quinta-feira, 31 de março de 2016

Não quero ir de encontro ao azar



O Brasil entrou no ano de 1985 cheio de esperanças por um futuro melhor.
Enfim, terminava a Ditadura Militar. Teríamos um governo que seria o fruto genuíno das lutas pela redemocratização do Brasil.
Daí o Tancredo Neves passou mal. Teve uma diverticulite e pimba! MÓ-RREU.
Assumiu o Sarney que já era da base civil de apoio à ditadura, coroné, oligarquia local e tudo mais.
Como em tantos outros momentos em sua história, o Brasil mudava justamente pra continuar sendo a mesma coisa.
Vez por outra, o Brasil ensaia tentar algo diferente. Nada muito brusco. Bem de boas. Mas logo emerge o que passou a ser conhecido como a "síndrome de habib's". Prevalece o sentimento do "eu quero meu país de volta".
Ou seja, de volta os velhos privilégios, o velho protagonismo, a velha organização social, as velhas hierarquias.
Não querem pagar o pato.
O pato da justiça social, o pato da distribuição de renda, o pato dos programas sociais, o pato dos serviços públicos, o pato dos direitos trabalhistas.
E então, aquele suspiro de mudança termina com uma família real tendo que fugir depois de abolir a escravidão (e surgir o primeiro pato), um suicídio na Guanabara, uma renunciazinha para inaugurar Brasília, um parlamentarismozinho, um golpezinho militar, um ex-presidente que bate o carro na Via Dutra, outro que erra o remédio para o coração, uma pequena diverticulite que dá uma dor de barriga desgraçada. Nem o "caçador de marajás" que tentou governar sozinho foi perdoado. Caiu também.
Passado o luto pela morte do Tancredo Neves, os brasileiros ligaram o rádio e cairam numa gargalhada ainda meio silenciosa.
O sempre genial Raul Seixas, com sua simplicidade (que o tornava mais genial ainda), não precisou de muita poesia pra dar voz e ritmo a uma espécie de intuição coletiva que rolava na casa dos brasileiros que, malandramente, sem saber no que ia dar aquela abertura democrática, cantavam aquela nova canção sem fazer muito alarde. Apenas um olhando nos olhos do outro com um sorriso malicioso nos lábios.
A canção já de cara começava com os seguintes versos:
"Mamãe não quero ser prefeito,
Pode ser que eu seja eleito
E alguém pode querer me assassinar.
Eu não preciso ler jornais, mentir sozinho eu sou capaz, não quero ir de encontro ao azar".
Puta que pariu. Era uma bomba!
Claro que ninguém teria condições de especular muito sobre a morte do Tancredo que aparentemente foi natural. Ficará para sempre entre as inúmeras teorias de conspiração.
O problema é que no Brasil conspiração é coisa que não falta.
Mas fica a dica. Dependendo de quem você traz para bem perto de você, isso pode dar um azar filho da puta.
Ou como disse o Raul, é "ir de encontro ao azar"...

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