeram séculos atrás, convidem um índio para compartilhar à mesa e em seguida massacre sua cabeça com tantos golpes de marreta forem necessários.
Por falar em índios, façamos jus às nossas origens indígenas remotas. Nos encantemos com os “espelhinhos eletrônicos” e outras tantas bugigangas capazes de nos dar um acalanto instantâneo, para imediatamente depois nos mergulhar em outra crise de depressão profunda.
Será que existe desconto para Fluoxetina e Clonazepan no Black Friday?
Alguns comemoram esta data como colonos. Outros como colonizados. Cada um cumpre o seu papel.
Agradeçamos o nosso louvor, ainda que este signifique a desgraça alheia.
Invadam os shoppings e sites de compras. Compremos tudo o que for possível pela metade do dobro do preço.
Vamos tomar Nova Iorque. Vamos, brasileiros. Chegou a hora dessa gente bronzeada mostrar seu valor. O Tio Sam está querendo conhecer o nosso limite do cartão de crédito.
Vamos realizar o nosso sonho. Hoje é possível falar português nas lojas de Nova Iorque.
Mas, curiosamente, os museus estão vazios. Nossos compatriotas passam longe do circuito cultural. Olhemos para frente, pois nosso passado nos dá pena. Vamos nos manter em êxtase. Parar para pensar nos dá tristeza. Apaguemos nosso passado. Aquela lembrança remota de pobreza.
Vamos plastificar malas e mais malas antes do check in. Levemos contêineres. Paguemos com gosto o gasto do excesso de bagagem.  
Tratemos com desprezo os comissários de bordo e demais funcionários da companhia aérea. Vamos mostrar quem é que manda. “Eu tô pagando!”. Vamos exigir o perfeito funcionamento dos aeroportos como jamais fizemos com escolas e hospitais públicos.
Escapemos da alfândega. É dura a vida da classe média que paga seus impostos para sustentar tantos vagabundos.
Bora comprar! Comprem como loucos!
Nós, seres humanos que passamos por tantas desventuras, aqui chegamos. Filósofos, cientistas, pensadores, guerreiros, operários, generais e profetas. Todos gastaram desnecessariamente o seu tempo. A realização humana agora parece ser tão simples. Quantos empreendimentos tolos foram levados à cabo. Quantas imagens de santos e totens foram esculpidas. Besteira! Evoluímos inclusive na alienação e louvamos à deuses que cumprem milagres instantâneos e nos conferem o gozo imediato.

Feliz Black Friday a todos.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

A modelo na cracolândia. A primeira pedra de fama é grátis.



Encontraram uma ex-modelo jogada na cracolândia. 
Cabelo loiro, traços finos e olhos azuis. 
Causou perplexidade geral, pois ali não seria o seu lugar. Dos outros pobres feios e arruinados talvez. Mas não dessa moça que um dia foi bonita, quando preservava o seu fenótipo.
As televisões e jornais se interessaram pelo caso.
O argumento deste novo show é mostrar às pessoas onde elas podem parar com o uso de drogas ilícitas.
Oferecem agora à moça uma nova droga. Que será oferecida durante algumas poucas semanas, enquanto o ibope durar.
A fama instantânea. Tão instantânea e efêmera quanto o "barato" do crack.
Será a promessa de um novo tempo. De reconhecimento. De sociabilidade. De frequentar lugares glamourosos.
A primeira pedra de fama é "de grátis".
Logo em seguida ela será jogada em alguma outra cracolândia do esquecimento, onde estão tantas outras sub celebridades que tiveram seus segundos de fama e agora também agonizam.
Dirão que ela teve uma nova chance e que outra vez jogou tudo no lixo.
Enfim, todos vão dizer como uma espécie de sentença: "Ah, então realmente ela não prestava".
E esse lance do "prestar" ou não "prestar" deixará evidente que não aprendemos nada sobre dependência química e que a cracolândia existe porque o sistema precisa e deseja que ela exista. É um limbo social.

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Sinalizador dos nossos tempos



Acenderam os sinalizadores.
A imagem era linda. A fumaça cobrindo a Fiel Torcida e o povão na arquibancada gritando alto o nome do Corinthians.
Mas o sonho acabou antes de queimar o pavio.
O juiz paralisou a partida. Nos demos conta subitamente que agora estamos em 2014, quase 2015.
Quando eu era criança a gente falava do ano 2.000 com expectativas incríveis. Seria a realização de sonhos fantásticos. O futuro nos guardaria novidades incríveis e gigantescas facilidades.
Faz quase catorze anos que começou o século XXI. Olhando de perto esta modernidade não parece ser tão interessante assim.
O triunfo do neoliberalismo criou uma nova ordem econômica, política e social. Por consequência criou também um novo tipo de homem.
Uma das tarefas originais desta “nova ordem” foi a de recivilizar o homem. Não deveríamos mais questionar as grandes estruturas. O “fim da história” já foi decretado e outro mundo não é possível. A partir de então, devemos cuidar apenas dos nossos “quarteirões”. A parte que nos cabe na nossa vidinha. E não responsabilizar nenhum inimigo político ou modelo estrutural. Na sociedade da autoajuda o grande inimigo estaria “dentro de nós”. Somos nós que temos que nos mudar. Estar adequados. Pertencer. Não nos reconhecemos mais no próximo. Ele é nosso inimigo em potencial. Qualquer um pode ser seu inimigo, desde que cruze o caminho dos nossos interesses imediatos.
Tantas digressões para falar dos sinalizadores na arquibancada do estádio do Corinthians? Para quê?
O Corinthians ficou apavorado com a indisciplina de alguns de seus torcedores. Tem compromissos financeiros. Quer evitar punições. Tem sido perseguido nos tribunais desportivos e precisa de resultados econômicos para se manter de pé e competir num mercado que não é diferente de outros tantos, ou seja, cada vez mais concentrado. É preciso destruir para não ser destruído. Até que em algum momento o próprio mercado se autodestrua. Mas o importante parece ser garantir o almoço de amanhã. Ainda que não haja futuro possível para o mercado, para os países ou para o planeta.
Para evitar as tais punições econômicas e desportivas o clube denunciou os torcedores culpados pelos sinalizadores. É preciso perseguir para não ser perseguido.
Os torcedores “civilizados” também apontam e acusam o “inimigo” que mora ao lado. Alguns ameaçam e agridem. Outros os entregam à polícia. Acreditam firmemente em si mesmos e em suas virtudes. Estão protegendo o clube e seu patrimônio. Comportaram-se adequadamente (entendam bem o que é adequação). Foram corretos e decentes. Sempre entregaram em dia a lição de casa. Em suas cabeças, não passa alguma outra reflexão, a não ser o desejo de preservar o Corinthians, evitar que ele seja punido, que o estádio seja interditado. Agem com a responsabilidade possível dos nossos tempos.
Não há nada que exista no Corinthians que não tenha correspondência com a sociedade. O Corinthians ressalta virtudes e vícios, paixões e pragmatismos, emoção e raciocínio, amor e desengano. Está tudo ali, como uma representação da vida da gente. Até na devastadora percepção do desespero dos nossos dias.
Fomos jogados uns contra os outros. O esforço de recivilização do homem nos massacra e nos oprime. É preciso estar adequado. Passar por cima de sentimentos e aspirações para permanecer existindo.
Para que o Mercado (com m maiúsculo) permaneça como o grande regulador da vida entre os indivíduos é preciso quebrar os instrumentos de solidariedade entre os homens. O mundo corporativo, o mundo dos negócios, o mundo das grandes empresas, o mundo das escolhas reduzidas e renúncias impossíveis é um mundo diferente do chão que a gente pisa.
As coisas só nos atingem verdadeiramente quando afetam o nosso cotidiano. Meus amigos, não aconteceu nada demais a não ser a inserção do Corinthians na velha nova ordem mundial. Isso a gente sente no fígado. Mas é assim que as coisas são, não é não? Dá para ser diferente? Digam vocês mesmos? Caso a resposta seja “sim”, vamos todos nos encorajar.
Vivemos todos sob o mesmo flagelo. Não deveríamos culpar uns aos outros.

PS: Este não é um enredo de conformismo e pessimismo. Os agentes não são apenas miseravelmente determinados pela estrutura. Alguns agentes podem contribuir para mudanças estruturais. O Corinthians não é apenas um clube de futebol. É uma força viva da sociedade brasileira. Há muito que pode ser feito. 

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Golpistas, de volta para a caverna!


A estupidez paira no ar.
Os boçais foram todos encorajados.
Os maníacos da caixa alta saíram dos fóruns de internet e estão boiando por aí.
Foram alimentados durante anos. Comeram ração na tigela dos escravocratas. Beberam água na fonte da despolitização geral. Marombados e dopados pela velha mídia.
Ao abrir a gaveta da cômoda, deve-se escolher muito bem a cor camiseta que se vai usar. O perigo não é cruzar com a torcida organizada do time adversário.
Os maníacos da vez são garotos com os cabelos bem penteados proferindo frases feitas tão burras que não dá nem para responder.
Os meninos e meninas que faziam bullying na escola já cresceram. Ficaram fortes. Foram bem alimentados e protegidos. Batiam o pé e ganhavam um brinquedo novo. Gritavam mais alto e eram entregues às suas babás. Davam um pouco mais de trabalho e ganhavam de presente uma viagem para a Disney.
Agora estão aí, realizando protestos livres em favor da ditadura. Levantando capas de revista esperando a volta da censura. Fazendo birra porque o resultado das eleições não foi o que eles gostariam.
E mandam correios eletrônicos aos ianques clamando por uma nova emboscada.
E batem na porta do quartel implorando para que algum milico retire o pijama e entre em seu brilhante zepelim com dois mil canhões assim.
Aprenderam a fazer isso brincando de "espírito do copo".
Estão chamando qualquer assombração. Qualquer espírito maligno. O cão, o tinhoso, o coisa ruim. Qualquer um capaz de dar um golpe e restaurar as velhas hierarquias.
Enfim estão assumindo que a democracia no Brasil sempre foi um mal entendido.
A democracia parecia ser útil quando atendia ao propósito de legitimar o poder dos grandes grupos econômicos, absorvendo a necessidade de representação e participação política na sociedade brasileira.
A democracia desenhada pela oligarquia era um grande teatro. O cenário ideal para a manutenção dos velhos privilégios. E a mídia dirigia o espetáculo com maestria, cabendo ao povo o papel de referendar nas urnas a decisão anteriormente tomada pelos "formadores de opinião".
Nas últimas eleições não mais se ouviu a expressão "festa da democracia". Por que será, acabou a festa?
Alguns se fazem de civilizados. Dizem ser contra a "intervenção militar". Porém, contestar o resultado das eleições é ainda mais grave. Porque se ofende algo muito anterior à forma e o regime de governo. Quem pede a anulação das eleições coloca em jogo o princípio da igualdade. Como se o voto de uns valesse mais do que o voto de outros. Como se as motivações de quem supostamente seria "esclarecido" fossem mais valiosas do que as escolhas de quem deveria estar subjugado. Contestar o resultado das eleições é reivindicar a subordinação dos mais pobres. É exigir que cada um saiba o seu lugar na sociedade.
E sejamos francos, é justamente disso que se trata. Não é economia, inflação ou corrupção. Não à toa a babacolândia tenha sequestrado provisoriamente a bandeira do Brasil. Eles lutam em defesa das nossas tradições. Lutam pelo Brasil da Casa Grande e da Senzala. Saem à rua sonhando com um futuro de volta para o passado. Aquele país em que todos sabem silenciosamente o seu lugar e os pobres aceitam de bom grado os favores de seus senhores até mesmo quando são currados.
Agora, até mesmo alguns setores do antipetismo estão assustados.
Não imaginavam a cara nem o tamanho de sua obra.
Quem tem um mínimo de senso de legalidade, apreço pelo Estado democrático de direito e gosto pela liberdade, percebeu o tamanho desta canoa furada. 
Alguns se deram conta que num futuro próximo serão mordidos pelos cachorros loucos espumando pela boca. 
Estão temerosos com os terríveis monstros que eles mesmos libertaram.
Quando as lutas sociais estão acirradas, recomenda-se escolher rapidamente um lado, sob pena de ser esmagado.
Quem não tiver nada a ver com o hipotético golpe que fale de uma vez. Coloquem os seus dragões de volta na caverna.
Do lado de cá ninguém está com medo. A nossa gente não vai permitir que isso aconteça. Não vai rolar. Não dessa vez. Simples assim!

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Apresentação sobre Reforma Política




Ontem tive a honra de fazer uma apresentação sobre Reforma Política na Universidade de São Paulo.

Fui convidado pelo grande amigo ProfessorWagner Iglecias para a IX Semana de Gestão de Politicas Publicas da USP. 

Foi um imenso prazer dividir a mesa com a Professora Esther Solano e o Professor Pedro Fassoni Arruda, ambos muito brilhantes

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Whatsapp, Adnet, Calabresa

Na mesma semana em que as pessoas ficaram perplexas com o dedodurismo do Whatsapp, que passou a alertar quando uma mensagem foi efetivamente lida pelo receptor, outro assunto ficou na boca do povo. A suposta traição por parte de um famoso à sua esposa também famosa, flagrada pelas lentes potentes de fotógrafos ocultos.

Parece existir um descompasso entre a modernidade tecnológica e seu impacto na vida cotidiana, com a preservação da fidelidade como um "último" valor aparentemente incondicional dos indivíduos.


Curioso como parecemos estar preparados para as mais diferentes novidades e inovações em matéria de consumo e até mesmo a aceitar novas experiências no nosso modo de vida.


Porém, persiste inegavelmente, a busca exigente e incansável pela fidelidade do outro.
Ao que parece, as novidades do consumo são muito mais bem-vindas, porque estamos preparados mesmo é para possuir. Para ter. Para ser dono.


O amor e suas diferentes formas tem mudado ao longo dos anos. Amamos de maneiras diversas. Até para isso estamos preparados. Mas nem a liberdade sexual, esta deliciosa novidade das últimas décadas, foi capaz de curar os homens e as mulheres do desejo de serem donos uns dos outros.


Nos mantemos enfermos de ciúmes, cultuando uma violência que para muitas pessoas seria absolutamente justificável e desejável quando o assunto é traição.


Esperava-se da moça traída pelo companheiro um tapa na cara, uma agressão, xingamentos ou uma humilhação vexatória e pública.


No fundo, as pessoas desejavam isso. Aplaudiriam com fervor qualquer demonstração de "dignidade" e toda violência estaria permitida e autorizada.


Algumas pessoas aguardam com excitação o momento de se descobrirem traídas. 


Os dois novos tracinhos coloridos do Whatsapp só vêm atender a demanda de seus clientes ansiosos, muito mais por pegar seu parceiro numa indescupável mentira, do que a desinteressante constatação da fidelidade alheia.


Para alguns, ser traído funciona como uma comprovação emocional de que se é melhor e mais justo do que a sua cara-metade. É como se o outro detivesse tudo aquilo de terrivelmente ruim que não podemos enxergar em nós mesmos.


Quem orienta toda a sua vida, seu cotidiano e sua rotina no temor permanente de ser corneado, no fundo está conferindo ao outro a responsabilidade pela própria realização.


Fica muito mais fácil e mais leve viver quando não é preciso carregar o próprio peso. Porque se algo der errado e se você for traído, sabe-se que você foi desgraçadamente vitimado por um mal que fugiu ao seu controle e ao seu merecimento.


A mesma tecnologia que criou delícias e facilidades às pessoas, permite aos senhores da guerra monitorarem suas ideias e seus passos, permite também que seu companheiro ou companheira saiba exatamente onde você está. É um serviço extra. Um produto oferecido como cortesia aos reles mortais por entregarem suas vidas ao controle dos poderosos.


E isso não tem volta.


Quem é que pode dizer o que é ou não é traição? Isso cabe a cada um. Aliás, é possível ser linchado socialmente e tornar-se um indivíduo estigmatizado e indesejável por ousar colocar em voga a sagrada fidelidade daqueles que sabem como ninguém que o inferno são os outros.


Porém, recomendo aos novos casais, daqui por diante, serem mais cúmplices e menos vigilantes.

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

O Corinthians e o futebol que aprendemos a amar não são assim!


Muitos amigos Corinthianos, os quais não havia tido a oportunidade de ser apresentado, passaram a me conhecer depois que escrevi um texto chamado "O porquê do vai Corinthians".
O texto foi lido por milhares de pessoas e trouxe coisas lindas na minha vida.
Os amigos mais próximos que me conhecem pessoalmente, sabem do amor imenso que tenho no peito pelo nosso Corinthians. Igual a todos vocês, dediquei a melhor parte da minha vida ao Coringão do nosso coração.
Não me arrependo de nenhum suor nem de nenhuma lagrima derramados. Mas confesso que estou muito decepcionado.
Não só com o Corinthians, mas com o futebol como um todo.
Pela primeira vez na vida perdi o desejo de ir aos jogos e até mesmo de acompanhar as partidas pela televisão.
Espero que isso mude, pois vivi momentos muito felizes e emocionantes nos jogos do Corinthians.
Lendo as últimas notícias vejo que o Corinthians pode ser punido pelo STJD porque:
1- uma bexiga inflável caiu no campo de jogo.
2- um cachorrinho entrou em campo no meio da partida.
3- em outro jogo, dois meninos pularam o muro e foram até os jogadores ao final da partida para tirar uma foto. Pior de tudo, para se defender de potenciais punições o Corinthians declarou que encaminhou os meninos para o Juizado de Menores!
Sei que muitos devem pensar que minha atitude é política. Mas digo sinceramente que não é. Porque politicamente, acredito que não há caminho melhor do que a participação para transformar tudo aquilo que não consideramos correto.
Porém, ocorre que minha atitude é bem mais preguiçosa. Este futebol que "os caras" construíram, absolutamente desumanizado e burro não é o futebol que eu aprendi a gostar. Simplesmente, não me interessa. Na verdade, eu gosto de outro jogo. Outro esporte muito diferente deste espetáculo deprimente que pretende apagar a nossa história e nos transformar em uma feia e triste caricatura do que se idealiza que seja o futebol europeu. Por debaixo de uma fantasia de modernidade se escancara um jogo absolutamente patético que não agrada mais a quase ninguém.
Internamente no Corinthians, o cenário também não é nada animador.
Voltando ao texto que escrevi, eu dizia que "Vai Corinthians" e "Aqui é Corinthians" eram, na verdade, elogios à simplicidade.
Hoje, eu vejo tudo no Corinthians, menos simplicidade. Ao contrário, percebo uma arrogância que não tem nada a ver com nossa história.
Fica nítido que o atual presidente não suporta a torcida. Para ele, a nossa massa é um inconveniente que se deve aturar para que o negócio continue. O time não joga do jeito que a torcida gosta, o técnico não é aquele que gostaríamos, a organização do estádio contraria o gosto da galera, a pior contratação da história do Corinthians, de um jogador que em nada tem em comum com nossa identidade, teve seu inevitável fracasso debitado da conta da torcida.
Simplesmente não nos querem.
O Ronaldo Fenômeno fez bem ao Corinthians, mas até a página 12. Fez-se uma interpretação equivocada do sucesso de sua passagem e ao que parece, decidiram que seria necessário desde então, mudar o perfil da torcida nos estádios. Uma atitude burra, além de uma violência cultural e social.
Quando o Ronaldo anunciou sua chegada, ele falou uma frase que virou clichê. Naquela ocasião foi empolgante, mas hoje poucas frases me irritam tanto. Disse ele que havia chegado "mais um louco do bando de loucos".
Ao que parece, eles estão confundindo as coisas. Ser louco é diferente de ser idiota!
A nossa loucura é aquela do "Maluco Beleza" cantada pelo Raul Seixas, misturando a maluques com a lucidez, na loucura real.
É se entregar de corpo, alma e espírito, mas permanecer vigilante e atento.
A boa loucura exige uma dose de irreverência e insubordinação. Não esta submissão e apoio cego, surdo e mudo que eles desejam.
Agora, o Mikey é do bando de loucos, os Simpsons são do bando de loucos, o Bono Vox é do bando de loucos. Só os nossos Zés da Silva que ficaram de fora.
O louco de hoje, bem-vindo como torcedor, é na verdade um alienado. Que torce, paga caro o ingresso e depois vai pra casa cuidar da vida.
O Corinthians não pode abrir mão de sua energia mobilizadora. De seu potencial de comunicação com a sociedade. O Corinthians é patrimônio histórico, humano e cultural do povo brasileiro.
Não pode haver Corinthians sem comunhão.
Espero mesmo que o próximo presidente resgate a ligação com a torcida e perceba que o Corinthians é uma grande comunidade.
Não dá pra dirigir o clube sem entender a importância da conexão com o espírito Corinthiano. Que não há vitória duradoura sem nosso inconsciente e consciente coletivo.
Quanto às demais estruturas políticas do futebol, estão transformando o esporte em algo muito distante da vida da gente. Roubando justamente o que ele tem de genuíno e que o diferencia dos demais desportos. O humanismo, a conexão com a vida social da nossa gente e a alma dos torcedores. 
Certamente, vocês vão ficar mais ricos do que já estão. Mas vão perder um público que não se interessa por este espetáculo tão broxante.  




terça-feira, 4 de novembro de 2014

Gislene e Francesco

 

          Gislene tinha de voltar logo pra casa. Seu filho havia amanhecido com febre. Sua irmã mais nova cuidava do menino. São ao todo sete irmãs, contando com Gislene. Todas viviam no mesmo apartamento no centro de São Paulo. Das sete, quatro já tinham filhos. No total viviam quinze pessoas no apê da Rua dos Guaianazes. Era um berrar e correr permanentes naquele pequeno espaço. O único homem era Lucas de sete anos, filho de Gislene. No mais eram outras catorze mulheres, entre adultas e crianças. 

          A avó resignava-se em ficar sentada o tempo todo em uma poltrona igualmente velha, segurando sempre um rádio antigo ligado na Rádio Capital AM. Não ousava se meter em nenhum assunto de suas meninas. Cada uma resolvia por si os seus homens, seus empregos e os destinos de suas crianças. Deixava que as filhas se esbofeteassem por um pedaço maior de bife ou pela televisão. Espera tranquilamente a hora em que uma das filhas coloca em suas mãos um prato de almoço ou jantar. Sempre guardam para ela um pedaço da mistura.

         As crianças raramente brigam por conta da mistura. Preferem comer bolachas recheadas e não ligam para comida. Elas também são livres para a escolha do seu cardápio. As mães consideram a refeição mais prática, rápida e barata. Naquela região da cidade existem inúmeras lojas de doces com grande variedade por preços módicos. Avisam uma só vez que o jantar está pronto, mas as crianças já se decidiram pelos doces. As mães sentem pena em privá-los das guloseimas. Quando meninas, mal sabiam o gosto de uma bolacha, de modo que consideram as crianças privilegiadas.

        Cada uma das adultas, exceto a avó, trabalha em bicos esporádicos. Mesmo que houvesse emprego daqueles com carteira assinada, não poderiam trabalhar todas ao mesmo tempo. Não haveria com quem deixar as crianças. Portanto, enquanto uma tem um emprego fixo, outra é diarista, outra é garçonete na madrugada, outra recebe seguro desemprego e outras produzem umas pulseirinhas em casa enquanto olham as crianças. Todas recebem algum programa social. O acúmulo desta salada econômica garante a comida com mistura, o aluguel, as bolachas e uma grana extra para gastarem no forró.

         Suélen, a caçula, pensa em ser diferente das irmãs. Tem dezessete anos e concluiu recentemente o ensino médio. Sonha em fazer faculdade de secretariado. Gislene tenta ajudar. Paga para a irmã olhar com cuidado o filho Lucas. Um cuidado especial. Entre todas as sete irmãs, existe uma afinidade específica entre Gislene e Suélen.

         Gislene ressente-se do seu destino. Seu filho não foi fruto de uma relação amorosa, tampouco prazerosa. Foi um acidente. Não que isso a impeça de amar ao menino, mas para ela é muito estranho perceber no rosto de Lucas a cara de um homem que não significou nada para ela. Nem amor, nem rancor, nem afeto, nem desejo. Nada. Já Suélen tem horror a homens. Diz em casa para que todas ouçam que nunca terá um filho. Também não lhe interessa as meninas. Simplesmente não da bola para o sexo. Tem outra expectativa: ser secretária executiva.

        Lucas tem febre e dor na nuca. Aguarda o retorno da mãe para tentar a sorte no Pronto Socorro.

        Gislene tem de voltar logo, mas o trabalho não é fácil. Procura concentrar-se em chupar o velho Francesco para terminar logo o serviço. Tenta não se incomodar com o odor azedo que sobe de suas virilhas. Acaricia sua pele murcha e emite sonidos de prazer para que o velho, por fim, despeje seu líquido cada vez mais raro e pague pelo serviço. Gislene não quer mal o velho, ao contrário. Agarra-se a ele com alguma dose de afeto. Não acredita mais no amor. Gislene pensou ter amado quando tinha catorze anos. Agora entende esse tal amor como coisa de menina. A realidade é outra. No mais, com Francesco ela não considera estar se prostituindo. Não há tantos conflitos pessoais. Ele é o único homem com quem faz programas. Finge ser sua amante e isso a conforta. Para Gislene, Francesco caiu do céu.

          Ele paga semanalmente. Nunca falha. Gislene visita seu apartamento na Bela Vista três vezes por semana. Ele recebe mensalmente uma aposentadoria razoável que é depositada da Itália diretamente para sua conta corrente. Ganha cinco mil e quinhentos reais. Gislene fica com mil e duzentos ao mês. Nada mal para o velho viúvo e solitário. 

          Francesco é tarado por Gislene. Adora passar o seu rosto gasto na pele lisa e cheia de sardas da jovem ruiva.  Pede sempre para que ela abra suas pernas e mostre seus pelos vermelhos libertos da gilete e da tesoura.  Seus seios são mínimos, porém firmes. Passa horas olhando e acariciando aquela mulher de vinte e nove anos. Quando não tem ereção ou quando Gislene está menstruada, sentam-se lado a lado e conversam sobre a vida. 

          O velho repete as histórias da sua infância órfã. Foi criado em um convento na Itália. Era a única criança que vivia no local. Conta sempre que tomava banho acompanhado das freiras que por vezes reuniam-se para tratar do garoto. Gostava dos pelos de Gislene porque em sua memória afetiva habitavam as inúmeras vaginas peludas e impossibilitadas de maiores cuidados das irmãs católicas.

         Quando completou dezesseis anos já era um homem. Se não o suficiente para cuidar-se sozinho, era homem formado fisicamente. A convivência no convento tornou-se traumática, mas não para Francesco, mas para as freiras que passavam muito tempo agitadas e estressadas. Por isso foi colocado em um navio rumo à Argentina. No entanto, foi obrigado a descer em Santos. Passou fome por anos até conseguir um emprego de garçom numa cantina na Mooca. Seguiu a vida até se casar com uma baiana que morrera faz cinco anos, deixando-o só. Não teve filhos. Não conhece os pais, nem tios, nem ninguém.

       Gislene suga com força. Olha fundo nos olhos de Francesco que por fim se entrega. Desfalece deitado no lado direito da cama, como de costume. Hoje ela não pode passar mais tempo na cama do homem, como faz normalmente. Pede trezentos reais ao velho, coloca na bolsa e corre em busca de seu filho.

       Chega ao prédio. Nem sequer lavou o rosto. Escuta os gracejos dos vizinhos nigerianos que passam o dia todo sentados na calçada jogando cartaz, bebendo cerveja e fumando maconha. Chegando ao sexto andar já pode ouvir o forró que grita alto no apartamento. Abre a porta. É impossível falar em voz baixa na sua casa. Só se fala berrando. Dia e noite os ruídos são os mesmos. O Forró, as crianças, a televisão, as irmãs histéricas. Chega à sala e a mãe permanece alheia a toda balbúrdia. Parece cochilar com o rádio ligado em seu colo.

         Nos braços de Suélen, Lucas parece estar delirando em febre. Gislene dá uma bronca na irmã:

- Menina, por que você não o levou para o hospital? 

- Eu não tenho dinheiro pra condução.

- Por que não pediu para as meninas?

- Elas disseram que eu só cuido do Lucas, então que eu pedisse dinheiro somente pra você.

       Gislene desceu o edifício e pegou um taxi. Sabia que o menino estava vivo porque seus braços queimavam, mas o Lucas não reagia a nada. Ao chegar ao Pronto Socorro viu que a fila era grande. Desesperada, ultrapassou a fila e começou a gritar pedindo ajuda. Outras mulheres tomaram a frente e protestaram:

- Hei boneca, você não vê que tem fila?

- Meu filho vai morrer.

- Aqui ta todo mundo esperando por mais de cinco horas, filhinha. Você vem aqui toda afetadinha e acha que tem privilégio.

- Meu filho não responde mais nada. Por favor.

          Ousou enfrentar a ira das outras flageladas e enquanto carregava Lucas em seus braços chutou a porta que divide a sala de espera e os consultórios invadindo o corredor. Entrou na primeira sala onde viu uma médica. Colocou Lucas sobre o leito do consultório.

- Pelo amor de Deus, salve meu filho. 

         Sacou os trezentos reais da bolsa e colocou na mesa da médica. A doutora segurou o menino, ouviu os batimentos cardíacos e levantou as pálpebras com o dedo. Devolveu o dinheiro para Gislene colocando-o na palma de sua mão e apertando firme. Chamou dois enfermeiros que conduziram o garoto para a emergência. Gislene quis acompanhar, mas foi impedida pelos enfermeiros. Quis permanecer no corredor interno do hospital, mas foi proibida pelos seguranças.

         Voltou à recepção do hospital para fazer o cadastro de entrada e aguardar noticias. Lágrimas escorriam pelo seu rosto. Enquanto procurava seus documentos foi atingida com um golpe na cabeça. Um tamanco pesado da mulher que reclamara o lugar na fila. Caiu no chão sangrando. Levou mais três chutes no estômago. Perdeu o fôlego e desmaiou.

          Levada à sala de sutura, um funcionário do hospital pediu que ela desse o telefone de um acompanhante para avisar o ocorrido. Sem poder pensar o porquê, forneceu o número de Francesco.

         Cansada, deprimida, ferida e preocupada, Gislene permaneceu inerte no leito. Estava em observação médica.   Não poderia adormecer. Olhava fixamente para o teto enquanto escutava os ruídos próprios de um hospital, como os gritos incessantes de bebês e médicos que repetiam exaustivamente os nomes dos pacientes que aguardam na sala de espera. De repente aparece sobre a sua visão o velho Francesco. 

         Ele não perguntou nada. Tampouco ela esforçou-se para explicar todo o ocorrido. Em poucos minutos uma ambulância levava mãe e filho para um hospital particular limpo e confortável.

        Enquanto esperavam pelo estado do menino, Gislene com um curativo na cabeça apanhou os trezentos reais na bolsa. Aquela altura o dinheiro a incomodava e envergonhava. Estendeu o braço e devolveu para Francesco. O velho tentou recusar, mas Gislene enfiou as cédulas no bolso da calça do homem. Ele aceitou e deu um meio sorriso.

        Naquele momento Gislene estava certa que chegara o mais próximo possível do amor. Nunca havia sentido gratidão na vida. Na verdade, nunca fizeram nada por ela para que pudesse agradecer, logo, aquilo era o sentimento mais acolhedor que já havia sentido. Lacrimejou, enxugou as lágrimas que pode, sugou o nariz e disse a Francesco:

- Você nunca mais tem de me pagar por nada.

        Francesco feliz respondeu falando baixinho:

- E você nunca mais vai ter que pedir.

          Segurou os ombros de Gislene com um misto de afeto e proteção. Ela sentou-se mais perto e gostou de sentir o cheiro de cigarro nas roupas gastas dele. Encostou sua cabeça no peito do velho. Não estavam mais sós.