quinta-feira, 12 de maio de 2016

O orgulho de ser o perdedor. Somos o sonho de liberdade



Continuamos nos esborrachando na história.

Morrendo pela espada de quem defende o status quo.

Porque as coisas são assim como são e ponto final.

Permanecemos esganados pelas mãos de quem odeia as ideias transformadoras.

Aqueles que outrora consideravam radicais e subversivos os homens e mulheres que combateram a escravidão.

Somos ainda sufocados pelos obscurantistas. Aqueles que precisam alienar o homem sobre a própria existência. Aqueles que tentam nos envergonhar justamente de tudo aquilo que nos torna humanos. Nossos desejos, nossos vícios, nossos fluidos, nossa fisiologia, nossos amores, nossa convivência. Tudo o que nos aproxima de nós mesmos há de ser considerado sujo, imoral, pecado e se possível estabelecido como crime.

Continuamos sendo queimados em fogueiras santas.

Não por acaso o conservadorismo político ajoelha safadamente no genuflexório do conservadorismo religioso.

A liberdade sobre o próprio corpo e a liberdade sobre o próprio espírito são as duas mães lésbicas de todas as outras liberdades. Quem é dono de si mesmo não abre só o corpo, mas abre a cabeça e a mente para novas ideias. Para outros sonhos lindos de liberdade. Quem não ajoelha no milho dos pastores severos, supera os dogmas e o medo do inferno. Não presta mais para ser escravo de ninguém. Questiona hierarquias cosmológicas e terrenas.

Façamos fila pois, para queimarmos em praça pública. A não ser que digamos em voz alta que o universo gira em torno da terra. Que o planeta não é redondo. Que viemos do barro. Que a Eva veio da costela de Adão. Que a miséria sempre existiu e sempre vai existir. Que é normal sair de casa e ver alguém comendo lixo à sua frente. Que devemos assistir milhões de pessoas sucumbindo às pestes e doenças por não pagar a patente do remédio. Que o homem leva um foguete até marte, mas os carros não conseguem andar sem combustível fóssil. Que se gasta trilhões em armas de guerra, enquanto vemos irmãos e irmãs da mesma espécie morrendo desnutridos como caveiras humanas. Tudo isso é normal! Gritemos! As coisas são assim e pronto!

Somos o incômodo do mundo. Os que não aceitam as fórmulas prontas. As malas que não se submetem e não acreditam em soluções simples. Os rebeldes. Não somos os bons filhos. Somos as filhas que vão para onde querem. Por isso precisam nos eliminar para manter a ordem e garantir o progresso. Ordem pra cima de nós todos e progresso em benefício deles poucos.

Quem aceita tudo de bom grado, quem acredita nas promessas como bom gado, quem confia no sistema, precisa necessariamente nos odiar. É preciso nos apagar para acreditar na própria felicidade. Para confirmar que as realizações que custaram tanto são realmente importantes. Que não se traíram tanto assim. Que a angústia que mora no fundo do peito não há de ser nada. Nossa coragem revela uma covardia geral. Por isso precisamos sumir. Por isso nos mandam pra Cuba, pro Nordeste, pra Coréia, pra Rússia, pra cadeia, pro cemitério.

Incomodamos mais do que qualquer governo. Mais do que qualquer partido. Somos o triunfo do Alecrim e a lágrima do Pierrô pelo amor da Colombina.

Somos o esforço humanitário contra a lei do mais forte. Somos o desejo de liberdade. A vontade de independência. Somos contra o imperialismo. Somos contra a opressão. Seguramente haveríamos de ser indesejados por quem aceita a dominação de bom grado e não se preocupa em questionar nada, com medo de perder o mísero privilégio que acredita possuir.

Não temos medo da luta. Questionamos as regras. Por certo que somos inimigos de quem dá as cartas.

Defendemos os Direitos Humanos. Obviamente seríamos detestados por quem aceita e apoia a tortura. Somos xingados todos os dias em horário nobre na tevê, no rádio, no jornal e na internet.

Denunciamos o racismo. Necessariamente haveremos de enfrentar os racistas. Àqueles que acham que o melhor remédio contra a injustiça é fingir que a injustiça não existe. E fiquemos todos falsamente amigos. Alguns com os privilégios. Outros com o chicote, as favelas e a exclusão.

Senhoras e senhores. Permitam-me chama-los de companheiros, camaradas, irmãos e irmãs, amigos e amigas. 
Meus amores.

Não derramem uma só lágrima. Não abaixem vossas cabeças supondo que foram derrotados. Não há do que se envergonhar. Não há porque esmorecer.

Há certas fogueiras onde é bom queimar. Há certas guerras onde é bom tombar. Há certas batalhas onde não há vergonha nenhuma em perder.

Há certas vezes na vida e na história que o melhor mesmo é estar entre os perdedores.

Simplesmente porque seria insuportável para nossa consciência livre estar entre os vencedores. Porque não haveria humilhação maior do que trair àquilo que acreditamos.

Ergamos nossas cabeças. Estejamos mais próximos do que nunca.

“Eles” berram alto. São raivosos. Vivem do golpe porque não convencem mais ninguém. Não tem condições de liderar. Não oferecem nada de novo. Não são alternativa para nada. Tudo que há neles é velho, arcaico e medieval.

A verdadeira evolução possível para os homens é a evolução nas relações humanas. Só haverá futuro possível multiplicando a cultura de paz

Vamos nos perder em boemias criativas. Em amores ardentes. Saiamos dos guetos e ocupemos as ruas, as praças, as avenidas. Joguemos fora todas as arrogâncias. Falemos com as pessoas. Sejam generosos. Aceite carinhosamente quem até outro dia pensava diferente. Vamos dividir o melhor que a gente tem e mobilizar o mundo em tremendas ondas de amor.

quarta-feira, 11 de maio de 2016

O dia que vale por décadas de atraso





Este é o dia que vale por trinta anos. Três décadas de retrocesso.

A redemocratização do Brasil era até então uma história de sucesso. O país melhorou sob todos os aspectos após o final da Ditadura Civil-Militar (1964 – 1985). Ainda que nas últimas três décadas tenhamos taxas absurdamente baixas de crescimento econômico, o Brasil aumentou sua importância relativa na geopolítica internacional e também sua importância econômica global. Os índices de desenvolvimento social foram muito superiores às décadas anteriores, sejam eles no acesso à educação fundamental ou ao ensino superior. Na expectativa de vida, na redução da mortalidade infantil. Na prestação dos serviços públicos. Na estabilização da moeda e na redução da miséria extrema.

Aos trancos e barrancos, no fundamental o Brasil ia bem. Sem superar totalmente as injustiças históricas, sem uma estratégia definida de desenvolvimento econômico e social, sendo reflexo da negociação entre os grandes interesses econômicos e as pressões sociais e políticas que ganhavam força e acúmulo, mas estávamos encontrando nosso caminho.

O mundo passou a enxergar o Brasil como uma potência emergente. Nos reposicionamos de maneira muito interessante na política externa. Ganhávamos o respeito e despertávamos o interesse de quem investia pensando no futuro.

Mas jogamos agora tudo na lata de lixo onde se depositam os livros de história que não serviram para nada.

Com todos seus problemas internos, o Brasil tinha algo que era uma espécie de trunfo para ser considerado uma aposta de futuro. Tínhamos estabilidade política. Uma democracia moderna, repleta de distorções (que agora se revelam como nunca), porém não haviam rupturas drásticas e a ameaça de convulsões políticas e sociais. As instituições democráticas trabalhavam todas livremente. O voto livre e secreto tornou-se universal e o resultado das urnas respeitado.

Já que a direita liberal gosta tanto de falar em “atrair investimentos externos” ou “ambiente de negócios”, vale fazer algumas reflexões.

Tal “ambiente de negócios” certamente não será mais o mesmo daqui por diante.

O fato de o Brasil ser uma democracia estável e até mesmo o fato de um operário metalúrgico ter se tornado presidente, sem que houvesse rupturas no processo político, certamente era decisivo para quem decidiu investir no país.

A direita liberal, com a sanha privatista que possui, deveria fazer uma reflexão. Em geral, os contratos de concessão envolvem duas ou três décadas. A confiança na estabilidade política é decisiva para um “ambiente saudável para os negócios”.

No governo do PT não houve ruptura de um só contrato que este país tenha assinado, ainda que alguns desses contratos tenham sido assinados de maneira espúria na calada da noite. Ainda que para desapontamento das forças políticas de esquerda, todos os acordos foram mantidos. Isso, sem dúvidas, foi de grande estímulo para os investimentos diretos.

No governo do PT houve permanente compromisso com a estabilidade da moeda. Ainda que tenhamos em algum período ligeira alta da inflação – por decisões políticas que também geraram ganhos para o país – não houve descontrole. A inflação foi compatível com os números do Governo FHC, por exemplo.

Ainda que existam interpretações diferentes sobre o papel do Estado na condução, regulação e orientação da atividade econômica privada. Ainda que os liberais sintam-se em condições de “acusar” o governo de intervencionista e interpretar livremente os resultados da atuação do Estado nos resultados econômicos, segundo a visão de mundo que dispõem, não há como dizer que este governo tenha inibido ou se apropriado dos ganhos do setor privado. Todo mundo trabalhou livremente. E ganhou dinheiro.

Houve plena liberdade de imprensa (inclusive liberdade de conspiração). Houve liberdade política. Liberdade de manifestação. Não houve aparelhamento de nenhuma instituição. Não houve mudança na Constituição! Lula não pleiteou um terceiro mandato. Dilma não foi apenas eleita. Foi reeleita pela maioria da população que, mesmo sob o efeito da crise econômica que se iniciava, fez o seu balanço e em sua consciência livre optou por mais um mandato à presidenta. Preferiu Dilma e negou eleger o candidato da oposição, talvez por entender que o que estaria por vir (e agora insiste em surgir), seria uma agenda muito mais crítica e danosa para a população mais pobre.

Quem acreditará que após o Golpe haverá confiança, reconhecimento e estabilidade no próximo governo, se justamente o governo eleito democraticamente foi destituído?

Quem acreditará que o resultado das próximas eleições será respeitado, quando não houve respeito ao voto de cinquenta e quatro milhões de brasileiros, não por acaso, em sua grande maioria, da camada mais pobre da sociedade?

Quem não irá acreditar que retrocederemos a um ciclo de golpes, contragolpes, golpes nos contragolpes, canetadas, tapetadas, carteiradas e assim por diante? Quem desejará investir (me refiro a investimentos sérios) num país assim?

Quem confiará que os contratos serão cumpridos em longo prazo, quando o maior contrato de todos não foi respeitado?

Qual capitalista não sentirá pavor de um próximo governo de esquerda (e sim, estejam certos que ele virá), quando se sabe que mesmo cumprindo todos os acordos, contratos e respeitando os lucros indecentes dos grandes bancos, frutos menos de seus méritos administrativos, mas de uma política de juros promíscua e perniciosa, este governo foi premiado com um Golpe tramado pelo o que há de mais sujo na política brasileira?

Quem acreditará que somente a força policial, a repressão e os crimes de Estado serão suficientes para garantir estabilidade para os “negócios”, quando mesmo os regimes mais detestáveis do mundo não suportaram ao desejo de liberdade de seu povo?

Por fim, qual investidor deste país não sentirá a ausência de um líder político capaz de mediar os grandes interesses das elites, negociando com as demandas sociais em suas diferentes expressões. Sendo que tais demandas não são de nenhum partido ou movimento social, mas de uma população que carrega o peso de séculos de escravidão, exclusão, miséria e abandono? O que fazer quando esse líder que consegue realizar esta mediação social é colocado na cadeia e na ilegalidade política?

Evidentemente, esta é uma derrota dos trabalhadores mais pobres do Brasil. A agenda que será imposta é de desregulação dos direitos e garantias, arroxo, desemprego, recessão e também repressão política.

Mas a luta social é uma necessidade permanente e cotidiana do povo trabalhador. Não há folga. A repressão acontece todo dia nos esculachos diários nas periferias. Nada de novo.

O comodismo político é um luxo que não deveria fazer parte do cotidiano do povo trabalhador. Quando este ocorre, inevitavelmente significa perda e mais submissão. O comodismo e desatenção política se convergem e rápidas e contundentes derrotas.

A parcela mais pobre da população certamente será sacrificada. Porém, o prejuízo histórico não estará restrito aos pobres.

A ambição desmedida. O ressentimento político. O preconceito. A tolice. Tudo isso custará muito caro ao Brasil.

Por hora, é interessante ver como a mentalidade escravocrata e precarização do capitalismo arcaico brasileiro se convergem num atraso que se precipita à política e ao Estado.

A política brasileira, refletida nesse Golpe é a cara da nossa elite: burra, atrasada, cafona, intolerante, egoísta e com uma visão muito estreita e limitada do que está por vir.

segunda-feira, 9 de maio de 2016

Meu Malvado Favorito


"Meu Malvado Favorito!"
É isso que acontece quando passamos por cima da democracia.
É isso que ocorre quando o país abre o precedente que abriu para o Eduardo Cunha. Ficando de joelhos. Permitindo tudo, aplaudindo as tempestades golpistas. Jogando na lata do lixo os ritos, trâmites, normas e processos.
É isso que acontece quando se tortura o regimento e as leis até que elas confessem.
Dá nisso quando se usa a "democracia" contra a própria democracia. Quando passamos a depender das atitudes intempestivas de quem "tem aquilo roxo", de quem é o "malvado favorito", de quem "faz o serviço".
É isso que acontece quando se ganha no grito.
Quando se passa por cima das urnas.
Quando se abre mão das regras comuns e passamos a aplaudir o golpe, porque assim nos convém.
Isso que dá aplaudir a exceção.
O problema de ser o país do Golpe é justamente se tornar o país do contragolpe. Do golpe no contragolpe. Do golpe no contragolpe do golpe.
O Brasil deve ficar assim por um bom tempo (um péssimo tempo).
O país das canetadas. Do juiz que derruba as canetadas. Do Congresso que derruba as urnas, Do tapetão que derruba o Congresso. Das pessoas que aplaudem quando o golpe é contra o candidato em que ele não votou. Do país em que ninguém se suporta. Onde ninguém se entende.
E assim será até que não tenha mais eleições, nem deputados, nem juízes, nem leis e nem nada.
Será a lei do mais forte. Voltaremos definitivamente à barbárie.
Como sempre, controlará a situação quem dispõe das armas.
Vão colocar o trabuco na cara da sociedade até que ela se acalme. Muitos irão aplaudir isso também, se assim for conveniente.
Isso pode funcionar por um tempo.
Até que a raiva se acumule e entremos em erupção. Mas a raiva não é remédio para nada. É a pior das armas.
O problema do Golpe não é derrubar o PT, o PSDB, o PMDB nem nenhum outro partido.
O problema do Golpe é que aquilo que um dia nos convém, no outro nos esmaga. É ninguém respeitar a escolha de ninguém. É o ressentimento correndo nas veias de todos. É jamais existir o consenso.
É assim que querem o Brasil.
Precisam do Brasil paralisado e anestesiado.
Se esse povo soubesse a grandeza do Brasil…
Estaríamos melhor num abraço fraterno, respeitando nossas diferenças.
Mas somos tolos.
Nossa tolice é mais eficiente do que dez mil bombas!