sexta-feira, 28 de outubro de 2011

A história não mais se repete. Nem como farsa!



Em 18 Brumário de Luiz Bonaparte, Karl Marx ironiza as pretensões imperiais do sobrinho de Napoleão na França do Século XIX.
Ficou célebre a frase “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”.
Ricardo Alfonsín, filho de Raul Alfonsín (presidente da Argentina 1983-1988) vestiu-se convenientemente como o representante das classes médias urbanas contra o “totalitarismo” kirchnerista. O oportunismo  de Alfonsín que tentava apanhar o rabo do cometa da grande mídia local custou caro ao candidato.
Para compor a aliança anti-kirchnerismo, Ricardo Alfonsín percebeu tardiamente que estava no colo da direita reacionária e num vácuo ideológico irreparável.
O pensamento político conservador na América Latina historicamente “importou” a agenda política internacional. A partir do século XX, a direita internacional se organizou em torno de duas plataformas. A primeira era combater o comunismo. A segunda foi a de estender o livre mercado e flexibilizar as legislações para criar um “ambiente de negócios” favoráveis para os investidores globais.
Com o fim da Guerra Fria, o comunismo deixou de ser uma ameaça para o status quo ocidental.
Todas as energias de guerra foram concentradas em exportar a democracia – entenda-se, livrar o mundo de governos que não respeitam as “regras globais” do livre mercado.
Mas não é que em 2008 uma crise global sem precedentes coloca em cheque toda a matriz do pensamento neoliberal e rapidamente as pessoas percebem a grande mentira contada de um mercado que se auto-regula?
A direita latino-americana não tem mais um inimigo pra chamar de seu. O medo do comunismo plantado nos corações e mentes das pessoas virou um mero pastiche.
E o neoliberalismo, vendido mentirosamente como promessa de superação do nosso atraso no desenvolvimento, apresenta sua face trágica.
A crise neoliberal que quase destruiu as economias da América Latina nos anos 90, agora promete  deteriorar o “primeiro mundo”.
A recuperação econômica do nosso continente se deu quando o campo político liberal foi derrotado nas urnas e os Estados puderam aumentar sua participação na economia, visando a retomada do desenvolvimento econômico, combatendo o desemprego e diminuindo as desigualdades sociais.
Não foi a toa, portanto, que Alfonsín se viu encolhido na direita, saindo da eleição com um tamanho político bem menor do que antes.
O filho de Raul Alfonsín não confundiu o eleitorado com um discurso conciliador ao gosto do patrão.
Serve de aviso para o neto do grande Tancredo Neves. Se Aécio quiser mesmo ser presidente do Brasil deverá apresentar um projeto nacional. Se aliar a setores progressistas e não ser magnetizado para a direitona.
Caso insista na demagogia moralizadora inquisitória terá o mesmo fim de Alfonsín.
A história não mais se repete. Nem como farsa.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A estratégia da oligarquia é dividir o lulismo

Meses atrás, escrevi um post dizendo que a estratégia da oligarquia é dividir o lulismo.
E a investida continua.
A saída de Orlando Silva do PCdoB demonstra claramente que os ministros mutilados pela grande mídia que perderam seus cargos tem uma característica em comum. Compõem a base de apoio lulista. São filiados a partidos integrantes da aliança política que têm o presidente Lula como grande fiador da articulação.
As investidas têm o claro objetivo de constranger o governo Dilma – que se esforça para atender as expectativas de uma abstração chamada opinião pública – em suas relações políticas com a base de apoio do governo Lula.
A oligarquia tem o objetivo momentâneo de limitar o poder de transformação do governo Dilma, ou ao menos torná-lo o mais negociável possível.
 Lula concluiu o seu segundo mandato com a maior popularidade da história, liderando um governo de retomada do desenvolvimento econômico, num processo de crise e desgaste do discurso neoliberal pós crise econômica de 2008. O interesse inicial, não era o de aniquilar o governo Dilma, mas o de diminuir sua capacidade de modificar as bases da organização econômica brasileira, dada a vocação desenvolvimentista da “mãe do PAC” e atual presidenta.
Como a oposição está esfacelada e em evidente crise de articulação, reflexo da derrota eleitoral de Serra e principalmente pela derrota do proclamado “legado FHC”, a imprensa mais uma vez assumiu a condição de partido político e agora pretende dar seus próximos passos.
Retomando:
A oligarquia oferecerá duas possibilidades para a presidenta Dilma.
O primeiro caminho é enganosamente confortável. Caso Dilma se afaste do lulismo, a imprensa oferecerá flores e afago. Fará de conta que o projeto de Dilma está em convergência com os interesses dos velhos donos do Brasil. Louvará a independência de Dilma e elogiará sua conduta. Mas tão logo o dilmismo se divorcie do lulismo, na primeira esquina, ela será impiedosamente massacrada para dar lugar a um novo projeto genuinamente alinhado com o já famoso PIG (partido da imprensa golpista).
O segundo caminho apresentado à Dilma será inicialmente mais duro e conflituoso. Dilma sustenta seu poder na população que a elegeu. Finca-se no terreno duro, porém fértil do lulismo e leva em frente o projeto de desenvolver o Brasil, combatendo as desigualdades. Serão dias difíceis, mas o povo brasileiro estará ao seu lado e as mídias alternativas estão prontas para apoiar este momento histórico do Brasil. Será a única maneira de Dilma se proteger verdadeiramente e fazer um governo vitorioso.
Cada gesto de independência e de personalidade de Dilma vem recebendo um caráter de ruptura com Lula.
Neste especial momento é recomendável calma e reflexão aos setores progressistas.
È necessário confiar na presidenta Dilma. Não devemos incorporar as intrigas plantadas por aqueles que morrem de medo de ver este Brasil mudando. Com alguns erros históricos, é verdade, mas caminhando em direção da justiça social, tentando fazer a vida da nossa gente mais feliz.

terça-feira, 25 de outubro de 2011

Vitória de Cristina Kirchner foi muito mais que econômica. Foi política.



A vitória acachapante de Cristina Fernandez de Kirchner para um segundo mandato como presidenta da Argentina deixou os setores conservadores da América do Sul notadamente perplexos.
A imprensa noticiou a vitória de Cristina como conseqüência direta dos resultados econômicos favoráveis dos últimos anos.
Embora seja verdade que a economia argentina apresente uma melhora sensível, sobretudo com baixos índices de desemprego, estes resultados não são meros acasos alcançados de maneira abstrata. Na verdade, são frutos de escolhas políticas bem sucedidas e de disputas vencidas pelos Kirchners.
Os liberais planilheiros têm por princípio reduzir os fatos sociais ao tamanho de sua compreensão.
Ou seja, a opção política, a mobilização social, a ideologia, o nacionalismo e a identificação partidária, para os ideólogos da cartilha liberal, são elementos não quantificáveis e irracionalizáveis. Portanto, quase que não existentes.
Para isso foi criado o conceito de populismo. Esta categoria se tornou conveniente para qualificarem fenômenos políticos eleitorais escolhidos pelas massas sem o crivo da razoabilidade elitista.
Os países ricos vivem a maior crise econômica dos últimos anos. Mas antes de qualquer resultado econômico, esta é uma crise política.
Vive-se uma lacuna histórica de grandes estadistas.
Os países ricos não podem superar suas crises porque seus líderes se mostram incapazes de contrariar os interesses dos grandes financistas para salvar seus capitalismos.
Enquanto a Europa sofre com uma crise muito parecida com a que vitimou os países latino-americanos nos anos 90 (estágio avançado de degradação do neoliberalismo) a Argentina surge como um exemplo de superação e recuperação, principalmente pelas escolhas políticas feitas pelos Kirchners.
Em 2001, a Argentina havia perdido 12% de seu PIB em apenas um ano. 25% da população considerada indigente.
O país foi à bancarrota depois de dez anos de um governo neoliberal ortodoxo. A profunda crise econômica desencadeou uma crise de representação política. A população saiu às ruas com uma palavra de ordem: que se vayan todos!
Mas o Kirchnerismo soube capturar de maneira eficaz o sentimento popular e, vencendo as eleições de 2003, mobilizou a sociedade (em especial os movimentos sociais) como sustentação de apoio político para as reformas na estrutura econômica e social.
Foi uma aposta política arriscada. A crise institucional ocasionada pela renúncia e fuga do ex-presidente De La Rúa exigia que a Argentina reforçasse a autoridade presidencial. Nestor e Cristina Kirchner mudaram os rumos da política econômica suspendendo o pagamento da dívida, desvalorizando o câmbio e reestruturando a atividade produtiva para alcançar o equilíbrio na balança comercial, fazendo com que o incremento das exportações fosse a mola de propulsão da recuperação do mercado interno. A parceria estratégica com o Brasil foi central para os resultados.
Internamente, os governos dos Kirchners enfrentaram a resistência desleal e violenta da imprensa local que articulava os setores mais conservadores da sociedade. Cristina sofreu uma violência muito maior que a de Nestor. O preconceito e a conspiração foram as armas de seus inimigos. Até mesmo a defecção de seu vice-presidente da república, no momento mais delicado de seu governo (crise com os ruralistas), a presidenta Cristina enfrentou com valentia.
Os Kirchners dobraram a aposta e aprovaram uma nova lei de mídia que buscava regular o setor.
A reversão do modelo neoliberal implantado na América do Sul como uma agenda econômica estabelecida pelos países do centro, mais o enfrentamento político aberto com a grande mídia (nem de perto comparável com o caso brasileiro) levou a uma guerra ideológica aberta em que todas as armas foram usadas.
Talvez por isso, ao chegar à campanha eleitoral, a imprensa já estivesse praticamente sem munição.
O adversário inicial de Cristina, Ricardo Alfonsín, procurando um espaço político fértil em que pudesse enfrentar o kirchnerismo – que encontrou forças extraordinárias após a morte de Nestor – caiu na armadilha eleitoreira, buscando guarida na direita decadente. Conseqüentemente, diminuiu seu tamanho político e saiu da eleição menor do que entrou.
Prova disso é que o socialista Hermes Binner superou as expectativas e conquistou quase 17% dos votos. Ao final, Binner contou inclusive com a manifestação de apoio da grande mídia que diante da inevitável derrota cinicamente apoiou o socialista para buscar guarida em parte da intelectualidade que apoiava o candidato.
Os 54% dos votos alcançados por Cristina depois de quatro anos de conspirações diárias contra seu governo nos mostram que esta vitória foi muito maior do que econômica. Foi política. A população argentina votou em peso na presidenta fazendo uma escolha decisiva para o futuro e revitalizando seu apoio à Cristina.
Encontrou em sua líder uma corajosa estadista. Figura em extinção no mundo de hoje.  

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Assassinato de Kadafi - Os terroristas "do bem"


O “mundo livre” ocidental comemora o assassinato do presidente deposto da Líbia.
Kadafi não foi julgado por nenhum tribunal de seu país, ou mesmo internacional. Foi executado por rebeldes que receberam dinheiro e armas de seus aliados na OTAN.
Embora o mundo esteja farto de ditaduras, o assassinato de Kadafi não ajuda em nada a construção de instituições democráticas na Líbia. Ao contrário.
Sendo assim, o argumento de construção de uma ordem democrática na Líbia pelos países invasores, interessados em pilhar as riquezas daquele país, demonstra-se claramente mentiroso e fraudulento.
Kadafi construiu uma ditadura que se propunha a aparar (pela força) as inúmeras arestas de múltiplas identidades sociais que dificultavam a unificação do Estado líbio.
Portanto, é muito difícil que o país consiga se organizar com um poder central capaz de unificar as diferentes correntes.
É bem provável que a Líbia novamente conviva com uma nova ditadura, mas dessa vez, aliada dos países do Atlântico Norte.
E, convenhamos, não é através da execução do ex-presidente que as instituições democráticas serão sedimentadas.
Para alcançar o objetivo de depor o presidente Kadafi, os países ricos despejaram armas e dinheiro nas mãos de grupos rebeldes, agora tratados como heróis.
Mais adiante, quando estes rebeldes deixarem de ser interessantes para os planos da OTAN, imediatamente serão convertidos em terroristas.
O mesmo erro já foi cometido no período da guerra fria. Ou Bin Laden e Saddam Hussein não se fortaleceram como crias dos interesses norte-americanos?

Se os países ricos estivessem realmente preocupados com a liberdade do povo africano não teriam escravizado este povo durante séculos no maior crime da história da humanidade.
Enquanto a Líbia recebe as “bombas da liberdade”, os países do chamado chifre africano padecem na maior onda de fome dos últimos anos e convivem com sangrentas guerras civis, as quais nenhum país rico se interessa em interromper.
Os rebeldes Líbios são festejados pelo “mundo livre”, mas  os rebeldes detidos na Espanha, Inglaterra, EUA, Grécia e Chile estão na cadeia por se manifestarem contra este modelo econômico perverso, sendo tratados como bandidos. 

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

Torcedores x Jogadores


Em tempos passados, os torcedores de futebol mais atentos certamente sabiam de cor a escalação de sua equipe do coração.
Os jogadores passavam anos no mesmo clube e criavam uma identificação muito difícil de ser rompida.
Há pelo menos 25 anos, o mercado do futebol europeu passou a levar nossos craques. As ofertas milionárias eram impossíveis de serem cobertas pelos clubes brasileiros.
Com a Lei Pelé, os jogadores deixaram de pertencer aos clubes de futebol e o vínculo entre as partes passou a ser meramente contratual. E nem mesmo os contratos foram suficientes em muitos casos para fidelizar a relação entre jogadores e clubes.
Os times brasileiros parecem ter aprendido a negociar melhor as suas marcas. Contratos de tevê, renda de partidas e licenciamento de produtos ganharam importância relativa no orçamento dos clubes. A venda de jogadores deixou de ser principal fonte de renda dos times de futebol.
Com o advento da Copa do Mundo no Brasil, o processo de mercantilização do futebol parece ter completado seu ciclo.
O futebol foi transformado em um grande mercado de negócios em que as televisões negociam cotas de publicidade milionárias em sua programação.
O torcedor tradicional de futebol deixou de ser interessante para esse grande negócio.
Para os donos do futebol, melhor seria transformar o torcedor em consumidor.
As torcidas uniformizadas foram criminalizadas. O torcedor desejável e valorizado é aquele que compra os produtos oficiais licenciados e vai ao estádio com câmeras, celulares e principalmente dinheiro.
O povo brasileiro que sempre teve o futebol enraizado na sua cultura está sofrendo por se sentir cada vez mais afastado do seu time do coração.



Os recorrentes fenômenos de agressão e perseguição aos jogadores de futebol, embora sejam indesejáveis, nos mostram este conflito entre o negócio e a paixão, o marketing e o costume.
Os jogadores têm uma relação com os clubes privilegiada, em comparação com os torcedores.
Existe uma tensão. Em alguns casos, até um ciúme.
Enquanto os torcedores acompanham seus clubes durante anos, os jogadores possuem um vínculo muito breve. Os jogadores recebem salários altíssimos dos clubes de massa. Já os torcedores se dedicam ao time, gastam dinheiro e sofrem com as derrotas.
Os jogadores enchem a boca para falar que são profissionais. Este parece ser um valor em si mesmo.
A falta de comprometimento do jogador com o clube de futebol causa irritação no torcedor apaixonado. Aliás, a paixão parece não ter mais lugar nesta sociedade. As relações entre indivíduos e instituições são práticas e comerciais.
O estresse entre o torcedor apaixonado e o jogador profissional é um dos fenômenos que revela o incômodo com a apropriação do futebol pela indústria do entretenimento.
Os torcedores devem perceber que os inimigos não são os jogadores de futebol. A agressão e violência só podem servir como argumento para o afastamento dos torcedores dos estádios de futebol.
Uma característica particular do futebol brasileiro é o clube social. As tentativas fracassadas de clubes empresa deixam claro que é impossível fazer com que os torcedores cantem: BRADESCO, DANONE, COCA-COLA ou CHEVROLET. A motivação que orienta um indivíduo a aderir a um clube são identidades sociais muito ligadas à origem e comportamento.
A violência, além de repudiável, é um tiro no pé dos próprios torcedores. Mas jogadores, dirigentes e empresários – que estão ganhando fortunas com o futebol – devem também respeitar o torcedor, sem roubar dos brasileiros a paixão pelo futebol.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Clovis Rossi: Há almoço gratis. Para a banca

Publico no blog o brilhante artigo do jornalista Clovis Rossi do jornal Folha de São Paulo.

Vale a pena.

RC



CLÓVIS ROSSI
Há almoço grátis. Para a banca




O banco Dexia errou duas vezes, mas nem por isso os governos deixam de socorrê-lo com novo pacote



E lá vem de novo o sétimo de cavalaria para salvar não os mocinhos, mas os bandidos, digo os banqueiros. No caso, é o Dexia, o conglomerado franco-belga-luxemburguês, a ser socorrido -pela segunda vez- pelos governos dos três países.
Na prática, é o exato inverso do slogan "Ocupe Wall Street" que ganha adeptos nos EUA. O que os governos estão fazendo é financiar Wall Street ou, no caso específico do Dexia, a Place Rougier de Bruxelas, onde fica a sede central do banco.
É um claro desafio à regra básica do capitalismo, a de que "não há almoço grátis". Para a banca, não há apenas almoço grátis, mas também janta.
Afinal, o Dexia já havia sido socorrido em 2008, com imponentes € 6 bilhões. É um pouco menos do que os € 8 bilhões que a Grécia é obrigada a mendigar para poder pagar os salários de outubro de seus funcionários, entre outras contas, e que compõem a última fatia do crédito concedido por União Europeia/FMI para resgatar o país.
Diferença fundamental: o crédito à Grécia está amarrado a duríssimas condições que, entre outras tragédias, levaram a um aumento de 40% no número de suicídios nos cinco primeiros meses de 2011, na comparação com 2010. Uma linha telefônica para desesperados dispostos ao suicídio passou a receber mais de 100 chamadas por dia, quando a média normal era de 10.
Não consta que algum banqueiro tenha tentado o suicídio. Já estou até ouvindo o resmungar dos economistas de bancos e de seus amigos na mídia me acusando de demagogo por fazer esse tipo de comparação. Sacarão do coldre, como é de praxe, o argumento maroto de que banco não pode quebrar porque seria um prejuízo para todo o mundo, inclusive para suicidas em potencial.
Não se trata de pregar a estatização do sistema financeiro global, até porque banqueiros a soldo do Estado não pecam menos -nem mais- que os banqueiros privados. O problema está na recorrente estatização dos prejuízos, como ocorre agora no caso do Dexia, e na privatização do lucro. Assim até eu quero ser capitalista.
Não faz sentido o Estado ajudar a banca e não assumir o controle da gestão. Acaba sendo um convite para que os erros que levaram ao primeiro auxílio governamental se repitam e obriguem a um segundo pacote, como acontece com o Dexia.
Tampouco faz sentido permitir que bancos que só não quebraram porque entrou dinheiro público, na crise de 2008, continuem pagando salários e bônus obscenamente altos para os executivos que os arruinaram. Deveriam responder com o seu patrimônio pelos prejuízos.
Menos mal que duas figuras políticas relevantes estejam cobrando algo parecido. A presidente Dilma Rousseff, que quer que o G20 adote regulação estrita para o "descontrolado" sistema financeiro, e o presidente do Partido Social Democrata alemão, Sigmar Gabriel, para quem a palavra de ordem deve ser: "Nenhum centavo do Estado para salvar um único banco, a menos que aplique reformas profundas em seu modo de operar". Para Gabriel, a crise bancária está colocando para o mundo uma escolha entre "democracia ou o domínio das finanças". O que você escolhe?

crossi@uol.com.br

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O mercado do luxo se alimenta da desigualdade social


Hoje foi a vez da Luigi Bertolli, Emme e Cori serem apanhadas pela Superintendência Regional do Trabalho. Embora não sejam grifes de luxo, vale a reflexão proposta neste post publicado originalmente em 2011. As empresas argumentam que desconhecem como é fomentada sua cadeia produtiva, comprando seus produtos de confecções terceirizadas. Então tá.

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A Polícia Federal desarticulou um esquema de importação ilegal de carros de luxo.
A empresa  de fachada mantinha conexões íntimas com a máfia internacional.
Mas para os felizes compradores dos carrões de luxo, alguns deles jogadores de futebol, músicos famosos e celebridades de revista, pouco importa operar comercialmente com grupos de criminosos. O que vale mesmo é receber vantagens tentadoras na compra de automóveis que custam centenas de milhares de reais. Ainda que estejam conscientes da prática de crime de sonegação fiscal.
Ano passado, a empresária Tânia Bulhões, do grupo Tânia Bulhões Home, importadores de artigos de decoração de luxo, foi condenada a quatro anos de prestação de serviços comunitários, acrescidos do pagamento de 1,2 milhões de reais por crimes de formação de quadrilha, descaminho, falsidade ideológica e crime contra o sistema financeiro nacional.
Anteriormente, a empresária Eliana Tranchesi, também havia sido presa pelos mesmos crimes. O caso provocou perplexidade por se tratar do templo do luxo paulistano. A Daslu havia construído um palacete num bairro “nobre” de São Paulo reunido num mesmo lugar as grifes mais badaladas e caras do mundo da moda.
Mês passado, os consumidores da grife Zara ficaram impressionados ao saber que na cadeia produtiva da calça jeans, bolivianos escravizados em oficinas clandestinas não recebiam mais de 0,25 centavos por costurar o vestuário de grife.
No imaginário nacional a sonegação fiscal não é considerada um crime. Durante anos, as elites se  acostumaram a serem beneficiárias do Estado e confundirem as coisas públicas e privadas.
As relações privadas antecedem a construção das instituições públicas no Brasil. Durante séculos, as elites se habituaram a receber favores do Estado e organizá-lo conforme seus interesses.  Para a elite, o Estado sempre foi uma ferramenta de extensão de seus domínios e influência.
Dessa forma, a cobrança de tributos e a exigência de obrigações legais, causam incômodo e estranhamento por parte daqueles que não se vêem como cidadãos iguais aos demais no cumprimento de responsabilidades e na garantia de direitos.
O mercado de luxo se alimenta da desigualdade social. A aquisição de pertences que se caracterizam não somente pelo seu valor de uso, mas pela ostentação de uma grife, tem o intuito de distinguir o consumidor da ampla maioria. É uma espécie de crachá de diferenciação, capaz de abrir portas e deixar claro que o indivíduo que usa determinada marca pertence a uma casta superior da sociedade. Em troca, o cidadão ganharia garantias sociais extraordinárias, pois “cada um sabe seu lugar” na sociedade.

Confesso que conheço muito pouco (ou quase nada) sobre grifes e marcas.

No entanto, não me incomodo com as prioridades alheias. Pouco me importa se um indivíduo pague dez vezes mais caro por um produto que lhe parece interessante.
Mas considero uma cafajestagem dispor de pequenas fortunas para comprar futilidades e economizar na hora de pagar os impostos dos quais dependem toda a sociedade.
Obviamente, existe uma distorção na organização tributária brasileira. Muitos pequenos e médios empresários são esmagados por uma carga escorchante de impostos.
 A classe pobre, proporcionalmente, paga muito mais impostos e sequer tem a chance de sonegar.
Existe uma concepção geral de que o Estado é corrupto e o mercado é honesto. Os políticos são maus e os indivíduos são bons (todos eles).
Obviamente, a lógica do Estado não estaria desconectada das outras esferas da vida social. Ao contrário, o Estado reproduz as regras de uma ordem estabelecida em que a vantagem privada antecede o fortalecimento da organização coletiva.

Como se vê, os vilões não são somente os políticos. Aliás, estes são meros reflexos de uma ordem social que se impôs de cima para baixo, a partir das elites, permeando toda a estrutura da vida nacional.
O Brasil só poderá se desenvolver de verdade com justiça social. E essa justiça depende do cumprimento das leis e da igualdade entre os indivíduos na aplicação do direito.
Aos que esbanjam dinheiro comprando artigos de luxo, sugiro que reservem um orçamento para o pagamento de tributos.
Não dá mais pé o sujeito comprar um automóvel de trezentos mil reais e licenciar o carro no Acre pra pagar menos IPVA e não receber as multas. Ou uma madame pagar vinte mil reais em um vestido e reclamar da carga tributária..
Lembro-me daquela propaganda do cartão de crédito. Calça Zara 1,5 mil, vestido da Daslu 20 mil, vaso importado pela Tânia Bulhões 35 mil, carro contrabandeado 350 mil. Recolhimento de impostos: não tem preço.



sábado, 8 de outubro de 2011

No Jobs

Frase de um tuiteiro norte-americano.

"Ten years ago we had Steve Jobs, Bob Hope and Johnny Cash - today we have no jobs, no hope and no cash"

* Dez anos atrás nós tínhamos Steve Jobs, Bob Hope e Jonny Cash, hoje estamos "sem Jobs" (trabalho), "sem Hope" (esperança) e sem Cash (dinheiro).

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

A morte de Steve Jobs e a crise mundial



Certa vez vi o comentário de um analista sobre a crise americana e a ascensão da economia chinesa.
Ele dizia que os Estados Unidos permaneceriam sendo a grande potência econômica por sua capacidade de criação, enquanto a China estaria sempre satisfeita em copiar. O mundo é de quem cria, dizia ele.
Como se as maiores invenções da humanidade  não tivessem sido criadas na china.
E como se a transformação de uma economia agrária na maior potência industrial do planeta a partir da incorporação da capacidade produtiva dos países ricos que desejavam se livrar dos “transtornos” dos trabalhadores operários não fosse uma criação ou recriação em si mesma.
Mas os EUA acabam de perder o maior empresário dos últimos anos, Steve Jobs.
A morte prematura deste talentoso executivo causa perplexidade, principalmente porque ela ocorre justamente nos piores dias da economia norte-americana desde a crise de 1929.
Se muitos comentam a possível queda da hegemonia estadunidense, a perda do maior nome da criação industrial deste século certamente deixa um vazio ainda maior na maior economia global.
Enquanto muito se discute sobre a crise econômica mundial, fica claro que esta moléstia somente poderá ser superada caso haja uma solução para a crise política nos países ricos.
Steve Jobs foi mais que um empresário, foi um líder que inspirou toda uma geração em um mundo escasso de estadistas.
O governo Bush foi uma tragédia, principalmente para os próprios Estados Unidos. Barack Obama, até então, tem sido uma imensa decepção. Ele e os principais líderes europeus estão perplexos tentando se safar de uma quebradeira geral, mas sem coragem para transformarem as bases da economia neoliberal que deteriora o capitalismo global.
O cenário é horroroso porque a oposição aos atuais governos, em sua grande maioria, é composta por políticos ainda mais conservadores e míopes.
Enquanto Jobs criava, a economia do atlântico norte se organizava (ou se desorganizava) com executivos planilheiros capazes apenas de cambiar papeis, títulos e ações. Levantar mais e mais capitais sem que houvesse uma equivalência deste montante em produção e trabalho. Valia de tudo na farra especulativa. Balanços falsos e muito dinheiro dos governos para cobrir o rombo dos yuppies canalhas e incompetentes.
As criações de Steve Jobs garantiram o crescimento econômico asiático onde as mercadorias eram produzidas. Para Estados Unidos e Europa, os trabalhadores industriais tornaram-se um gasto desnecessário. Trabalhadores reclamam, fazem greve, se aposentam e pedem garantias demais.
Não é difícil entender porque durante a era Jobs foi cavada uma profunda cova pelos financistas neoliberais que torna tão difícil a recuperação nestes países onde  a renda do trabalhador está achatada e o mercado financeiro represa as riquezas.
Num mundo tão opaco de estadistas não é de se surpreender que a perda de um empresário cause tanta comoção mundial.
O criador se foi. Agora restam os pragmáticos especuladores.

Privatizada, Linha 4 Amarela não mantém a qualidade histórica do Metrô de São Paulo



Aos que consideravam a baldeação na estação Sé do Metrô uma experiência de aventura, faço aqui um convite para que tentem embarcar na nova Linha Amarela na estação Consolação do Metrô na hora do rush.
A Estação Sé foi inaugurada em 1978, há 33 anos.
Ainda sim, parece ser uma obra muito mais moderna do que algumas estações da Linha 4 Amarela.
Enquanto na Sé ficamos impressionados com o vão livre que permite a chegada de luz natural, a Estação Paulista é um verdadeiro teste para os claustrofóbicos.
Saindo da Estação Consolação da Linha Verde, caminha-se por um túnel comprido e abafado que depois de muitos metros nos leva à Estação Paulista da Linha Amarela.
Foram instaladas esteiras rolantes que deveriam facilitar a jornada, mas as máquinas com poucos meses de uso estão sempre desligadas. Não se sabe se elas estão danificadas ou foram deixadas fora de serviço. O fato é que é praticamente impossível encontrar o equipamento funcionando nos horários de pico.
O jeito é ir pelo túnel feio e apertado. Caminhar em uma fila imensa onde as pessoas se parecem mais com gados indo rumo ao abate.
Os acessos são muito limitados e os funcionários fazem uso de megafones para avisar o caminho que as pessoas devem percorrer.
Quando se chega à plataforma de embarque acontece uma nova aventura.
Como as estações recentemente inauguradas não têm saídas para os dois lados do trem, o transeunte pode ser surpreendido por uma avalanche de pessoas que saem na direção contrária trombando umas nas outras.
A construção da Linha Amarela foi conturbada desde o início.
A entrega da obra atrasou mais de dois anos.
Em 2007 uma imensa cratera se abriu onde atualmente está  a Estação Pinheiros. Sete pessoas foram mortas, além de inúmeros prejuízos materiais.

A Linha 4 Amarela é a primeira do metrô que foi construída através de parceria público privada.
O consórcio vencedor foi o mesmo grupo que opera o Rodoanel, a Via Oeste e a famigerada Controlar, responsável pela inspeção veicular no governo Kassab.
Dentro dos trens, um vídeo sobre a nova linha é apresentado aos passageiros. Parece que o governo do estado e a Linha 4 orgulham-se de os trens serem importados da Coréia do Sul, gerando emprego e renda para nossos amigos coreanos, em detrimento do nosso mercado interno.
A experiência histórica do Metrô de São Paulo foi deixada de lado nessa nova empreitada.
É uma pena, já que as antigas estações do Metrô, mesmo com mais de 30 anos de construção, ainda são mais inteligentes e confortáveis.
Fico muito feliz com a expansão do Metrô e a criação de novas linhas, mas seria bacana que elas mantivessem a mesma eficiência da nossa empresa estadual que é referência para o mundo.
Os novos trens funcionam sem condutores, contando com tecnologia que permite a operação através de sistema informatizado. Mas nos últimos dias foram diversas panes.
Desejo que estes transtornos não virem rotina.
Espero ao menos que as escadas e esteiras rolantes funcionem regularmente.