quinta-feira, 14 de junho de 2018

É pra torcer pelo Brasil!



Se a gente dependesse de bom governo ou de bom momento na política para torcer pelo Brasil,  talvez não seria possível ter comemorado nenhuma Copa do Mundo.

Se fosse para depender de governo bom para sambar ou pular o carnaval, estaríamos com os pés atrofiados.

Se tristeza e ressentimentos levassem à revolução, já teríamos resolvido todos os nossos problemas de uns anos pra cá.

A verdade é que a alegria do povo brasileiro sempre foi muito mais sinal de resistência do que de submissão.

A nossa irreverência sempre foi um ato, ainda que inconsciente, de rebeldia e destituição de reconhecimento do poder estabelecido. Uma arma sutil - e portanto possível de ser usada - para enfrentamento e desconstrução da opressão.

O futebol foi, ao longo dos anos, um instrumento de projeção da criatividade, da imaginação e da inteligência do povo brasileiro, para além do gosto pela cópia e da subordinação cultural das nossas elites.

Foi o nosso povo que inventou um novo jeito de se jogar esse jogo que é uma metáfora da vida. Foi o povo pobre que ganhou cinco Copas do Mundo. A Copa é mais do que um evento esportivo, mas um acontecimento da humanidade, que traz para um espaço lúdico a disputa inexorável do sistema interestatal, que ganha no jogo, um novo sentido e transforma, de alguma forma, a rivalidade em confraternização.

Foi o futebol que derrubou as teorias biológicas e racistas sobre o subdesenvolvimento do Brasil, revelando atletas negros vencedores, capazes e inteligentes, entre eles o maior da história, admirado pelo mundo todo.

Claro que o futebol não acabou com o racismo. Claro que o futebol também acaba abrigando o racismo e todo tipo de estupidez que está na sociedade. Mas certamente foi um instrumento poderoso, pois no jogo jogado, com regras comuns e iguais, além de condições naturais equivalentes de disputa, toda a potencialidade física, mental, cultural e espiritual do povo negro pode ser apresentada em sua magnitude, como felizmente já se apresenta em diferentes áreas, superando na raça o racismo institucional.

O futebol também sempre foi um elemento poderoso que ajudou muito o Brasil no âmbito das relações internacionais. E continua ajudando.

Quando a gente viaja pelo mundo percebe o fascínio que despertamos em outros povos. Mesmo com tanta gente insistindo em fazer com que nos vejamos de maneira degenerativa,  somos sim um lugar especial no mundo. Despertamos sorrisos e simpatia. Quando as pessoas ouvem que somos do Brasil, parece ser diferente de dizer que somos de qualquer outro lugar no planeta. A reação imediata é um sorriso, um espanto, um sinal de admiração. Uma musiquinha e uma dancinha pra te cumprimentar. É maravilhoso isso.

Com todas as dificuldades que vivemos, ainda somos um povo que tem uma missão espiritual a ser cumprida com nossos irmãos pelo mundo .

Difícil acreditar nisso diante da forma tão ruim em que estamos vibrando. Com tanta energia negativa rolando.

Pois então que o futebol cumpra mais esse papel pelo Brasil.

Exorcisemos todos os nossos fantasmas a cada gol. Deixemos os deuses do futebol fazerem sua parte.
Deixemos de odiar uns aos outros.

Há quem se preocupe se uma vitória do Brasil venha a ajudar politicamente determinada força política .

Há quem não queira usar a camisa amarelinha, que desperta tanto fascínio, por conta das náuseas políticas dos últimos tempos.

Ora, não é por acaso que nos jogos de guerra, o símbolo da vitória de um adversário sobre o outro seja exatamente a bandeira. Quem leva a bandeira ganha o jogo.

Entregar de bandeja nossa bandeira e nossas cores porque estamos de mal do resto da sociedade é uma atitude no mínimo infantil e tola.

A bandeira é nossa. Não devemos abrir mão dela.

As cores lindas do Brasil são também as cores da nossa gente.

Os símbolos tem poder. Quem não entende isso tem que voltar cinco casas no tabuleiro.

Não faz sentido insistirmos em ser uma parte fragmentada quando somos nós o povo brasileiro.

Tem coisas que a puberdade política não permite entender. Ou pela imaturidade, precocidade e descontrole de reações orgânicas, ou porque as posições estéticas acabam sendo mais apreciadas do que os compromissos de transformação.

O nacionalismo pode até ser coisa da direita na Europa ou nos EUA. Mas no Brasil e na América Latina sempre foi pauta dos progressistas. Até porque a direita, por esses lados de cá, nunca foi nacionalista, foi na verdade sempre entreguista.

É só olhar para a história. Vocês não gostam do Eduardo Galeano em seu livro tão importante "As veias abertas da América Latina"? Quem são os personagens do livro senão líderes nacionais e progressistas?

Na linda copa de 1970 muita gente perdeu a festa porque era contra o governo.

Ficaram distantes do povo e no final não resolveu nada. É só olhar para a história.

O que derrotou a ditadura foi a transformação na correlação de forças na sociedade. Foi a luta institucionalizada em todos os espaços possíveis. A ditadura caiu com o povo na rua vestindo verde e amarelo, levantando a bandeira do Brasil.

Quem odeia o Brasil, de verdade, são aqueles que querem entregar nossas riquezas de bandeja e a alma do nosso povo, deixando ele triste e subordinado ao ponto de ser escravizado.

Estamos cansados de tanto ódio. O Brasil nunca foi assim. O povo brasileiro nunca foi amargo desse jeito que ficou. E, estejam certos, essa amargura não vai transformar porra nenhuma. Só vai levar a mais desgraça e escolhas estúpidas.

Temos que voltar a acreditar em nós mesmos. Se o futebol é só uma ilusão, então que seja!

Que tenhamos um pouco de alegria e alento. Que as vitórias do Brasil sejam elementos de congraçamento. Estamos fartos da depressão nacional.

Os momentos em que o Brasil foi mais forte, certamente foram aqueles em que estivemos em maior harmonia com nossos elementos de brasilidade. Os piores foram aqueles em que sentimos vergonha de nós mesmos. Talvez por isso que forças terríveis trabalhem duro  para nos desestabilizar e nos deixar de joelhos.

Será lindo ver o Brasil ser campeão. Se reencontrar. Se amar. Ganhar da Alemanha dando um vareio de bola. Dando olé no final do jogo. Será um sonho lindo.

Vamos torcer com gosto. Torcer pela amarelinha e diversificá-la com todas as cores e amores do nosso Brasil. E vamos cair no samba!