O governo Dilma completa 100 dias de mandato.
Desde a posse de Lula em 2003, passaram-se 100 meses de uma administração que se propôs a mudar o Brasil.
Mas as principais e verdadeiras transformações não se dão somente pela troca de comando. Elas dependem de arranjos políticos permanentes.
Não estou falando somente de barganhas e favores. Existem disputas entre grupos de interesses que oscilam entre o equilíbrio e o desequilíbrio.
A elite não é uma classe homogenia. Na medida em que determinado grupo político ou econômico ganha força, maior é seu poder de interferir no processo decisório.
O desempenho pessoal de Dilma foi positivo. Surpreendeu aos que não conseguiam ver sua figura política dissociada do ex-presidente Lula. Dilma têm se mostrado segura e centrada. Embora não possua os mesmos recursos de comunicação de Lula, a presidenta aparenta ter objetivos, prioridades e um modo próprio de comandar.
Mas, normalmente, os primeiros dias de governo são momentos de lua-de-mel com o poder. É quando os opositores ainda desenham suas estratégias de combate, esperando o tempo adequado para não parecerem negativos e revanchistas. Mas daqui em diante, os desafios de Dilma serão imensos.
Sob o ponto de vista político, Dilma terá de lidar com uma oposição que procura se reorganizar em torno de novos nomes e novos paradigmas.
Durante o governo Lula, a oposição, com quadros políticos sofríveis, cometeu erros estratégicos, levando um “chocolate” do governo.
Durante a crise do mensalão (2005), a estratégia era esperar para matar Lula na campanha eleitoral. O desempenho pessoal de Lula e a incapacidade do PSDB em se unificar diante da candidatura de Alckmin, além do discurso insuficiente do “moralismo político”, facilitaram a vida do governo.
No segundo mandato os erros foram ainda maiores. A oposição fez um cálculo estratégico de que embora a aprovação pessoal do presidente fosse alta, jamais Lula teria fôlego para eleger a ainda desconhecida Dilma. A população fatalmente optaria por um dos candidatos tucanos, supostamente mais preparados para a disputa.
Ao antecipar para 2007 a escolha de sua candidata, Lula impediu que sua base de apoio se esfacelasse em meio à guerra pela indicação do presidente. Já a oposição, deixou de fazer oposição. Preferiu não enfrentar a popularidade e astúcia do presidente e assumir os avanços de seu governo, concentrando seus esforços em eleger o “pós Lula”. Essa atitude ajudou a mitificar para sempre a figura de Lula.
Mas agora a oposição promete agir. Seu principal líder será Aécio Neves. É bem verdade que será necessário mais do que vontade. Será preciso elaborar um discurso mais abrangente, que vá além das classes médias urbanas. Por isso, enquanto o programa da oposição não consegue ser criativo, ele tende a ser reativo.
E é a economia o ponto mais sensível do governo Dilma. Sobretudo, por conta da recente alta de preços. A inflação volta a tirar o sono dos brasileiros. Mas é importante entendermos as raízes deste problema.
1- Em 2009 e 2010 o governo fez um esforço gigantesco para manter aquecida a economia e evitar que o Brasil entrasse em recessão, por conta da crise mundial. O Estado procurou suprir a demanda privada, aumentando seus gastos. Isso não viria sem custos. Por mais que seja desconfortável a alta dos preços, seria muito pior se o Brasil interrompesse seu ciclo de crescimento com uma nova recessão e conseqüente aumento no desemprego.
2- Existe uma inflação internacional. Países como China e EUA também tem sofrido esta pressão. Primeiro pela alta de preços das commodities, produtos como alimentos e minérios nunca tiveram preços tão altos no mercado internacional. Depois por conta da enxurrada de Dólares americanos nas economias globais. Para superar a crise econômica e competir com os produtos chineses no mercado mundial, os EUA injetaram centenas de bilhões de dólares mundo afora, também para desvalorizar sua moeda. É a chamada guerra cambial.
3- E desvalorizar o Real frente ao Dólar não é tão simples quanto parece. É claro que o Real mais barato facilitaria o setor exportador e as contas externas brasileiras. Mas boa parte dos produtos que tiveram seus preços aumentados nos últimos meses, como a carne e o etanol, por exemplo, se deve ao fato de que as empresas preferem exportar sua produção por ser mais vantajoso do que abastecer o mercado interno. Ou seja, ao contrário do que se diz, a desvalorização do Real provocaria de imediato uma alta geral dos preços para os brasileiros
4- As medidas do governo nos últimos dezesseis anos são sempre para frear ou aquecer o consumo. O Brasil não consegue crescer mais porque os investimentos em infra-estrutura foram muito menores do que o necessário nos últimos governos. Não temos como escoar nossa produção e como não é possível vender mais, os preços ficam mais caros. É preciso aumentar o investimento.
Como se vê, a tarefa não é fácil. Os desafios sempre existem. Além de competência, Dilma precisará fazer as escolhas políticas corretas, apostar no desenvolvimento do Brasil e saber se livrar dos chacais e aves de rapina que estão mais perto do que parece. Estes são muito mais hábeis do que aqueles que se posicionaram assumidamente na oposição. Muitas vezes o inimigo mora ao lado.
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