quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

Sociedade desigual, mas culpados em igualdade?



Costumo rejeitar as conclusões de que o homem seria o pior animal que existe e que deveríamos ser extinguidos para que a natureza pudesse retomar sua harmonia. 
Também não sou entusiasta do discurso determinista que a humanidade deveria evoluir como um todo para que pudéssemos aprender a conviver uns com os outros, encontrando a "verdadeira paz" que estaria dentro de nós.
O homem é parte integrante do meio ambiente. Não faz sentido e não pode dar certo nenhuma ação de preservação ambiental que não compreenda a interação do homem e suas necessidades básicas de alimentação, saúde e moradia. Estas necessidades estão relacionadas diretamente com o acesso à terra, habitação e subsistência. Qualquer ação que supostamente se proponha a cuidar da natureza, mas não enfrente diretamente estas questões, é ineficiente, quando não hipócrita e mentirosa.
O ser humano tem sim a vocação para a paz. Seu potencial transformador é o que permite sua evolução constante e dissemina o bem-estar e a preservação da vida.
Ocorre que geralmente somos "ensinados" que o "homem" estaria acabando com a natureza, que "estamos" consumindo de maneira predatória os recursos naturais.
Muitos queridos de boa fé adotaram um modo de vida "sustentável", produzem menos resíduos, fazem uso racional dos recursos. Outros fazem votos espirituais, místicos e religiosos para melhorarem sua relação com o mundo em que vivemos.
Da mesma forma que a concentração das riquezas se dá de maneira escandalosamente desigual e o uso e distribuição dos recursos também ocorre de forma violentamente concentrada, as responsabilidades também não são equivalentes.
Segundo estudos da Oxfan International, as 85 pessoas mais ricas do mundo concentram a mesma riqueza que os 3,5 bilhões mais pobres. Estima-se que 1% da população mundial concentre metade de toda a riqueza do planeta.
As relações econômicas, sociais, políticas de trabalho e renda não são dados da natureza. Não são "como são" porque "assim são". A energia produtiva do homem não serve ao homem, mas ao interesse dos magnatas e poderosos. Os Estados não servem para regular a vida social dos indivíduos e organizar as atividades econômicas, procurando preservar o bem comum. O Estado usa sua força para preservar o interesse do Mercado (com eme maiúsculo) e as grandes corporações que para garantirem os lucros desta parte minusculamente mais rica, estão torrando e tornando insuportável a vida no planeta.
E o que isso tem a ver com a água que está acabando na maior cidade do hemisfério sul?
Para além das alterações climáticas e as evidências de que a natureza está dando sinais claros de saturação, a falta de água revela que vivemos muito mais do que uma crise hídrica, mas uma crise social e política.
O neoliberalismo estrangula a capacidade de investimento do Estado em infraestrutura. Enquanto despejamos bilhões para lubrificar o mercado financeiro especulativo e enviamos manifestantes protestando pelo superávit primário na porta do congresso, sacrificamos boa parte da vida nacional. Nas últimas décadas, o Brasil deixou de investir onde deveria.
Surpreende o fato de o maior estado da nação, com estabilidade política para realizar obras de médio e longo prazo, já que o mesmo grupo reina em São Paulo por três décadas, não ter sido capaz de se planejar para uma crise desta natureza.
A crise não é meramente do abastecimento de água, mas uma crise do saneamento básico. Como é possível uma metrópole como São Paulo ficar sem água? Com os rios importantes que cortam nossa cidade? Com riachos e córregos espalhados por todos os bairros e vilas? Os rios, riachos e córregos de São Paulo que deveriam ser uma benção para nossa população se converteram em fluxos de merda e todo tipo de detrito. O que deveria ser o grande trunfo de São Paulo, tornou-se ao longo dos anos um incômodo indesejável. Políticos ganharam eleições  canalizando, tapando e escondendo água podre a tudo custo.
A crise é antes de tudo social e política porque se sabe muito bem o que deveria ser feito.
A questão é que existe uma disputa feroz pelos recursos públicos e o que menos importa nessa guerra são as pessoas. Ora, que tipo de gasto poderia ser mais importante do que a água?
Agora, e somente agora, descobriu-se que precisamos tomar água da represa Billings. Às pressas se decide purificar a água para consumo. Há quantos anos existem campanhas desesperadas para o salvamento da represa?
Alguns voltam a culpar o ser humano pelas moradias irregulares em área de manancial, matas ciliares, etc.
Ora, a população pobre não  vive na beira do córrego ou da represa por estilo de vida! 
As moradias distantes e precárias revelam a crueldade da nossa construção social.
Neste país com tanta terra não garantimos nenhum quinhão a população pobre que foi enviada às favas. Às favelas.
A moradia ainda não é vista como um direito humano, mas um benefício e uma facilidade a quem não mereceria mais terra do que sete palmos acima da cabeça.
Que tipo de ser humano se espera que surja em meio aos escombros e ao esgoto? Com que tipo de apreço à justiça e à liberdade? Como se espera que um indivíduo que não tem garantida a própria subsistência viva em harmonia com o ambiente que o cerca?
Agora, pagamos todos o custos pela sociedade perversa construída pelas elites.
Poucos foram os predadores. Alguns receberam alguns parcos privilégios e acreditam pertencerem ao time dos vencedores. Consideram-se ricos, mas não foram nada além do que combustível do sistema que irá vitimar a todos, sem exceção.
A grande maioria é composta por inocentes úteis. Que aceitam a opressão e se conformam com algumas quinquilharias eletrônicas vendidas na tevê.
Se nos fosse oferecida a opção entre ficar sem água ou sem internet no celular, seria possível que a primeira opção saísse vitoriosa. 
Em outras palavras, vamos pagar caro pelo mundo que escolhemos viver. Ou pela opressão que não pudemos vencer.
O fato é que ou a humanidade derrota o capitalismo ou o capitalismo acabará com a vida humana. Mais rápido do que se imagina.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Temendo o diabo errado. Um enredo sobre a miopia política.




Se estamos ou não estamos em processo de apocalipse eu não sei.
Mas efetivamente a sensação é essa.
Estamos fazendo aquele barulho irritante de quem suga pelo canudo o final da água no fundo do copo.
A água vai acabar. Este é um dado inexorável. A água vai acabar muito antes do imaginado. O castigo veio a galope.
Estaríamos nós todos sendo punidos pelos céus?
Acredito que sim!
Mas nosso pecado não é exatamente provocar a ira de deus. Muito mais grave foi que durante anos tememos o diabo errado.
Somos uma legião de pregadores missionários, detentores da verdade absoluta, definhando no sol escaldante e carregando um deus debaixo do sovaco. Julgamos saber muito sobre esse deus, mas ignoramos por completo a obra e a cara do tinhoso.
Fugimos de um inferno mitológico que se situa além da imaginação, e não nos demos conta que já estamos cercados num inferno que a gente mesmo construiu.
Junto com a água vai acabar a energia.
Pela falta d'Água se culpa a Deus.
Pela falta de luz se culpa o governo.
Mas não importa! Estamos todos temendo o diabo errado.
O fim do mundo está sendo televisionado.
É impossível assistir um telejornal. Não há trégua. As notícias são sempre devastadoras, raivosas, com baba escorrendo pelo canto da boca do comentarista.
A televisão formou uma geração de despolitizados histéricos. Gente que desconhece a história, mas repete o comportamento violento, intolerante, intransigente e messiânico de outros tempos. Todos com um deus debaixo do sovaco, mas temendo o diabo errado.
A esquerda parece contaminada pelo pânico geral do apocalipse. Todos se acusam e se culpam pelo fim do mundo. Enquanto uma parte repousa e espera o fim dos tempos no ar condicionado, muito satisfeita consigo mesma, uma outra parte que prega nas ruas diz não falar em nome de deus. Dizem inclusive que não acreditam em deus. Mas ainda assim temem duas dezenas de diabos. Cada um no seu segmento se divide em sub seguimentos sub ideológicos. E o diabo sempre estaria ao lado de quem não reconhece a importância do seu segmento.
As vezes o povo só irrita, porque ele não entende nada do que se fala nos grandes salões da guarda real filosófica da esquerda muito esquerda pra caralho. Além do mais, o povo certas vezes tem a incômoda mania de contrariar em seu cotidiano a teoria que deu tanto trabalho para ser digitada e postada nas redes sociais.
Cacete! O fim do mundo parece realmente estar próximo! Diziam que o mundo iria acabar em algum momento na virada do milênio. Talvez ele já tenha acabado e estejamos todos nesse inferno quente, sem água e cheio de notícias tristes.
Pode ser também que esse inferno tenha prazo de validade. Que estejamos todos sendo novamente enganados. Tão logo o coisa ruim consiga o que ele quer teremos a súbita percepção de que estaremos no paraíso. Inundados por uma enxurrada de notícias boas e aí então obrigados a acreditar que tudo vai bem.
Mas enquanto isso, seguimos cada um com seu deus guardado debaixo do sovaco e temendo o diabo errado.
Enquanto a gente culpa o diabo do partido político do vizinho pelo apocalipse, o satanás permanece oculto. Um ser que não tem rosto nem forma. É como um espírito maligno que ronda nossas vidas.
A sociedade se digladia. E o Mercado (este sim com eme maiú$culo) sorri serenamente e despreocupado. Ele já sequestrou o Estado, a imprensa, a cultura, a história. Roubou o indivíduo de seu próprio tempo e de seu próprio destino.
Acontece que é muito complexo falar do Mercado.
Melhor mesmo nos ocuparmos dos nossos capetinhas. Os azuis culpam os vermelhos. Os vermelhos acusam os azuis. As outras cores se misturam como podem. 
Os políticos são bem pagos para serem os bois de piranha do nosso tempo. Seja no Brasil, seja no resto do mundo.
E quanto a nós? Estamos sendo punidos por nossa ignorância. Por carregar cada um o seu deus debaixo do sovaco e temer o diabo errado.

domingo, 18 de janeiro de 2015

Os que são e os que não são Charlie


Agora, estamos divididos entre aqueles que são Charlie outros que não são Charlie.
Não creio que seja ruim as pessoas estarem conectadas às notícias de seu tempo e fazendo o possível para se engajarem no processo histórico. Ao contrário, isso é muito bom.
Mas tenho percebido que vivemos uma espécie de dança das cadeiras ideológicas.
Quem nunca brincou esse jogo em alguma gincana? 
A música fica tocando bem alto, alguns competidores vão dançando em volta das cadeiras. Invariavelmente existe uma cadeira a menos do que o número de participantes. Subitamente alguém abaixa a música. Quem ficar sem lugar para sentar é eliminado da competição até que haja apenas uma cadeira e um único vencedor.
Isso parece ocorrer com os grandes temas globais. As pessoas ficam atentas para rapidamente escolherem a cadeira certa, antes que a música pare e a notícia se esgote, sem tempo hábil para um posicionamento.
Em outros tempos, quando os partidos políticos e as organizações não tinham se deteriorado desta forma e perdido a capacidade de disseminar uma espécie de unidade ideológica, as coisas não pareciam ser tão complicadas.
Mas hoje, na era das redes sociais e a importância estética que elas exigem, as adesões e os posicionamentos pairam no ar. Não dependem e não ambicionam uma consequência política. De alguma maneira, todos são ativistas digitais em algum nível, mas não se encontra um inimigo comum. Definir o "inimigo" é tarefa fundamental para o sucesso de uma jornada ambiciosa e consequente. Porém, os inimigos são fluidos. A luta "contra os políticos corruptos" impõe um discurso diferente da "luta contra a miséria", da "luta contra a liberdade de expressão", da luta "em defesa da democracia", da luta "pela igualdade racial" e todas as anteriores jamais seriam suficientes para dar conta da "luta contra o machismo".
Não que essas causas sejam menos importantes. Ao contrário. São urgentes! São lutas que todos devemos lutar.
Mas os estruturalistas parecem ser dinossauros, antiquados e fora de moda nesta sociedade em que todos parecem ter a sua causa particular e colateral.
Onde a arrogância é fomentada pela ilusão de quem foi ensinado a "saber de tudo".
Onde existem tantos inimigos quanto supostos heróis.
Vivemos um tempo em que parece existir uma epidemia da fantasia infantil de onipotência.
Em que todos disputam nas redes sociais a aprovação que antes se esperava da mamãe e do papai. 
Uma ilusão imatura do "bom mocismo".
A reivindicação do direito de ser "politicamente incorreto" surge em alguma medida da necessidade, ainda que subconsciente, de restauração das velhas hierarquias e estruturas de poder. Um tempo em que todos sabiam o seu lugar na sociedade e não reclamavam por serem subjugados.
Mas do mesmo modo, no outro lado da moeda, existe uma perseguição tola a uma espécie de heroísmo de salão de festas de condomínio. Onde se persegue muito mais a estética do que a coerência.
As pessoas exclamam que #FulanoTeRepresenta até a página 12. Se por algum motivo sua posição não é suficientemente boa nesta "pauta" tão líquida dos nossos dias, imediatamente sentem-se no direito de ofender até a sua oitava geração. Ofensas que até um tempo atrás seriam suficientes para o cabra pegar a peixeira é defender a sua honra. Mas não. Tudo é muito infantil, distante e instantâneo. Nem vale a pena guardar ressentimento.
Certamente, o mundo já foi um lugar mais simples para se viver. Talvez também mais desgraçado e violento, mas sem dúvidas já foi menos complicado.
Sem tantos mocinhos, sem tantos heróis. Mas talvez mais humano e menos cínico.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

A liberdade não pode ser uma via de mão única.


O ataque contra o jornal Charlie Hebdo com o assassinato de seus principais colaboradores oprime a todos aqueles que valorizam a liberdade intelectual, o conhecimento e o humanismo como ferramentas para vencer o obscurantismo, o preconceito e a violência dos conservadores radicais que desde sempre violentam a humanidade, tentando impedir os avanços que podem transformar o planeta num lugar melhor para se viver.

A liberdade é ameaçadora, pois coloca em cheque os poderes estabelecidos em interesses invariavelmente perniciosos. Durante séculos as religiões têm sido utilizadas para os piores propósitos de dominação e escravidão. A liberdade e a igualdade são subversivas, pois ofendem as hierarquias estabelecidas, os sistemas de servidão e iluminam a escuridão tão conveniente aos poderosos que se servem de deuses para manter mecanismos de poder.

Porém, a defesa da liberdade e o conhecimento contra o obscurantismo, está longe de ser uma prerrogativa do ocidente sobre o oriente.

A liberdade não é uma via de mão única.

A interferência dos países do Atlântico Norte, sob liderança dos Estados Unidos, no Oriente Médio é desastrosa! 

Os tsunamis ocorrem não por mera revolta das ondas do mar, mas pelos abalos sísmicos que ocorrem no fundo do oceano.

O terrorismo não é uma força da natureza, mas uma ferramenta política cada vez mais conveniente para algumas forças, diante de um cenário de dominação hegemônica. A violência torna-se um método para responder de maneira colateral às ofensas impossíveis de serem enfrentadas de maneira frontal. É também uma forma de manifestação que procura romper o silêncio imposto pela versão oficial dos vencedores.

Da mesma forma, os Estados religiosos surgem como alternativas possíveis de mobilização das energias nacionais para enfrentar a fragmentação e a deterioração desencadeadas pelos inimigos externos.

De nada adianta os chefes de Estado dos "países livres" do ocidente expressarem suas condolências e seus pesares, manifestando a preocupação com o atentado às liberdades tão caras à democracia burguesa se por outro lado continuam fomentando o ódio, o genocídio e o desrespeito em outros continentes.

A paz de alguns não pode ser conquistada e mantida às custas da desgraça de outros povos. As "bombas da paz" despejadas contra o povo árabe não vai produzir nada diferente do que gente acostumada a conviver com a violência e a barbárie. O apreço pela liberdade não será disseminado com mais imperialismo. A paz não será alcançada com o comércio e contrabando de armas tão convenientes aos senhores da guerra vestidos elegantemente com seus ternos caros em cargos de decisão nos países ricos. Ninguém aprenderá a amar a liberdade sendo escravo de outros povos.

Lamentável que esta tragédia tenha ocorrido num jornal controverso e irreverente. 

Este episódio nos dá conta de que a paz, a liberdade e a democracia que se imagina ter sido conquistada no "mundo livre", na verdade é privilégio de muitos poucos que tem a sorte de viver em algumas ilhas de prosperidade espalhadas em alguns cantos do planeta. Para a imensa maioria da humanidade permanecemos em guerra, sofrendo violência, miséria e injustiças cotidianas. Violência essa, que vez por outra respinga nos bolsões de tranquilidade riqueza.



O Carão na Esquerda e o Segundo Governo de Dilma

Artigo publicado na versão digital do Jornal Estadão.




No decorrer do processo eleitoral, o apoio dos movimentos sociais e das correntes políticas de esquerda foram fundamentais para a vitória da Presidenta Dilma.
O discurso truculento e inflamado de parte dos setores conservadores da sociedade brasileira mobilizou as forças progressistas. Um fração considerável dos apoios recebidos por Dilma, partiu justamente de quadros que haviam nutrido críticas importantes ao primeiro mandato da presidenta, no entanto, diante da disputa acirrada, mostraram seus rostos e manifestaram seu apoio à candidata do PT.
O fato é que foram pouquíssimas forças políticas da esquerda que não apoiaram, em algum nível de intensidade, a eleição de Dilma no segundo-turno. O resultado apertado do pleito deixa evidente a importância destas correntes e movimentos na reeleição da presidenta.
O Ministério do segundo governo de Dilma decepcionou muita gente que imaginava a sedimentação de uma nova aliança, depois do antagonismo acirrado que ficou evidente nas disputas durante o período eleitoral.
Parece nítido porém, que Dilma fez a opção por costurar uma trégua com algumas das forças que se opõem ao seu governo. A equipe econômica, por exemplo, é uma evidente sinalização do esforço da presidenta em reestabelecer a boa convivência com o mercado financeiro que dava sinais claros de mal estar e desconfiança.
Dilma esforçou-se também para reconstruir sua base de apoio parlamentar, trazendo para dentro do governo as principais forças políticas do congresso. Pode-se dizer que o Ministério de Dilma não é menos conservador do que o Congresso Nacional eleito pela população brasileira.
Desde junho de 2013, Dilma não teve um minuto de descanso. As forças que se opõem ao seu governo vislumbraram desde então uma possibilidade de minar, desestabilizar e fissurar o seu mandato até a exaustão.
A solidez do Governo Dilma frente às tempestades políticas do último período se deve a três fatores principais, além da óbvia negociação de apoio com os partidos aliados. Primeiramente, o nível de emprego permanece preservado. O país continua com o desemprego mais baixo em nossa história recente. Outro fator é o controle da inflação. Ainda que haja um aumento significativo no custo de vida, sobretudo nas grandes cidades, não existe descontrole de preços ao consumidor. O terceiro fator que garante a estabilidade política é a aliança entre o governo e a sociedade civil. Ainda que existam movimentos sociais importantes de oposição, a maior parte dos trabalhadores não se voltou contra o Governo Dilma. Acrescenta-se a isso o fato de a presidenta ter sido recentemente reeleita. Pesa decisivamente, a articulação com a sociedade dos movimentos ligados aos partidos que apoiam o governo e a gigantesca importância do Presidente Lula, sem dúvidas o grande fiador político de Dilma.
A presidenta optou por preservar os dois primeiros fatores, ou seja, a estabilidade econômica como forma de controlar a temperatura do caldeirão político.
Vimos que o governo tenta negociar uma trégua com o mercado, reestabelecer sua base de apoio no congresso, preservar a estabilidade econômica e garantir alguma tranquilidade política para superar este momento de adversidade.
Mas o “carão” da esquerda neste começo de segundo mandato pode custar caro ao governo caso os resultados não saiam conforme o planejado. Até o dia anterior à eleição o Governo Dilma estava sob ataque. Desprezar a aliança com as ruas pode ser decisivo caso um novo junho vier.
Garantir o apoio da “base aliada” é fundamental, porém, para o segundo governo será necessário mais do que isso. É preciso sedimentar as conexões com a sociedade civil. Disputar espaços em setores da classe média que foram desprezados. Trazer resultados efetivos e serviços públicos de qualidade para a população que vive nas grandes cidades. Estabelecer uma nova dinâmica de comunicação com a sociedade e superar a fórmula desgastada do “eleitor consumidor”.
Esta última eleição mostrou que o eleitorado tem motivações que vão muito além do bem-estar material. O PT perdeu espaço justamente no que se passou a conhecer como “nova classe média”. No frigir dos ovos o que decidiu a eleição fundamentalmente foi a política e não exatamente os resultados do primeiro Governo Dilma.
Não adianta a presidenta fazer política apenas no Plano Piloto da Capital Federal. É recomendável estabelecer novas pontes com a sociedade e evitar constranger exageradamente sua “base de apoio” no eleitorado brasileiro.