quarta-feira, 23 de dezembro de 2015

Horda de Mauricinhos Perseguindo Chico Buarque






Um bando de mauricinhos babacas (tudo cuzão) se sentiu no direito de cercar o Chico Buarque de Holanda no meio da rua, com aquela abordagem burra, como de costume.
Cobravam o fato dele "apoiar o PT".
O Chico ainda respondeu com paciência: "mas é minha opinião".
Gastou o tempo e a energia dele dando atenção para aquela gangue.
A turma do bullyng, educada desde sempre para fazer valer, nem que seja na porrada, o seu ponto de vista, odeia a igualdade, mas também não sabe conviver com as diferenças.
O mais exaltado cobrava o Chico com veemência por ele supostamente morar em Paris.
Puta que pariu.
Logo eles vão cobrar isso do Chico?
Uma horda que desde sempre rejeita, odeia, nega e despreza o Brasil.
Qual problema se caso o Chico vivesse em Paris? Eles não saem de Miami...
Nem conseguem viajar para algum lugar em que o conhecimento histórico e cultural sejam relevantes. Não podem parar para pensar durante dois minutos porque a cabeça não tem substância.
Não suportam conhecer nada que seja muito diferente de um shopping center ou uma paisagem de cartão postal pra postar no Insta.
Não sei se o Chico vive em Paris. Mas caso viva, tem seus motivos. Trombar com esse Zé Povinho metido a Socialite falando bosta deve ser muito brochante mesmo.
Vivendo no Rio ou vivendo em Paris, ninguém pode impedir o Chico de falar sobre os problemas do Brasil. Até porque, poucas pessoas conhecem tanto sobre o Brasil como o Chico Buarque.
O Chico é de família real. Seu pai foi o intelectual que talvez melhor tenha explicado as raízes do Brasil contemporâneo. E diga-se, permanece absolutamente atual.
Poucas pessoas falam tão bem sobre o Brasil como o Chico.
Ninguém pode ser mais importante na cultura brasileira como o Chico.
Nesse país onde a burrice parece ser tão adorada, o Chico é um respiro de integridade. É um brasileiro para se olhar e se ouvir e sentir-se melhor por ter nascido aqui.
Que violência!
Esses merdas deveriam reverenciar o Chico.
Quisera eu ter passado na mesma calçada que o Chico.
Quisera eu ter a chance na vida de ter cinco minutos de prosa com o Chico.
Esses playboys tiveram essa chance. E deperdiçaram, como fazem com tudo aquilo que a vida lhes deu. Não valorizaram.
Não por acaso o Chico se tornou um alvo tão odiado.
Para o triunfo da estupidez, da imbecilidade e do tacanho, torna-se necessário primeiro destruir o que é integro e virtuoso.
A simples existência do Chico denuncia de maneira factual e explicita a ignorância dessa gente.
O Chico sem fazer muito, revela de maneira avassaladora e insuportável para eles, a pobreza de espirito dessa classe.
O Chico pertencer a elite (viver em Paris) e manter sua postura e sua posição política, não caindo de joelhos para beijar a mão e ganhar o afago desses que se acham os reis do mundo, agride, pois deixa evidente como "eles" são desimportantes. Como toda essa bosta que eles valorizam não serve de nada.
Que mesmo acumulando todo o dinheiro do mundo, "eles" permanecerão pobres. Muito pobres. Porque são pobres de espirito.
Salve Chico Buarque de Holanda.
Não liga pra esses merdas.
Nós te amamos muito, Chico

sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

Muito Além



Para além de toda mesquinharia cotidiana existe um lugar de generosidade e altruísmo.
Para além dos coices amargurados, existe o lugar dos sorrisos largos, do conforto que se encontra na doçura, nos abraços apertados.
Para além de tanto tormento e angústia, existe um lugar onde o sono é tranquilo e pesado. Onde se dorme esparramado, com os braços jogados para cima e a boca aberta, feito criança.
Para além do caos e a sensação de que tudo vai explodir, existe um lugar onde o cheiro de comida caseira invade todos os espaços, ocupa a sala, o quarto, o coração e a vida.
Para além dos saltos e dos pulos para escapar das rasteiras do dia-a-dia, existe um lugar onde habita a confiança, a amizade, a consideração, os celulares que dormem tranquilos sem o medo de serem violados, os olhos nos olhos, o desapego, a harmonia.
Um lugar com vestidos floridos e alegres. Vestidos simples, mas acompanhados de um valioso brilhante que se usa dentro do olhar, combinando com o sorriso ancho.
Um lugar que rola um samba antigo falando de amor.
Um lugar com cheiro de areia, mar e protetor solar.
Um lugar pra se corromper a noite. A boemia. As sacanagens. Os pecados perdoáveis. Os pileques. A música de preto.
Um lugar onde não se passa perfume para dormir. Nem creme. Só pele com pele. Seios fartos. Alma lavada. A carteira com o cartão do banco guardada em algum canto. Eles já não são tão importantes assim. Nem o extrato do banco. Nem o saldo para fazer a conta se mais foi amado ou mais está amando.
Deixa tudo pra lá.
Tem coisa muito melhor na vida da gente.
Logo mais haverá um conto erótico no pé do ouvido.
Num lugar que vai muito além de tudo que é chato e opressivo. Que não é perto nem é longe. Ele só vai além. Muito além.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

25 anos do 1º Campeonato Brasileiro em 1990

A molecada talvez não saiba. Talvez não se dê conta.

Depois do sexto campeonato brasileiro, somado aos três da Copa do Brasil, Libertadores e os dois Mundiais, fica difícil mesmo explicar como era difícil para o Corinthians ganhar um título para além do estado de São Paulo até 1990.

Havia quem dissesse que a culpa era do nome. Corinthians Paulista nos condenaria a ficarmos eternamente restritos às conquistas regionais.
E comemorávamos muito o Campeonato Paulista. Valia muito mesmo.
Era tudo muito mais simples. Pra gente, durante muito tempo, talvez nem fosse tão importante como é hoje ganhar esses campeonatos “distantes”.
O mundo era muito maior. A gente não dizia: “vou à praia”. A gente viajava para “Santos”. “Santos” era como se chamava todo o litoral paulista antigamente, desde Peruíbe até Ubatuba. Era solene. Importante. Na volta das férias a gente fazia um desenho para a professora escrito: “MINHAS FÉRIAS EM SANTOS”
E no Corinthians que aprendemos a amar, a realidade era mais simples ainda. O clube era bem simples. Nas alamedas do Parque São Jorge os senhorezinhos falavam com aquela voz de Adoniran Barbosa.
Hoje em dia, se o Corinthians passar dois anos sem ser campeão já é crise. 
O Setor Oeste de Itaquera, muda de cor a cada camisa nova que a Nike lança. Antigamente, camisa do Corinthians, comprada na loja ou no camelô, era feita pra durar. A gente usava até o tecido ficar parecendo uma lixa. A camisa ficava desbotada, cheia de bolinhas. No segundo-tempo do jogo, a gente suava e aquele pano fervia e dava uma fedentina desgraçada. Mesmo assim, a gente abraçava o amigo na hora do gol. Colocava e recebia aquele sovacão no meio da cara.
Em 1990, a camisa do Corinthians produzida pela “Finta” ganhou uma golinha preta. Já era uma variação. 
O time tinha o Ronaldo que era um monstro. Uma força da natureza corinthiana. Quem jogasse bola na rua, aceitava ser goleiro só pra fazer uns malabarismos, dar um salto e gritar: ESPAAAAAAALMA RONAAAAALDO! 
Tinha o Giba que era ótimo. Hoje seria seleção. O Marcelo era de família corinthiana. Grande Zagueiro. O Márcio não perdia viagem. Era folgado. Corinthiano. No ataque tinha o Fabinho de ponta direita. Hoje o Fabinho seria titular de qualquer time. Era rápido, habilidoso e principalmente esforçado. O Fabinho tinha habilidade, mas não era firulento. Era mais raçudo mesmo. Incansável. O Dinei era feito no terrão. O Mauro de ponta esquerda era meio grosso, mas tudo bem. Jogava para o time. O Tupãzinho jogava muito. Em todas as posições. Conseguia ser decisivo sendo titular ou entrando no segundo-tempo. Era minúsculo, com habilidade maiúscula. O Wilson Mano era como se fosse um torcedor jogando. Parecia que tinha saído da arquibancada direto para o campo. Não se parecia com um jogador profissional. Não tinha cacoete. Mas era aplicado ao máximo. Tinha estrela. Era como se a gente tivesse entrado em campo arrumasse um jeito pra ajudar o time com o recurso que fosse possível. Foi assim que o Mano fez o gol de joelho no primeiro jogo da final. Se não desse de joelho, seria de algum outro jeito. A bola tinha que entrar. E entrou. Graças a Deus.
O Neto era uma espécie de redentor. Ele já era um craque reconhecido quando veio para o Corinthians. Um cara com personalidade forte, meio problemático, que os técnicos não gostavam. Mas um craque. A gente não teria dinheiro para contratá-lo. Veio parar numa troca com o Palmeiras, porque o Leão queria se livrar dele. Um negócio improvável. Por isso que deu certo.
Ele entendeu como quase ninguém o que significa ser ídolo no Corinthians. Ele se forjou como ídolo. Como ele já era Corinthiano, sabia muito bem o que deveria fazer. A diferença do Neto para os outros ídolos talvez seja essa. Ele queria ser ídolo no Corinthians. Não era blasé. Não estava fazendo escada para a Europa. Não via o futebol com indiferença. Não se ressentia dos apuros de ser ídolo do Corinthians. Não tinha medo da torcida. 
O Neto jogou muito em 1990. Muito! O Neto está para o Corinthians em 1990, assim como o Maradona está para a Argentina em 1986. Não é exagero dizer que o Neto ganhou o campeonato para o Corinthians.
Quartas de final contra o Atlético Mineiro. Jogo no Pacaembu. Precisávamos ganhar. Começamos perdendo. O Corinthians mais uma vez perderia para qualquer time nacional e ficaria de fora da disputa pelo Brasileiro, que seria conquistado por qualquer outro protagonista acostumado com esse campeonato. Talvez, ainda não tivéssemos superado totalmente os 23 anos de fila.
Não acho que havia só zica. Tirando o time da Democracia que, de verdade, consolidou o Corinthians como um clube nacional, tínhamos realmente times inferiores aos demais esquadrões nacionais nas décadas anteriores. 
Durante o final da década de 80 se ouvia dos rivais no estádio:
“ERO ERO ERO, CABAÇO BRASILEIRO”.
Perdendo de 1x0 para o Atlético. Parecia que a sina iria se repetir. O Nelsinho iria tirar o Neto. Ele foi ao ataque para um último lance. Já pensou se ele tivesse saído antes? Neto foi para a área com a vontade dos deuses. Subiu de cabeça como nunca. Mandou pro fundo das redes. É gol! Vai Corinthians. Vamo que dá…
Neto faz um lançamento absurdo. Ele estava na linha direita bem no meio de campo. Lançou a bola para a ponta-esquerda. Incrível o lançamento. A bola caiu no pé do Paulo Sérgio. Bom jogador também. O Neto Atravessou o campo. Correu muito. Entrou na grande área. A bola cruzada veio para o Tupãzinho. Escapou. Não dominou. Sobrou inesperadamente para o Neto que fuzilou. Puta que pariu foi gol! Que gol! O Pacaembu veio abaixo. Gritos que saiam do fundo da alma. Gritos que brotavam direito do peito. Nem passavam pela garganta. Meu Deus, foi gol!
Contra o Bahia foi a mesma coisa. O Neto arrasou. Fez o gol de falta que nos colocou na final do Campeonato Brasileiro, revertendo a segunda vantagem, já que nos classificamos em oitavo, quase havíamos ficado de fora.
Já falei do gol do Wilson Mano, no primeiro dos jogos da decisão.
Na última final contra o São Paulo, que tinha um time tecnicamente melhor que o do Corinthians, repleto de jogadores que vieram a ficar posteriormente consagrados, a conquista já parecia mais materializada.
Eu tinha 14 anos. Só falava de Corinthians. Só pensava no Corinthians. Com 14 anos o menino não é mais criança. Também não é adulto. Naquela época, o moleque dessa idade não tinha porra nenhuma. Não tinha nem celular, nem computador pra criança. Nada. Era só o Corinthians dia e noite. Mais nada.
Assisti o jogo ao lado do meu pai. Neto tocou para o Fabinho. Ele foi costurando na entrada da área e soltou a bola para o Tupã. Ele enfiou a bola no meio das canetas do Ivã, um zagueiro muito grosso do nosso eterno freguês. Tupã generosamente devolve a bola para Fabinho. Ele chuta ao gol meio espremido. O Zetti defende. A bola sobra de novo para o Tupanzinho que de carrinho, se esticando todo, empurra a bola para dentro do gol. Que emoção. Saia muita água dos meus olhos. Olhei para o meu pai. Ele chorava e me dizia:
“Você tá pensando o que, filho? Pra mim também é a primeira vez que eu vejo o Corinthians Campeão Brasileiro”.
Eu choro agora de novo, só de lembrar. Vencemos! Era verdade. Não era sonho.
Foi tão importante aquele campeonato. Eu vibro como se fosse hoje. Volto aos catorze anos.
O Corinthians tem esse poder. De nos manter meninos. 
De fazer quem não tinha nem nascido, chorar “lembrando” daquele 16 de Dezembro de 1990 no Morumbi. Vinte e cinco anos atrás.
Mal sabia que essa data se tornaria mais sagrada ainda. Não podia imaginar naquela altura da minha vida que duas décadas depois eu estaria no Japão vendo o Corinthians ser Campeão do Mundo.
De certo, que os desafios de 2012 também estavam impostos em 1990. Talvez com maior grau de dificuldade.
Não existe nem existirá tarefa inalcançável para o Corinthians. 
Os desafios surgem e a gente supera.
Não existe nenhuma luta que a força do nosso povo unido não possa vencer.


segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Primavera Paulista



Que linda foi essa primavera.
Molecada. Continuem atentos. Há muitas outras conquistas ainda por vir.
Claro que já planejam tantos outros males.
Mas aproveitem para saborear o gosto dessa vitória. Um passo de cada vez. Assim se vai longe.
Hoje tem que ter festa em cada escola ocupada.
Desfrutem essa sensação maravilhosa.
Dêem-se ao luxo de todas as delicias da juventude. 
Pra esbanjar o privilégio de todas as imaturidades possíveis.
Estufem o peito e segurem esse ar cheio de pureza que ainda habita no coração de vocês.
Mantenham-se entorpecidos de esperança. Acreditem nas grandes causas. Contrariem todos os pessimistas e decepcionados.
Namorem bastante essa noite. Vivam todas as delicias da liberdade. Não permitam jugo nem sobre o destino, nem sobre o corpo de vocês.
Desafiem todos os senhores. Não existem senhores.
Ainda que amanhã seja diferente, aproveitem o hoje. O único tempo que de verdade existe.
É preciso desperdiçar todas as energias. Não guardem nada para o futuro. Não adianta.
Que vitória gostosa.
Que momento especial.
Confesso que sinto saudades.
Aproveitem tudo o que puderem.
Pois a luta continua.

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

A Lama do Neoliberalismo




A lama do neoliberalismo se desloca tranquilamente.
Engole as cidades, as casas das pessoas, toma as ruas, as praças, as igrejas.
A lama do capitalismo predatório destrói a natureza, polui os rios. Mata os peixes, destrói as vidas na Terra.
Ninguém sabe ao certo como surgiu esse barro todo. Ousam culpar a própria natureza. Colocam na conta de Deus.
O neoliberalismo conquista corações e mentes vendendo a ideia de que o Estado seria inimigo dos indivíduos. Repressor, autoritário, inibidor das livres iniciativas, ineficiente, fonte de todos os males.
Mas a lama que agora cruza o país, partindo das Minas Gerais, rumo ao Espírito Santo. Essa lama já tomou antes Brasília, foi gestada na Bovespa. Essa lama que dizem ser parte da natureza, é justamente a lama que corrompe o Estado. Interfere no processo decisório. Compra os partidos políticos. Financia as campanhas eleitorais. É dona dos meios de comunicação. Patrocina o telejornal. Faz você acreditar que o problema do Brasil "é porque os políticos são ladrões".
E a lama cresce. Ganha força. Cria corporações internacionais quase que indestrutíveis. Permeia todas as instituições. Entra nas universidades. No cérebro dos jovens arrivistas que não foram treinados para pensar e aceitam tudo de bom grado. O presidente da companhia que empurrou todo aquele barro na linda Mariana, recebe cartas e e-mails. Mas não são processos nem protestos. São currículos de quem sonha em fazer parte de tudo isso. De quem já tem a lama introjetada na cabeça, sedimentada depois de tantas palestras motivacionais e livros de autoajuda.
Os criacionistas dizem que o homem veio do barro. Pois então: "do barro ao barro". A lama teria surgido dum terremoto. Da natureza. Assim como a natureza haveria criado por ela mesma as metas inflacionárias, o ajuste fiscal, o superávit primário, o teto da dívida, entre outros elementos que estariam entre todas as outras coisas criadas por Deus, sobre as quais os homens não possuiriam menor jugo.
A lama das privatizações também chegou em Cubatão. A cidade está desesperada. Resumindo a história: Privatizaram a Cosipa (Companhia Siderúrgica Paulista), já que a empresa nas mãos do Estado seria "ineficiente e daria prejuízo". Privatizaram no mesmo período a Usiminas.
A iniciativa privada que provocaria concorrência, melhoraria o desempenho e aumentaria a arrecadação do Estado tem um jeito particular de resolver as coisas. A Usiminas comprou a Cosipa. Concentrou o mercado. Agora, resolveu "melhorar seu desempenho financeiro". Aproveitou o argumento da crise e centralizou sua produção. Anunciou que irá desativar a produção de aço em Cubatão. Centenas de famílias desempregadas. O município irá falir. A estimativa é que Cubatão perca 100 milhões de reais em arrecadação de impostos todos os anos. Fora as perdas indiretas na economia local.
As empresas estatais não serviam apenas para dar lucro (que davam) no balancete. Elas geravam divisas para o Brasil. Estavam alinhadas com nossa estratégia de desenvolvimento. Foram subtraídas em tenebrosas transações. Do dia para a noite.
Com a privatização, o Estado poderia investir mais em educação. As estatais foram derretidas e em São Paulo, terra da Cosipa, centenas de escolas estão sendo fechadas e os alunos "concentrados" em salas de aula cada vez mais apertadas para melhorar a logística e caber nas planilhas financeiras dos nossos gestores neoliberais.
O Rio Doce que dava nome à Vale se converte em um rio de lama. Vendo agora, não parece por acaso que a Vale privatizada tenha tirado o Rio Doce de sua marca. Talvez tenha sido um prenúncio de tudo que estaria por vir.
O neoliberalismo obriga ao homem um esforço "re-civilizatório". Estamos permanentemente inadequados no mundo, tentando aprender a nos comportar, nos vestir e a nos adaptar aos novos parâmetros do mundo corporativo e do mercado financeiro.
Talvez até, esperam que sejamos gratos à lama que empesteia o Brasil. Que agradeçamos de joelhos, dizendo "Deus lhe pague".
Olhem bem para essa lama. Ela é a cara do neoliberalismo. Por trás dos cabelos bem penteados, dos perfumes importados, do discurso corporativo, da "responsabilidade social", da "sustentabilidade ambiental". Dos slides em data show. Do discurso atraente. Dos ternos bem cortados. Da fala dinâmica de quem carregaria o Brasil nas costas.
Por trás de tudo isso está essa lama nojenta.

terça-feira, 27 de outubro de 2015

O "PROSELITISMO MARXISTA" dos Bolsonaretes.



A palavra da vez é PROSELITISMO.
Um Bolsonaro fala. Outros tantos começam a papagaiar.
Mas com tanto PROSELITISMO que nos cerca, engraçado perceber que os Bolsonaretes só conseguem utilizar esse substantivo em referência aos que eles supõem serem “marxistas”.
"Proselitismo Marxista". Seria o esforço dos marxistas em "catequizar" o próximo em torno de suas ideias.
A cultura escravocrata está tão encrostada na vida mental de alguns brasileiros que qualquer ameaça de justiça e igualde; qualquer iniciativa que contrarie a velha "ordem das coisas", passa a ser considerado "marxismo".
Lembra muito a Idade Média, quando as mulheres que desagradavam a "ordem das coisas" eram acusadas de bruxaria.
Por falar nas mulheres. A tal redação do ENEM sobre o feminismo. Nada mais necessário do que provocar um futuro universitário a refletir sobre as questões de gênero. Mas foi o suficiente para irritar quem não consegue pensar qualquer noção de igualdade, em nenhuma circunstância. O feminismo discute igualdade de gênero? Ops, igualdade? isso é marxismo.
O velho Marx não teve tempo para falar sobre diversidade sexual. Nem sei se era a pegada dele. Mas, posto que é outra noção ligada à ideia de igualdade. Igualdade? ops... é marxismo.
Distribuição de renda. Condição necessária para o desenvolvimento do capitalismo. Mas, por essas bandas, distribuir renda passa a ser coisa de marxista.
PROSELITISMO. Seria essa a tentativa oculta dos professores do ENEM.
Qual estudante universitário precisa refletir sobre as relações econômicas, políticas e sociais? Qual universitário precisaria superar o obscurantismo religioso para avançar rumo ao saber científico? imaginem só. Para os bolsonaretes: nenhum!
Ora, poucas coisas notabilizam tanto o neoliberalismo como o PROSELITISMO.
Assistir a um telejornal hoje em dia, é muito semelhante a acompanhar o discurso daqueles caras que sobem num caixote na Praça da Sé, gritando desesperadamente para que todos acreditem que "o fim está próximo".
Não existe mais nem aquele verniz mentiroso de outros tempos da “imparcialidade”
O esforço agora é puramente adventista.
Ali sim, trata-se de um proselitismo burro e estúpido que não contempla sequer a possibilidade de que existe um "outro lado". Não há dialética.
As pessoas recebem diariamente uma dose de merda no cérebro, para que sequer desconfiem da existência do contraditório.
E o marketing? Ele cria necessidades. Faz com que o indivíduo seja absolutamente dependente de uma marca, um produto ou até mesmo de uma ideia. É uma espécie de esforço “re-civilizatório” do sistema.
As universidades! Pois bem, aquelas que se assumem como as "escolas ideais" para o tal "mercado de trabalho". Preparam o indivíduo para viver na MATRIX. O sujeito sai "chipado" da sala de aula. Repete duas dúzias de "verdades" por minuto, acreditando em cada baboseira, mais do que qualquer outro servo faria na Idade Média.
Desculpem a sinceridade. Mas em matéria de PROSELITISMO essa direita liberal é muito mais competente.
Os políticos e os governos de esquerda, ao longo da história, até que "flexibilizaram" bastante o seu discurso. Abriram mão, até muito mais do que deveriam.
Já os "liberais", não sedem sequer um milímetro. São catequizados. Fundamentalistas!
Quem vê o tal "PROSELITISMO marxista" em tudo, deveria fazer uma espécie de auto-análise. Olhar bem para dentro de si. Perceber o prejuízo da perda da capacidade crítica. Em resumo, perceber como está ficando burro. Muito burro, cara....

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

A Importância da Democracia Corinthiana





A Democracia Corinthiana foi a aventura histórica mais fantástica de todos os tempos. Uma experiência incrível que possibilitou ao torcedor comum compreender, a partir do interesse pelo futebol e sua paixão avassaladora pelo Corinthians, o valor deste sonho louco chamado liberdade. Que perder sendo livre é muito mais valioso do que uma vitória mentirosa baseada na servidão. Ganhar ou perder, mas sempre com Democracia!

O Corinthians é uma janela encantada por onde milhões de brasileiros entendem a vida. Aqui se vivenciam experiências definitivas como o desejo de vencer, a estratégia, a superação, a garra, a derrota, a injustiça, o ganhar e perder coletivo, a importância da organização, o poder das massas, a fantástica possibilidade que o Corinthians nos dá de, ao mesmo tempo, sermos o fragmento de um todo e também de nos tornarmos agentes protagonistas das transformações históricas.

Depois de um grande jogo, nada mais é como outrora. A roda da história não para de girar. Na sociedade acontece exatamente o mesmo. Da mesma forma que jogamos o jogo junto com o Corinthians e temos a certeza que influenciamos diretamente no resultado da partida, somos agentes decisivos para superar os mais terríveis adversários e fazer do mundo um lugar mais justo, humano, livre, em que todos os irmãos, maloqueiros e sofredores, possam ter a chance de vencer, educando seus filhos e construindo um país que possa um dia significar para o mundo o que o Corinthians significa para o futebol, ou seja, não apenas uma potência conquistadora, mas um elemento que permite elevar a experiência humana a valorizar a diversidade, a solidariedade, a plena satisfação que só pode ser alcançada com a felicidade compartilhada e a certeza de que mesmo sendo diferentes, certamente somos mais fortes unidos e em harmonia.

Os mais jovens talvez não saibam o que era o Corinthians antes da “Democracia”. Esse Corinthians vencedor que conhecemos hoje, bi-campeão do mundo, certamente foi em grande parte forjado no período da Democracia Corinthiana.

A “Democracia” ensinou ao Corinthians um novo jeito de jogar. Organizou e disciplinou nossos impulsos e a nossa euforia. É preciso que se diga, a “Democracia” ensinou também ao torcedor um outro jeito de torcer. A sermos cirúrgicos, pacientes, decisivos. A entendermos também um pouco mais de estratégia.

Quando se tenta reduzir a importância da “Democracia Corinthiana”, que vai muito além de um modelo institucional de “auto-gestão”, algo que por si só já provoca arrepios nas mentes conservadoras, certamente se revela a incompreensão, o alcance, a força e até o temor dessas duas palavras:

Democracia e Corinthians!

Nas nossas vilas e favelas. No lado B desta São Paulo tão “da hora” e tão injusta, certamente não poderá haver Democracia sem o Corinthians para conferir às liberdades um valor afetivo e pedagógico para a vida da gente.

Da mesma forma não podemos mais pensar um Corinthians Grande sem este importantíssimo e necessário valor chamado Democracia!

Corinthians e Democracia. Juntas, essas duas palavras se completam. Oferecem um sentido mágico uma à outra. Conferem uma incrível força capaz de mover o planeta!

Mas e os desafios de hoje? Será que a Democracia Corinthiana deve ser apenas uma experiência histórica do passado?

É evidente que não. A democracia continua sendo frágil, muitas vezes distante da vida das pessoas mais pobres, permanece em perigo e sobre ataque.

Nos dias atuais, não são somente as ditaduras e a violência de Estado que ameaçam a liberdade. Os desafios são diversos e os inimigos difusos. É muito mais difícil perceber quem é efetivamente o adversário a ser batido.

O Corinthians se insere na globalização forte, ameaçador e é bem verdade, sem muita certeza de todos os caminhos que deve percorrer. Da mesma forma que se intrometeu nesse esporte da oligarquia em seus primeiros anos. Tentando se estabelecer e triunfar, sem abrir mão de sua identidade.

Neste momento estou estudando as primeiras atas e estatutos do Sport Club Corinthians Paulista. O período é de 1913 a 1915. Estes documentos foram um presente do historiador Plínio Labriola Negreiros. Tais cópias foram conseguidas por ele em sua pesquisa de mestrado, ainda no início dos anos 90.

Lá, fica evidente desde o nosso surgimento, a preocupação com os instrumentos democráticos.

O direito a voz e voto já era garantido para todos os associados. O capitão do time era eleito pelos próprios jogadores. Capitão esse que, por sua vez, após eleito por maioria, passava a fazer parte da diretoria, participando das principais decisões do nosso clube. Praticas estas que sequer eram consideradas como possibilidades na sociedade daquele tempo.

A democracia está no nosso DNA! O Corinthians Grande só existe porque a Democracia foi uma condição necessária para que este clube, fundado por operários, se tornasse o Time do Povo, um clube das massas, que pudesse inclusive ser plural e abrigar os pensamentos divergentes, para acolher também as multidões que desconhecem o caráter transformador deste grande movimento chamado Sport Clube Corinthians Paulista.

Esse é o Corinthians, com contradições e diferenças que também fazem parte de sua natureza. Onde conservadores e progressistas estabelecem conflitos que muitas vezes estão também dentro da gente. Assim acontece com cada um de nós. Muitas vezes com dúvidas entre a precaução e a ousadia. Entre a transformação e a estagnação.



Importante saber que a liberdade é condição necessária para nossa existência. E que cada torcedor pode levar dentro de si esta conquista. Este sonho lindo e louco chamado Democracia Corinthiana!

domingo, 11 de outubro de 2015

Domingo sem o Corinthians


Domingo sem o Corinthians é um vazio sem fim.
Uma semana. Dez dias. É para morrer de saudade.
É você ter tempo para fazer um monte de coisas que nunca consegue. Mas de nada vale esse tempo livre.
De nada presta esse ócio improdutivo, inútil e desmotivado.
Melhor mesmo é almoçar correndo, dar um beijo displicente na mãe, no pai, em quem se ama e sair correndo para o estádio.
Gostoso é abrir o jornal de domingo, pulando os cadernos cheios de futilidades, com notícias sobre a política, o dólar que sobe, o mundo e as guerras, a água em Marte, a dica de shows, musicais, coisas chatas, o que dá ou não dá colesterol. Superar todas essas informações menores e avançar até os esportes, para ver as notícias do Timão. Notícias repetidas, que no fundo já estávamos inteirados, mas mesmo assim dá um gosto danado de ler outra vez.
Melhor almoço do mundo é aquele macarrão com frango que a gente come no sofá da sala de olho na televisão, esperando o jogo começar.
Domingo sem o Corinthians, é ter o dia todo para cuidar da própria qualidade de vida.
Mas que papo estranho é esse? Melhor mesmo é quase morrer de infarte! Passar mal com nosso coração corinthiano saindo pela boca.
Ver a seleção jogar, ao invés do Corinthians, é como aquela cagada que todo mundo fez uma vez na vida. Sair com uma pessoa que não vale à pena, pra logo perceber que a gente queria mesmo estar ali, vivendo o que a gente sempre gostou de viver, com o amor da nossa vida. É perceber como é boa essa rotina, nem que seja com pão murcho e café com leite. Que não há glamour que substitua a deliciosa simplicidade cotidiana. Que o Corinthians sim é um amor que nos merece. Estar com o Corinthians é estar com a pessoa certa, não importa onde. É reconhecer o hálito um do outro. É viver tranquilo, sem precisar fazer pose ou escolher as frases certas, no maior estilo Vai Corinthians.
O Corinthians é nossa alma gêmea.
Não sobraria muito da nossa vida sem o Corinthians.

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

FESPSP promove simpósio para discutir crise da esquerda



Série de debates com especialistas acontece entre 13 e 22 de outubro na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo


A FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo) apresenta em outubro o simpósio “A CRISE DA ESQUERDA – Quais caminhos levaram a esquerda brasileira para a crise atual e perspectivas para o futuro”. Um curso de extensão com lideranças políticas que  acontecerá entre 13 e 22 de outubro. As inscrições abertas através do site www.fespsp.org.br/extensao, com vagas limitadas.
O objetivo deste curso de extensão é debater, sob diferentes perspectivas, a trajetória da esquerda no Brasil, sua ascensão ao poder por meio do Partido dos Trabalhadores em 2002 e como a ideologia se tornou alvo de críticas e protestos nos últimos anos.  Além disso, visa também traçar um horizonte e perspectivas para o futuro do cenário político brasileiro.
Para apresentar o assunto a FESPSP convidou cinco lideranças políticas. No dia 13 de outubro quem inaugura o simpósio é o ex-Governador do Rio Grande do Sul e ex-Ministro da Educação, Relações Institucionais e Justiça, Tarso Genro. O segundo debate acontece no dia seguinte com Sérgio Fausto, Diretor Executivo do Instituto FHC. O terceiro encontro acontece no dia 15 de outubro e o convidado é o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL). Na sequência, no dia 21, a candidata à presidência da República em 2014, Marina Silva, é quem ministra palestra na FESPSP. Fechando o simpósio, o coordenador do MTST, Guilherme Boulos, fala com os presentes no dia 22 de outubro.
Com carga horária total de 15 horas, o simpósio tem vagas limitadas. O investimento na inscrição é de R$ 500,00, com opções de pagamento à vista no boleto ou cartão de débito, ou em até 3x de R$ 166,66 no cartão de crédito. Alunos FESPSP possuem 40% de desconto; ex-alunos e instituições conveniadas 15%. A lista de convênios pode ser encontrada no site da FESPSP.

SERVIÇO
Simpósio: A CRISE DA ESQUERDA – Quais caminhos levaram a esquerda brasileira para a crise atual e perspectivas para o futuro
Data: De 13 até 22 de outubro de 2015
Horário: 19h às 22h
Inscrições: R$ 500,00 – www.fespsp.org.br/extensao
Local: Auditório da FESPSP – Rua General Jardim, 522, Vila Buarque – São Paulo
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segunda-feira, 5 de outubro de 2015

"Viva o Câncer!". Os odiadores de ontem. Os odiadores de hoje.



Eva Perón vivia seus últimos dias de vida. Tinha apenas trinta e três anos de idade. Sofria pela metástase de um câncer que surgira em seu útero.
O drama de Evita tocava milhões de argentinos e argentinas que faziam vigília por sua recuperação.
Mas não todos tinham compaixão por sua doença. A admiração por Eva, que se convertia em uma espécie de ideologia política própria, sem nenhuma estruturação litúrgica, porém decididamente muito ligada à identidade de classe possível na Argentina dos anos 50, era considerada pelas elites como coisa menor. Dizia-se (e se diz ainda), que era algo como “coisa de empregada doméstica”.
Nem a dor, nem a morte que se avizinhava. Nenhum drama inibiu quem colocava o ódio político e o ressentimento social acima de todas as coisas.
“Viva o Câncer!”. Esta foi a frase que apareceu escrita no muro de sua residência, pouco antes de sua morte.
Havia muita gente regozijando por seu padecimento. Festejando sua morte.
Não era pra menos. Pra quem levava a noção de hierarquia social como algo naturalizado e parte integrante de si mesmo, a figura de Evita era absolutamente insuportável.
Eva nascera fruto de uma relação extraconjugal de seus pais. Nunca foi totalmente reconhecida. No velório de seu pai, havia sido impedida de prestar seu último adeus. Quando se mudou para Buenos Aires, Evita passou a ser uma atriz de rádio. As radionovelas explodiam no país inteiro. O rádio passava a ser o principal veículo para integração do país e também para a comunicação com as massas de trabalhadores.
O rádio era solene. Não era minimalista como nos nossos dias. Era um aparelho grande a ser colocado no meio da sala. As famílias se reuniam em volta dele. Perón, como nenhum político de seu tempo soube tirar proveito desta nova ferramenta de comunicação. Da mesma forma, como ninguém até então, soube enxergar o trabalhador operário como um ator político relevante a ser mobilizado para a construção do trabalhismo na Argentina. Em bairros e cidades mais afastadas, o rádio era pendurado nos postes para que os mais pobres também pudessem ouví-lo.
Eva Duarte, como qualquer atriz de rádio ou de teatro não ocupava um lugar social muito distante das prostitutas.
Iniciou uma relação amorosa com Perón. Um homem mais velho e poderoso. Por virtude e por fortuna, Perón se converteu em presidente da Argentina, chegando ao poder nos braços do povo. “Cabecitas Negras” eram chamados seus eleitores. Viviam nos subúrbios de Buenos Aires, mas sequer podiam frequentar os luxuosos espaços da região central. Muitos passaram a conhecer o centro nas manifestações políticas do peronismo. Era um escândalo. A massa de descamisados e de pés descalços. Nadavam nos chafarizes, tomavam mate nas praças antes exclusivas dos grandes cavalheiros.
Evita, agora primeira-dama, passou a frequentar os salões da oligarquia argentina. Jamais foi aceita. Os interesses sazonais das elites econômica e política, obrigava os grandes negociantes a aturarem aquela “bastarda”.
Não eram raras as vezes em que, após a chegada de Evita, as damas da sociedade se retiravam de recintos como o famoso Teatro Colón. Chefes religiosos se recusavam a reconhecer sob a ótica da Santa Igreja a união de Juan Domingo e Eva.
O poder modifica a todos. É uma experiência definitiva. Alguns se afogam em meio a vaidades tolas. Sentem-se entorpecidos pelo luxo e pela adulação de gente falsa e mentirosa. Não são poucos aqueles que esquecem suas raízes. Que mudam de classe. O mundo está repleto de gente que com o poder perde a capacidade de olhar para si e próprio e também condição de enxergar o mundo a sua volta. Concentram-se apenas em pertencer e conservar o status adquirido.
Mas Evita não foi assim! Eva tinha uma personalidade controversa, mas soube como poucos na história fazer o bem. Falava como uma mulher do povo. Cometia erros gramaticais que eram jocosamente ridicularizados por alguns. Enfrentava a oligarquia. Fez o que pode para ajudar os necessitados. Recebia a todos em seu gabinete. Dava desde presentes de natal até máquina de costura, brinquedos, tratamento dentário e hospitalar. Fazia o que era possível. Não era uma primeira-dama tradicional. Mesmo com a saúde muito frágil, na frente de todos seus assessores perplexos beijava os leprosos e outros doentes na boca.
Alguns podem considerar isso como caridade barata. Coisa de político. Mas numa sociedade tão marcada pelo pensamento elitista, os gestos de Evita adquiriam um significado gigantesco.
Os órfãos, até aquele momento, eram obrigados a circular com um pijama escrito “Criança Órfã”. Evita acabou com aquilo. Acolhia as crianças órfãs em novas escolas de tempo integral que lembravam um parque de diversões temático. Defendia seu povo. Beijava homens e mulheres pela rua. Assim era Evita.
Morreu muito jovem. Não era uma marxista nem dispunha de conhecimento teórico organizado sobre qualquer ideologia política. Era peronista, como gostava de dizer. “Uma ponte entre o povo e Perón” Quem assim quisesse poderia “atravessá-la”, falou certa vez. De fato, Evita era o braço de Perón com a sociedade civil. Não por acaso, depois de seu desaparecimento, o peronismo perdeu muito de sua face mais humana. Perón nunca mais foi o mesmo líder.
Evita era a puta. A bastarda. A ralé. Era odiada no “high society”. Sim, havia gente comemorando o seu câncer. Sua presença ofendia. Sua existência era insuportável. Os pobres nunca mais foram os mesmos depois de Evita. Isso era desastroso para alguns.
Eva Perón nunca foi uma política de esquerda, porém seu surgimento já foi suficientemente ameaçador. Como tantas outras figuras da história, sua coragem revelava a covardia dos outros. Seu inconformismo denunciava a complacência geral diante das injustiças.
Cada um cumpre seu papel na história. Evita tem para sempre seu lugar. Os disseminadores de ódio não podem chegar a lugar nenhum. Não há espaço de glória para quem vive propagando o ressentimento e a mesquinharia.
Os odiadores talvez apareçam em figuras inanimadas atacando pedra na cruz, colocando fogo nas “bruxas” em fogueiras “santas”, comemorando o enforcamento de condenados, se explodindo em ataques suicidas, participando de linchamentos, apedrejando as mulheres “infiéis”, comemorando o holocausto. Os odiadores nada mais serão do que desenhos feios que contam os desastres mais violentos da história da humanidade.
Para nossa felicidade, há também aqueles que preferem amar. Que o Brasil encontre seu caminho de paz entre tantos odiadores que invadem velórios, atacam bombas, invadem sites, ameaçam de morte nos fóruns de internet, rompem amizades de anos por divergência política, rejeitam as diferenças.

Deus nos livre da violência, da intolerância, da intransigência e da histeria coletiva que só pode terminar em coisa ruim. Deus nos livre daqueles que são muito corajosos e decididos para julgar os outros, mas que se a gente olhar bem de perto, não valem sequer o pão que eles comem.  

terça-feira, 29 de setembro de 2015

Enquanto isso, Longe de Marte...




Enquanto isso, longe de Marte...

Vasculha-se cada cantinho de Marte. Comemora-se o grande feito de se encontrar vestígios de água no Planeta Vermelho. Festeja-se essa grande conquista da humanidade. Enquanto isso, milhões de homens, mulheres e crianças padecem sem acesso à água potável neste planeta tão injusto.

Viaja-se com uma sonda (logo mais com um foguete). Duzentos e vinte cinco milhões de quilômetros, sem que seja necessário parar para abastecer num posto de gasolina interestelar. Enquanto isso, a Terra ferve e seca nos quatro cantos, por conta do aquecimento global. Tecnologias de geração de energia renovável são boicotadas ao sabor dos interesses das grandes companhias que vivem da desgraça do planeta. Das guerras por petróleo.

Bilhões de dólares são empregados para enviar um robô até Marte. Enquanto isso, diz-se que preservar a natureza e a sua relação com a vida humana é economicamente inviável.

Espera-se que estejamos todos felizes com a descoberta de água em Marte. Enquanto isso, permanecemos estagnados num modelo econômico que condena os homens a estarem em permanente conflito com a natureza. É como se a humanidade fosse estranha ao meio-ambiente. Homens e mulheres são considerados igualmente culpados pela degradação da Terra, como se possível fosse preservar o planeta sem transformar as relações econômicas, políticas, sociais de consumo, acesso à terra, moradia e saúde. Como se fôssemos todos igualmente responsáveis pela construção desta sociedade que valoriza excessivamente o lucro, o prestígio, o poder e o dinheiro a todo custo. Como se uma família vivesse na encosta de um morro, numa área de manancial, nas matas ciliares, na beira dos córregos sem acesso ao saneamento básico e à coleta de lixo, simplesmente por “estilo de vida”.

Descobriram água em Marte. Um passo gigantesco para comprovar que existem outras formas de vida, longe da Terra. Seria fantástico conhecer habitantes dos outros planetas, não é mesmo? Enquanto isso, a vida humana na terra é cada vez mais desprezível. Alguns seres humanos são tratados como um mero inconveniente. Com exceção de alguns bolsões de riqueza, a vida de homens e mulheres se mostra a cada dia mais descartável e irrelevante nas periferias do mundo.

Esperamos ansiosamente conhecer novas formas de vida, mas desprezamos as que já conhecemos. Refugiados de guerras santas, políticas, civis, por petróleo, ou apenas para fomentar o mercado de armas, lutam para existir em algum canto do planeta. As populações desempregadas, perdendo direitos sociais e garantias trabalhistas não culpam os sistemas políticos e econômicos. Ao contrário, nos culpamos uns aos outros. Os trabalhadores do mundo perderam seus instrumentos de solidariedade. Perderam a capacidade de se enxergarem como trabalhadores. Vivem num limbo individualista. Um abismo de alienação. A ninguém parece ser conveniente ter um refugiado de guerra por perto. No entanto, somos todos refugiados. E não fugimos para Marte. Estamos aqui, com nossos antepassados mais próximos que em algum momento fugiram da violência, da miséria, das guerras ou das secas. Este é o mundo dos refugiados e dos retirantes, só que alguns se estabeleceram primeiro.

Gastamos bilhões para descobrir se existem bactérias, vírus ou fungos em Marte. O conhecimento científico é realmente fantástico! Não há como negar. Mas enquanto isso, muitas formas de vida desaparecem ou estão ameaçadas de sumir da face da terra. Animais lindos e fantásticos. Plantas, árvores, raízes e ervas compõem a nossa biodiversidade apenas para que um dia sejam patenteadas em novos medicamentos que renderão fortunas para quem explora o medo da vida e o medo da morte.


A viagem mais fantástica de todas ainda está por ser realizada. Uma expedição heroica aos castelos e fortalezas que devem ser derrubados. Haveremos de desbravar a nossa própria natureza. A evolução mais incrível e esperada por todos, não será tecnológica. A grande e necessária evolução será nas relações humanas. Não importa se conquistaremos Marte. Conquistaremos a Terra e a grande civilização a ser constituída será a nossa com uma existência mais justa, livre, generosa, igual e solidária. Que este seja o planeta da humanidade! E que não precisemos mais sentir vergonha de Ser Humano.

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

A Tarefa do Agitador



A tarefa do agitador não é abrir o coração e escrever depoimentos pessoais.
Do agitador, não se espera a coerência a todo custo. Ele não fala somente aquilo que é mais fácil de dizer.
O agitador não teme o exagero.
Quase nunca vai com a maioria. Escreve em primeira pessoa falando dos outros e acaba escrevendo em terceira pessoa pra falar de si mesmo.
Ele abre mão de certos pudores. Não é obcecado por sua auto-imagem.
Um grande agitador não se esconde atrás de opniões óbvias. Não se preocupa em vender uma imagem de rapaz equilibrado, exageradamente entorpecido pelo bom-senso.
O agitador não escolhe as palavras indecifráveis. Não utiliza subterfúgios ou sofismas. Despreza o relativismo viciado sobre aquilo que é socialmente irrelevante. Não ostenta um linguajar acadêmico como ornamento de distinção. Não é vaidoso. Não paga de intelectual.
O agitador não cuida de suas frases como um confeiteiro ou um estilista. Porém, nem por isso o agitador é menos delicado ao escrever. O verdadeiro agitador lapida suas ideias. Vai cuidadosamente tirando tudo aquilo que é desnecessário, até que reste apenas o que é compreensível.
A obra do agitador, para os desatentos, é supostamente rudimentar. No entanto ela é uma escultura. Aquilo que outrora foi uma pedra deformada, ganha então a capacidade de ser entendida. O agitador enxergou uma linda estátua onde a maioria de pessoas podia ver apenas uma rocha.
O agitador não quer falar apenas nos pequenos salões. Não se contenta com o "petit comité". Com o "crème de la crème". O agitador se recusa a falar somente com quem concorda com seu ponto de vista. O agitador frequenta a academia dos notáveis somente quando deseja pixar um muro. Nem que seja a porta interna do banheiro. Pra fazer desenhos obscenos, uma poesia pornográfica ou gritar um palavrão bem no meio do pátio.
O agitador ambiciona falar com as massas. Deseja se comunicar, intervir. O agitador vai ao samba, ao forró, ao pagode. O agitador discute futebol. Conversa com o porteiro do prédio. É amigo do rapaz que prepara o seu pão na chapa. O agitador ouve as pessoas. Não espera apenas explicar o mundo para os outros, mas também vê-lo explicado. O agitador se interessa por seu povo. Aprende com ele. O agitador toma uma cachaça no balcão, sabe qual é o assunto do momento. O agitador tem moral na quebrada.
O agitador não caga regra pra ninguém. Entende o processo histórico e as variáveis sociológicas de maneira quase que intuitiva. Entende o limite de cada um e percebe que este limite está conectado com cada momento. O agitador não impõe a sua agenda. Ele chega no sapatinho. Dá o seu recado da maneira que venha a fazer sentido para as pessoas. Constrói um caminho para que os outros entendam sua linha de pensamento, não constrói uma auto-estrada ideológica à revelia, desmatando todos os pensamentos contrários.
O agitador não faz tudo o que quer. Não fala aquilo que lhe dá na telha. O verdadeiro agitador não é inconsequente. O agitador não é rígido. O bom agitador deve ser flexível e, como um bom marinheiro, saber navegar sem brigar com as ondas do mar.
O agitador virtuoso quase nunca se dá ao luxo da utopia. Ele tem objetivos. Sabe dar um passo de cada vez. Sabe esquivar ou andar para trás quando necessário. Depois, pode dar dez passos à frente. O agitador tem noções de processo. Transita dentro do possível. Sabe colecionar uma vitória de cada vez.
Um bom agitador nunca fala nada por acaso. Não desabafa. O agitador atormenta. É inquieto. Assume o custo de parecer o grande cafajeste, quando isso for preciso.
Mas o bom agitador sabe também ser muito doce. Sabe tocar, seduzir, agradar.
O agitador sabe fazer pensar. Provoca reflexão, cria dúvidas. Ele deixa sempre a pulga atrás de muitas orelhas.
Um agitador jamais conseguirá ser diferente. Só quando deixar seu corpo físico. Mesmo assim, talvez provoque furdunço em outras galáxias por aí...
Acontece que o agitador faz tudo o que faz porque ele, insistentemente e teimosamente, acredita num futuro melhor.
No fundo, o agitador não passa de um romântico.

segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Um dia depois do golpe



Um dia depois do golpe, surgirão os pedidos infames para que o Brasil esteja unido neste "novo momento de sua história". Do mesmo modo que o Golpe de 64 foi também chamado de "Revolução", haverá aqueles que exaltarão a cruzada do povo brasileiro pela "ética", "valores da família" e grande mobilização "contra" a corrupção.

Um dia depois do golpe, os telejornais estarão mais amenos. Mensagens de otimismo serão lançadas ao longo das programações de tevê. A expressão do âncora do jornal da noite, que hoje é de quem anuncia um futuro de desgraça, se converterá com sorrisos mais descontraídos, um noticiário mais leve, com um acréscimo de otimismo para com nosso futuro.

Um dia depois do golpe, alguns presos não serão mais úteis. Muitos pedirão cautela nas investigações para que não sejam cometidas injustiças.

Um dia depois do golpe não seremos mais tão "intolerantes com a corrupção". Tudo volta ao normal. Os verdadeiros inimigos já não estarão por perto. Quem sempre roubou pode seguir roubando, desde que não seja subvertida a pirâmide social. Quem está em cima pode tudo, quem está embaixo continue onde está.

Um dia depois do golpe, as manifestações de rua não serão mais consideradas o "espetáculo da democracia". Não haverá cobertura em tempo real, convocação durante a programação diária, os horários dos jogos de futebol não serão alterados, a Avenida Paulista voltará a ser considerada um "corredor de hospitais" impossível de ser ocupada. Uma passeata com cem mil pessoas receberá um pequeno flash no Jornal Nacional.

Um dia depois do golpe, aqueles que saírem às ruas serão chamados de revanchistas. Haverá um clamor pela pacificação do Brasil. 

No minuto seguinte ao golpe, as polícias ganharão força. Mais força. Mais poder. A polícia não mais visitará os protestos para tirar uma self. A porrada vai rolar. O coro vai comer.

Um dia depois do golpe, toda a quebra de direitos adquiridos, programas sociais, juros altos ou qualquer outro pacote de maldades serão colocados na conta do PT. 

Um dia depois do golpe, a esquerda se reunirá para fazer um diagnóstico de seus principais erros. Quem estava no frescor do ar condicionado, sem nunca mais ter colocado o pé na rua, dirá que não tem nada com isso. Todos perguntarão perplexos como mais de uma década de governo popular possa ter resultado numa despolitização geral da classe trabalhadora. Outros se perguntarão o por quê de a esquerda ter se eximido de estabelecer discussões e disputar espaço em setores da classe média. Outros contarão por décadas a história do erro político de ganhar a eleição com a força do povo, depois da direita usar as armas mais sujas, e no dia seguinte, usar a agenda econômica do candidato derrotado. 

Um dia depois do golpe se perceberá que a direita não terá os mesmos pudores. Não haverá tanta preocupação com esse verniz de republicanismo. As "alianças" que alguns acreditavam ter com as elites se revelarão funcionais e risíveis. Quem antes acreditava na adulação falsa e mentirosa, despertará já sem nenhum poder. Os puxa-sacos desaparecerão, ficará apenas a ameaça de apodrecer na cadeia.

Um dia depois do golpe a agenda prioritária será botar fim à carreira política do Lula. Não tenham dúvida, ninguém correrá o risco de enfrentar o presidente do povo nas urnas. A direita não será tão condescendente com seus inimigos como o PT foi. Eles sim saberão defender seus interesses.

Um dia depois do golpe, o Presidente dos Estados Unidos dirá que o Brasil é soberano para decidir seu próprio destino e convidará para que em breve o novo presidente seja recebido num café da manhã na Casa Branca.

Cinquenta anos depois do golpe, as televisões e jornais apresentarão novamente seus editoriais envergonhados com o papel que exerceram para interditar o país e facilitar essa operação política. Documentos, outrora confidenciais, revelarão as "intervenções diplomáticas" em algumas das principais instituições brasileiras, que contou com aliados e "facilitadores" muito famosos na época.

Não sei se vai ou se não vai ter golpe. Mas que a internet sirva pelo menos para registrar a posição de cada um diante deste processo em curso. Com todas as minhas ressalvas e críticas à condução deste governo, ainda que na minha insignificância, digo com todas as letras: É GOLPE SIM!

sexta-feira, 11 de setembro de 2015



O “rebaixamento da nota” do Brasil por uma dessas agências de classificação, dá mostras claras da absoluta falência e ineficiência do remédio neoliberal como solução para a economia dos Estados, e no caso específico do Brasil, os erros da política econômica do segundo governo Dilma.

Mas antes de falar do caso brasileiro, vamos refletir sobre o que significa a negativação de um Estado, por parte de um escritório nova-iorquino.

O furor causado no governo e em determinados setores da sociedade, a partir do “rebaixamento da nota”, revela nitidamente um dos porquês da crise econômica, social e política mundo afora.

Os Estados estão de joelhos. Conjuntamente, está também subjugada a própria perspectiva histórica dos homens, incluindo o pensamento crítico, os direitos humanos, as experiências coletivas, a capacidade de reflexão e questionamento.

Estas empresas chamadas “agências de classificação”, mostram-se muito agressivas e cheias de si ao colocar a faca na garganta dos Estados. Porém, são incapazes de prever ou evitar o calote dos grandes conglomerados econômicos e a consequente socialização das perdas. Até porque essas agências pertencem e trabalham para os grandes especuladores das bolsas internacionais que vivem do “risco”. Estão permanentemente na roleta financeira, ao invés de produzir, gerando um “bem social” que pode se tornar coletivo, como a geração de empregos, riquezas, inovação, etc.

Os banqueiros e especuladores sequestraram os Estados. Sequestraram a política. Modelaram a economia mundial ao sabor de seus interesses mais imediatos, inibindo a capacidade empreendedora dos homens e produzindo uma espécie de “realidade paralela” que a humanidade aceita como única, inexorável, inquestionável e definitiva, sem refletir se “outro mundo é possível”. Estamos lutando uns contra os outros em benefício de um sistema sem cara e, por consequência, quase impossível de ser detectado como inimigo.

A política econômica do segundo Governo Dilma foi um equívoco. A começar por um grandioso erro político, desembocando numa imensa barrigada econômica.

O remédio neoliberal não funciona mais. Ao contrário, causa mais danos ao sistema imunológico das economias globais. Não seria diferente no Brasil. Vamos partir do princípio que a escolha seja de conviver nos limites possíveis do neoliberalismo globalizado. Pois então, nem para se manter nas condições da macroeconomia global esta receita velhaca funciona mais.

Vamos supor que nenhum “esforço fiscal” tivesse sido feito, ou seja, com corte de investimentos e gastos públicos, aumento de impostos, queda do financiamento, aumento de juros, quebra de garantias trabalhistas, etc; se nada disso fosse feito, ainda assim nossa economia estaria melhor. Na pior das hipóteses, estaríamos “despertando a mesma desconfiança” dos Mercados (com eme maiúsculo), porém sem tanta recessão, arrocho e ambiente político hostil. Dificilmente o dólar estaria um centavo maior sem o arrocho.

Até porque, o déficit fiscal não diminuiu, ao contrário, só aumentou por conta da queda de arrecadação, consequência da diminuição da atividade econômica. Mesmo a inflação, justificativa de todos os remédios amargos, continua alta, e pior, o aumento de preços acompanhado de desemprego e recessão econômica torna tudo muito mais insuportável para o trabalhador.

A verdade é que ninguém respeita quem se põe de joelhos, muito menos o Mercado.

Não adianta nada assumir apaixonadamente o receituário neoliberal. O Mercado não será mais ou menos “bonzinho” conosco por conta disso. Ao contrário, só quem acredita que o “remédio neoliberal” faz bem para os Estados são os estudantes “chipados” e os economistas “cabeça de planilha”. Os banqueiros e especuladores sabem muito bem que a receita que eles impõem, ao final, leva mesmo à desgraça. Portanto, melhor uma economia dinâmica que Eles critiquem do que a submissão e a apatia que Eles sabem serem sintomas de doença terminal.

Em nenhum lugar do mundo essa receita deu certo.

Muitos devem se lembrar do segundo mandato de FHC ou os últimos dias do governo Menem/ De la Rúa na Argentina. Ao cabo, o Mercado não tratou com consideração ou passou a acreditar mais nos dois governos por adotarem a cartilha do FMI com fervor.

Nenhuma submissão será premiada.

Ao ser ameaçado com o “rebaixamento de nota” dos Estados Unidos, o Presidente Obama fez questão de dizer em alto e bom som que ele era o Chefe de Estado e que as agências de classificação eram absolutamente irrelevantes.

A recuperação econômica dos Estados Unidos não compreende os principais parâmetros deste “ajuste fiscal”. Ainda que eles sejam a matriz do neoliberalismo e o mercado financeiro global seja uma das principais ferramentas de manutenção da hegemonia econômica estadunidense, o que se viu nos últimos anos foi uma série de incentivos à atividade econômica e recuperação do setor produtivo pós-crise, ainda que eles tenham a maior dívida externa do mundo e estejam à beira do chamado “abismo fiscal”.

É só olhar para a história do Brasil. Nossos melhores momentos foram aqueles em que estivemos “mais independentes” ou “menos subordinados”.

Não por acaso, estes momentos foram justamente aqueles em que sofremos maior pressão, ataque especulativo, ambiente político conturbado e imprensa incendiária.

Dilma errou na economia e errou na política. A coalizão progressista que tornou possível sua reeleição e sua base de apoio nas ruas foram postos a perder com a composição de seu ministério e a política econômica de seu segundo governo. Isso tem custado caro e deve custar mais caro ainda.

Tudo foi feito em nome da “governabilidade”, mas quem deveria ajudar a garantir a “maioria”, agora conspira na cara larga.

E a condução da política econômica que mobilizou tantos esforços e prometia ser o trunfo para dias melhores, agora é contaminada pelo ambiente político instável. Não adiantou nada.

As verdadeira aliança que deveria ter sido feita para garantir a governabilidade seria com o povo. Fazendo política! Disputando e ganhando espaço! Travando os grandes debates! Enfrentando os conspiradores!

Depois não diga que não avisamos...

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

Sobre o menino morto no mar...


A queda do Muro de Berlim, transmitida pelas ondas televisivas mundo afora, foi celebrada como uma promessa de novos e felizes dias aos homens. 
As pessoas eram quase que obrigadas a celebrar a queda do muro. Muitos não entendiam muito bem o porquê. O que tinham a ver com aquela história que o repórter contava, fazendo força para chorar em frente à câmera. Estaríamos todos inaugurando uma nova etapa da nossa civilização.
Sem o muro – e a "ameaça socialista" – não haveriam mais fronteiras. 
Imediatamente, exigiu-se dos Estados mais pobres e desarmados que afrouxassem suas soberanias. Não haveria mais inimigos. Estaríamos todos em território comum.
A promessa sempre foi sedutora. Mas para alcançar o eldorado capitalista, deveríamos estar adequados à este novo tempo. O neoliberalismo exigiu (e exige) do homem um processo recivilizatório. Temos a permanente percepção de que estamos inadequados no mundo. Caso algo não ocorresse bem em nossas vidas, não haveríamos de identificar nenhum inimigo político ou estrutural. A culpa estaria dentro de nós mesmos. Deveríamos estar em condições de competir no Mercado, dentro dos novos padrões de eficiência.
Os anos 90 foi a década da explosão dos livros de autoajuda. Pronto! Passamos a ter em quase todas as prateleiras das livrarias (cada vez com menos livros, porém mais iluminadas e chamativas) manuais de como sobreviver neste novo mundo, seja no mundo profissional e corporativo, seja nas relações humanas cada vez mais marcadas pelas necessidades individuais e de euforia permanente. Sim, nossas relações pessoais passaram também a ser orientadas pela lógica descartável do consumo.
Não que o sonho dourado dos 90 tenha sido grande coisa. Na verdade, ele nunca passou de promessa. De ilusão. Tão frágil como um computador. Tão efêmero como uma super-liquidação. Tão instantâneo como uma novidade tecnológica.
Na prática, este sonho só pareceu possível de ser concretizado no quintal dos outros. Ou do outro lado da fronteira, do outro lado do mar.
Muitos se atiraram ao mar em jangadas, barcos, botes, nadando. Outros se entregaram aos chacais e foram perseguidos no deserto. Entregaram tudo o que tinham para narcotraficantes, aproveitadores e estelionatários para cruzar a fronteira dos Estados Unidos.
Por falar em fronteiras, descobrimos decepcionados que o mundo permanecia sim com muitas fronteiras, cada vez mais fortalecidas, eletrificadas, cercadas de cães selvagens e de seres humanos insensíveis que preferem perseguir seus semelhantes do que enxergar a olho nu a grande mentira deste sistema que nos prometia liberdade.
As fronteiras nunca foram tão vigiadas. Descobrimos estarrecidos que o mercado comum, os blocos econômicos, a zona do Euro, as comunidades internacionais e o mercado global permitem apenas a circulação de moedas, ações e mercadorias. Nós, seres humanos comuns de segunda classe, sobretudo os nascidos nas periferias do mundo, nunca fomos tão descartáveis e inconvenientes.
Devemos dar vivas e saudar as maravilhas da globalização ao desregularmos nossas garantias trabalhistas, nossas taxas alfandegárias. Devemos agradecer felizes ao perdermos nossos empregos, destruirmos nossas indústrias, abrimos mão das pesquisas. Ao entregarmos as riquezas naturais e minerais para os grandes cartéis internacionais.
Para obter lucro e estender os domínios deste “mercado comum”, o imperialismo construiu novas guerras. Derrubou governos, conspirou, despejou bombas e mais bombas em troca de dinheiro e petróleo. Atormentou as geopolíticas regionais. Desequilibrou o sistema político internacional. Enriqueceu genocidas, construiu novas ditaduras, se aliou a déspotas assassinos, grupos religiosos, desapropriou territórios, deixou milhões de seres humanos sem pátria e sem terra.
A “quebra das soberanias”, o desrespeito às culturas e particularidades locais, o sequestro dos Estados pelo Mercado. Tudo isso fortaleceu grupos ultraconservadores e o surgimento de atores não estatais com discursos turbinados no ódio e ressentimento, dois sentimentos que se tornaram o maior legado da ação imperialista no Oriente Médio.
O menino morto numa praia da Turquia é a imagem do fracasso, da violência, da injustiça e perversidade desta “nova civilização” que nos foi prometida. Famílias se atiram ao mar para fugir dos horrores das guerras e desequilíbrios da geopolítica global tentando alcançar a “civilização”. O que encontram são fronteiras mais rígidas, modelos econômicos cruéis e excludentes que só podem gerar em seus seres humanos mais crueldade e exclusão. Não há quem possa acolher os refugiados de guerra. Já estão todos desempregados e sob risco, não há espaço para a generosidade. 
O neoliberalismo joga um indivíduo contra o outro. Faz com que os seres humanos culpem a si mesmos. No esforço “recivilizatório” e na disputa insana por um lugar ao sol (ou à sombra), disputamos mesquinhos, cada espaço nas empresas, nos hospitais, nas universidades, no carnaval, nos aeroportos, nas faixas de trânsito, no estacionamento dos shoppings.
Perdemos a capacidade crítica. Não há outro mundo possível. As coisas são assim e pronto. Entregue seus donativos na entidade beneficente mais próxima e durma tranquilo. Os problemas políticos e conjunturais da nossa sociedade não são de nossa responsabilidade. Aliás, a política não presta. Estamos em guerra uns contra os outros. Somos todos mesquinhos e cruéis. Procuremos algum retiro espiritual ou alguma seita para segurar essa barra e rezar por nós mesmos. Vale tudo para que não tenhamos a coragem de denunciar a canalhice dos nossos tempos. O capitalismo! O imperialismo! O neoliberalismo! Este modelo que desgraça a humanidade e faz com que sintamos vergonha de sermos homens e mulheres!
Há quem chore pela foto do menino morto na praia da Turquia igual a uma Miss deseja a paz mundial em algum concurso de beleza.
Porém, no dia-a-dia das grandes cidades brasileiras, não pensa na dor do retirante, do desabrigado, do sem-terra, dos Haitianos que vieram pra cá acreditando que seríamos efetivamente diferentes, ou seja, mais misericordiosos, acolhedores, receptivos e menos racistas. Não somos!
Porém, há sim ainda no coração da nossa gente um amor que pode nos resgatar de tanta tristeza. Há ainda aquele sorriso lindo que haverá ainda de iluminar o mundo.
Efetivamente, existem aqueles que acham que as coisas são assim mesmo. Que não avançamos à barbárie. Que o mundo é dos mais fortes.
Mas existem no mundo os espíritos livres. Aqueles que tremem de indignação diante das injustiças. Quem não pode aceitar um menino de três anos morrendo no mar, nem nenhum outro ser humano tendo que buscar comida em meio ao lixo. Existem homens e mulheres que certamente irão lutar por um mundo que persiga o fim da fome, que cure os doentes, ao invés de bombas destrutivas. 
Estes haverão de construir um novo futuro!