segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

O Garoto da Praia Grande




Eu poderia ser o menino do Rio.
O garoto de Ipanema.
O moço bonito da praia de Boa Viagem.
Mas eu sou o moleque da Praia Grande.
Esta é a praia mais mal falada do Brasil.
As pessoas vêem na Praia Grande a memória mais olvidável e detestável de pobreza.
Aquela que habita nas entranhas dos emergentes e que assusta aos que desejam afogar a porção mais oculta do seu passado.
Certa vez eu disse que a Praia Grande era igual o Orkut. Todo mundo já havia se divertido por lá, mas agora, alguns sentem vergonha em dizer.
No entanto, quando lembro minha infância, vejo que devo agradecer pelos momentos passados na Praia Grande.
Meu pai trabalhava como empregado no comércio. Direitos trabalhistas eram luxos que não dispúnhamos. Papai podia desfrutar no máximo de um feriado prolongado por ano. Para nossa família, tinha o efeito de férias inesquecíveis.
A Praia Grande era o território possível. Viagens longas não eram tão simples e baratas. Os automóveis não eram tão modernos e a gente escrevia nas lições de férias: ”Minha Viagem à Praia Grande”.
Fazíamos desenhos especiais, e tudo mais...
Acho que hoje, quando os paulistanos visitam o litoral, sequer dizem que estão viajando. As pessoas apenas mencionam que vão à praia.
Na família, jamais esquecemos um feriado em que pudemos viajar à praia. Conseguimos um apartamento emprestado por uma amiga. Na Praia Grande, é claro.
Sinceramente, eu não sei se as pousadas e hotéis eram tão acessíveis como são hoje ou se éramos pobres demais para nos hospedarmos num quarto com café da manhã incluso.
Mas o fato é que choveu o feriado inteiro. Aquela chuva intermitente que impedia até mesmo caminhadas curtas. O apartamento era super pequeno e sem televisão. Fomos à banca de jornal e compramos todas as revistas disponíveis. Quando acabou o feriado, voltamos para São Paulo.
Praia de novo somente no ano que vem.
Um dia, meus pais dispuseram de todas as suas economias e compraram, enfim, uma casa na praia.
 Em Praia Grande.
Aí sim fomos felizes. Podíamos ver o mar quase sempre. Meu pai mudou de emprego e durante o verão simplesmente nos transferíamos para a praia.


Um belo dia, Praia Grande decidiu se modernizar. Os ônibus dos “farofeiros”, que passavam o dia inteiro na cidade para fazer o chamado “bate-volta” foram proibidos.
A infra-estrutura urbana ganhou obras marcantes.
A cidade tinha agora uma orla marítima moderna e atraente.
Mas se o desejo da cidade era atrair turistas de maior poder econômico, os planos do município tiveram de sofrer algumas alterações do projeto inicial.
Ao mesmo tempo em que as viagens mais longas tornaram-se mais acessíveis para a classe média, a cidade ganhava o definitivo estigma de “praia dos pobres”.
As belíssimas praias do litoral norte paulista passaram a receber cada vez mais casas e condomínios de veraneio.
“Long Beach”, cada vez mais moderna, tornava-se o paraíso da chamada nova classe média.
Os meios de comunicação faziam de tudo para estigmatizar seus freqüentadores, fazendo reportagens com sub-personalidades do mundo da TV, entrevistando banhistas supostamente pitorescos e de gosto discutível.
A idéia era criar um show: “a vida dos pobres”. Tipo National Geographic mesmo
Tudo para entreter e divertir a classe média. Dessa forma, as pessoas ficariam satisfeitas e felizes por se sentirem superiores e diferenciados da gentalha.
Mas não pensem que a Praia Grande é o território da exclusão. De jeito nenhum.
Os imóveis estão cada vez mais valorizados. Porque existe uma população que prefere e é incapaz de deixar para trás a Praia Grande.
Não somente pela proximidade da capital e pela infra-estrutura urbana muito conveniente.
Mas porque em Praia Grande não é preciso passar horas escolhendo o ornamento dos trajes de banho. Pode-se ir à praia, com aquela camiseta ganha de brinde no posto de gasolina ou com o boné da “mastercard”.
Os quilinhos a mais não são impedimento para a diversão e as gargalhadas estão sempre permitidas.
Não consigo deixar de achar a Praia Grande linda.
Mesmo com o abandono do Governo do Estado que continua considerando o saneamento básico e a coleta e tratamento de esgoto como privilégio dos ricos.
Ano passado, eu pude conhecer algumas praias no Caribe.
Pareciam de mentira. Um cenário construído para iludir os turistas. Aos meus olhos, aquilo não parecia ser verdade. O azul indescritível daquele mar maravilhoso era algo impensável para alguém acostumado com as ondas compulsivas da Praia Grande.
Mas na hora de agradecer pelas bênçãos da minha vida, é para lá que eu volto.
E não posso agora me envergonhar de um lugar que era tão esperado e especial na minha infância.
Não me tornei tão mascarado assim...












9 comentários:

  1. Concordo com você, Rafael. Mesmo tendo conhecido outras praias pelo Brasil, algumas também bonitas, continuo achando Praia Grande um destino de passeio convidativo. Nas poucas oportunidades em que estive lá, senti-me muito à vontade e gostei muito.
    Moro em Cuiabá, Mato Grosso, e por aqui ser o centro geodésico da América do Sul, é o local mais distante de praias que pode existir no Brasil e, lógico, na América do Sul. Estamos equidistantes do Atlântico e do Pacífico (no sentido leste-oeste), e do Atlântico ao Atlântico (no sentido norte-sul).
    Mas há poucos anos, aa última vez que fui a uma praia de mar (aqui temos praias de rio) saí daqui de carro para passar um feriado prolongado com minha família exatamente em Praia Grande. E foram dias (poucos) muito agradáveis.

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  2. ola Rafael nao deiche de me seguir no seu blog ate mais

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  3. ola Rafael gostei muito do seu blos se poder me segue ate mais

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  4. Muito bonito!
    Identifico-me muito com estas linhas, pois meus momentos litorâneos na infância foram um pouco mais à norte, em São Vicente, igualmente estigmatizada como "praia de pobre".
    Abraços!

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  5. A controversias ,cresci entre praia grande e itanhaem,uma hora praia grande outra itannhaem.Mas como tudo tem seu tempo e estado de espirito digamos que curti tudo de bom na praia grande ,carnaval com meus 20 poucos primos muita festa ,reveilon maravilhos ,ferias das crianças enfim Viva bons momentos de praia grande.Porem ao passar os anos muita coisa mudou e digamos nada muito bom.Temos mais assaltos ,ja presenciei varios inclusive pessoalmente,um descuido das autoridades enfim ainda vou la mais com muita reserva,ja não me sinto muito a vontade .Saudades dos bons tempos

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  6. Rafael,

    Meu compas de Timão, grande post, emocionante, baita orgulho, mesmo pouco frequentando qualquer litoral em SP, nasci no Ceará, durante o ano esperamos a ida pra Fortaleza, sempre ouço este papinho de "praia de pobre", como forma de menosprezar a praia e as pessoas que a frequentam.
    Faz parte deste folclore absurdo imposto pela decadente classe média paulistana,contra Praia Grande ,também é o mesmo que sofre a Zona Leste, Itaquera, os manos, as pessoas simples.

    Abraços,

    Arnobio

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  7. Amo a Praia Grande, verões inesquecíveis em 97 e 98!!

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